Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Mês: maio 2016 Page 1 of 2

Contos de Segunda #44

 As peripécias de Luciana e Roberta para fazer Jorge e Cristina ficarem juntos não começou hoje. Esse conto é uma continuação dos Contos de Segunda#34 e Contos de Segunda #42.

   — Deixa eu ver se eu entendi direito. Vai rolar um ensaio do casamento do seu irmão. A banda do amigo de Jorge vai estar lá e você quer que eu apareça lá pra chegar nele? — Luciana aparentava uma confusão proposital.

    — É — respondeu Roberta mais concentrada no salmão defumado do que nas sutilezas da amiga.

    As duas não se falaram muito desde o dia em que Fábio confirmou que tocaria no casamento do irmão de Roberta. Um ensaio do casamento marcado em cima da hora fez as duas almoçarem juntas

    — Quem ensaia casamento em dia de segunda?

    — Alguém que não pode ensaiar outro dia — no ranking da atenção de Roberta, Luciana estava atrás do salmão e do celular.

    — Foco, Roberta, estamos discutindo coisa séria.

    — Nem tem muito o que discutir. Hoje você aparece comigo lá no ensaio e quando acabar tudo conversa com Fábio. Simples assim.

    — Preferia fazer isso no casamento do teu irmão.

    — Não sei se você sabe, mas Cristina estudou com Beto na faculdade e ela vai estar lá no casamento. Acabo de lembrar que ele estudou contigo também, mas até onde eu sei Beto não vai com a tua cara.

    — E daí?

    — E daí que esse seu plano só vai funcionar se ela não suspeitar de nada. Por que se ela sentir o cheiro dessa armação, vai cantar essa pedra pra Jorge e já era esse teu Game of Thrones versão cupido.

    Contra esse argumento Luciana não encontrou resposta além do silêncio. O relógio estava quase nas nove horas da noite quando ela e Roberta chegaram ao salão de festas. Os noivos já tinham combinado a trilha sonora da cerimônia e agora estavam ensaiando a valsa. Somewhere Only We Know seguido de Burnin’ Love. A banda de Fábio tinha um homem no vocal, mas uma voz feminina foi recrutada para ajudar na versatilidade da banda e permitir os duetos.

    — Acho que ainda vai demorar — Roberta analisava o relógio arrependida, devia ter comprado um maior.

    — Então é a nossa chance — Luciana já tinha analisado todo o ambiente.

    — De quê?

    — De chamar a atenção de Fábio, o que mais seria?

    — O cara tá trabalhando, Luciana. Tem umas cadeiras ali e…

    — Nada disso — Luciana rapidamente se posicionou atrás da amiga, colocou as mãos nos ombros dela e começou a empurrar. — A gente vai esperar um pouco, quando eles se prepararem pra repetir a música você vai ali cumprimentar seu irmão e vai aproveitar a deixa pra falar com Fábio e vai dizer que é amiga de Jorge. Isso vai chamar a atenção dele o suficiente pra ele dar uma olhada ou outra pra onde a gente estiver sentada, o resto é comigo.

    Elas precisaram esperar só um minuto. A música terminou. Beto e sua noiva estavam bem satisfeitos com a performance deles e da banda. Roberta aproveitou a pausa para se aproximar.

    — Caramba, Beto. Não pensei que essa valsa ia ficar tão boa. Obviamente não por causa da noiva, sempre confiei em você, Angela.

    — Eu também pensei que não ia rolar. Nem sei como te agradecer por ter conseguido a banda.

    — Não fiz nada, Jorge que conseguiu convencer a banda a aceitar o convite — ela se virou para a banda. — Boa noite, pessoal.

    — Boa noite! — Respondeu a banda em coro.

— Você deve ser Roberta? — A pergunta vinha do guitarrista.

— Sou eu. Falei contigo no telefone.

— Avise a Jorge que ele só não fica me devendo essa, por que se der certo a gente pretende aproveitar esse segmento matrimonial. Vai ficar pra ver o ensaio?

— Sim, tô ali com uma amiga. Comentei sobre essa história de vocês tocando no casamento e ela ficou curiosa — Roberta olhou pro relógio. — Olha só a hora, e eu aqui atrapalhando. Vou ficar ali até vocês terminarem.

O ensaio recomeçou. Uma dúzia de passos e Roberta chegou onde estava Luciana.

— Valeu, amiga. Agora é só ele agir como o previsto e tá no papo.

O plano de Luciana deu certo. Volta e meia Fábio dava uma olhada discreta para onde as duas amigas estavam. Luciana respondia com olhadas nem tão discretas para o guitarrista. Quando os olhares ficaram mais frequentes ela resolveu brincar com o ego musical dele. Luciana começou a cantar as músicas junto, depois começou a se mexer na cadeira e terminou puxando Roberta para dançar imitando os passos dos noivos. Fábio já estava com a guitarra dentro do case quando foi falar com as duas.

— Que bom que gostaram da música.

— Vocês são muito bons mesmo eu até…

— Tô apaixonada pelo som de vocês — interrompeu Luciana. — Você deve ser o amigo de Jorge, né? Luciana, prazer — A mão já estava estendida antes do “prazer” terminar de sair da boca.

— Fábio. Se gostou agora vai ficar impressionada no casamento, vão rolar umas surpresas bem interessantes.

— Eu não fui convidada, há quem diga que o noivo me detesta.

— Jorge também não fala muito bem de você.

Luciana corou. Todas as dezenas de respostas possíveis morreram ainda na garganta. Ela gaguejou e não saiu nada. Fábio abriu um sorriso.

— É uma pena que você não vai pro casamento, mas se quiser ouvir a gente tocar e estiver com a quinta-feira livre, é só dar uma chegada nesse bar aqui — Fábio sacou um folheto do bolso e entregou a Luciana. — Depois do show você me explica por que Jorge gosta tão pouco de você. Agora preciso ir pra não perder a carona. Até mais.

    Elas esperaram o guitarrista se afastar em silêncio. Luciana ainda estava corada quando Roberta falou.

    — Pois é, amiga. Parece que tudo deu certo. Fico impressionada com a tua capacidade de interpretação.

    — Tô achando que não foi bem isso, Roberta — as palavras saíram devagar da boca de Luciana. — Acho que essa história não vai ficar só com Jorge e Cristina.

Facebook de Bikini

Ontem aconteceu um dos eventos mais importantes da internet no ano de 2016. Na quinta-feira, 26 de Maio, entrou no ar a página do Cachorros de Bikini no Facebook.  A notícia, que contraria as projeções mais otimistas, pegou até os mais experientes das redes sociais desprevenidos. Foi algo tão inesperado que nem Zuckerberg viu essa chegando.

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    Quando eu comecei o blog eu sabia que em algum momento ele iria pras redes sociais. Compartilhar as postagens e pedir pros amigos fazerem o mesmo deu algum resultado, mas em algum momento isso precisaria passar para o próximo nível. Depois de procrastinar pra caramba planejar muito resolvi colocar o plano em prática. Consegui alguém pra fazer uma imagem de capa e foi só ela chegar que eu fiz a página. Só que nesse intervalo de tempo entre receber a ilustração da capa e colocar a página no ar eu notei uma parada muito importante: eu não sei mexer na bexiga do Facebook.

    Sem exagero nenhum, o máximo de coisa que eu já fiz na cria de Zuckerberg foi configurar a privacidade das postagens e só. Diante dessa informação não é difícil acreditar que eu não tenho a menor ideia do que eu estou fazendo. Toda a experiência em redes sociais que está no meu currículo se resume a curtir uma página e em um belo dia virar administrador dela, e isso já aconteceu umas três vezes. Em uma delas eu nem conheço o dono da página, acabei virando administrador só por que estava lá junto com a meia dúzia de pessoas que curtia a página no começo. A prova final da minha inaptidão pra isso foi a dificuldade de criar a maldita página.

    Criar páginas no Facebook é simples e intuitivo. Não é difícil de mexer, mas é praticamente impossível achar uma categoria certa pra sua página se seu site for um blog pessoal. Depois de rodar por todas elas acabei me conformando em colocar a página na categoria “Site”. Nem vou falar sobre o desastre que foi escolher o público alvo da página pra minimizar a vergonha que eu já estou passando.

    Pra terminar vou agradecer primeiramente ao pessoal da Quadro a Quadro que fez essa ilustração maravilhosa pra capa da página. Agradeço a todos os amigos que aceitaram o convite de deixar seu like na página, principalmente aos que estão fazendo campanha pra conseguir mais gente pra curtir a página, agradeço muito a você que nunca nem me viu e de alguma forma chegou aqui pra ler esse post, mas o maior agradecimento vai pra Mark Zuckerberg. Muito obrigado, Mark, sem você nada disso seria possível.

Maisa de Bikini

Uma das coisas mais legais de ter um site/blog ou derivado é justamente saber como as pessoas chegaram nas suas dependências internéticas. Quando eu olho as estatísticas do Cachorros de Bikini eu sempre presto atenção nas buscas que levam ao site. Algumas delas não tem nada demais, como por exemplo gente de fato procurando por cachorros em trajes de banho ou procurando por crônicas de temas específicos. Outras vezes aparece alguém procurando por coisas que não tem nada com nada, o exemplo mais recente disso foi alguém procurando por “quais os meses de sorte e de azar num ano e os piores do ano”. Mas até hoje a busca frequente mais estranha é “Maisa de Bikini”.

    Pra entender como isso começou precisamos voltar ao longínquo 24 de Julho de 2015. O Cachorros de Bikini não tinha nem dois meses de vida quando publicou naquela sexta-feira o texto Maisa Abandona a Infância. Desde aquele tempo não é raro aparecer alguém por aqui procurando por “Maisa de bikini”, “Maisa de biquine”, “Maisa Bikini” ou qualquer coisas desse tipo. Quando eu vi essas buscas aparecendo eu fiquei assim:

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Sério, qual a motivação que um ser humano racional teria pra procurar por Maisa de Bikini? Pare pra pensar juntamente comigo, caro leitor. Você está alegremente navegando na internet e não mais que de repente dá um estalo na sua cabeça e você pensa: “Deve ter fotos de Maisa de biquíni em algum lugar da internet”. Faz sentido? “Claro que não, Filipe, por que diabos eu vou querer ver imagens de Maisa em trajes de banho?”, concordo com você, não faz o MENOR SENTIDO alguém procurar por um negócio desses. Já tentei entender, já tentei achar o mínimo de lógica e propósito nessa busca. Busca essa tão infrutífera, que o povo vem bater aqui no Cachorros. Comparado com isso a busca por “quais os meses de sorte e de azar num ano e os piores do ano” fica bem menos absurdo. Afinal informações sobre sorte e azar são coisas com plena aplicação prática e normalmente atrelada a estudos empíricos de eventos que obedecem a certos padrões. Eu não acredito em nada disso, mas ainda me parece mais coerente do que procurar por Maisa de biquíni.

O texto de hoje não tem conclusão. O fato em si é suficiente pra me deixar sem palavras. Na falta de algo mais importante pra dizer fico só no bom dia/boa tarde/boa noite, fiquem com Deus e Maisa ama vocês.

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Contos de Segunda #43

Para saber mais sobre a história da Dama da Segunda-feira é só ler a primeira aparição dela em Contos de Segunda #38.

Um ser místico. A personificação das fantasias humanas. A encarnação de algo intangível. Qualquer uma dessas definições poderiam ser usadas para definir uma Dama. Desde tempos ancestrais elas se manifestam no plano terreno e escolhem entre os mortais os seus Cavaleiros. Uma forma de evitar a degeneração da sua consciência e o descontrole de seus poderes. Porém encontrar um Cavaleiro nem sempre é algo fácil, principalmente se você é a Dama da Segunda-feira.

    Segunda estava triste desde seu último encontro com a Mãe-de-Todas. A Dama da Lua havia determinado que ela precisava conseguir um Cavaleiro e que todas as outras Damas teriam o dever de ajudá-la. Semanas se passaram desde então e Segunda não tinha movido uma palha para atender às ordens da Mãe. Pelo menos até aquele momento. O celular começou a tocar. Era Terça-feira, a segunda Dama da Semana começou a falar antes do “alô” da irmã.

    — A Mãe-de-Todas te dá uma prensa e você não me conta nada?

    — Boa tarde pra você também, Terça-feira. Eu vou muito bem, obrigada por perguntar.

    — Nem tente me enrolar com suas ironias. Se a Mãe te chamou pra falar disso as coisas devem estar sérias. Tá sentindo alguma coisa? Lapsos de memória? Alguém perto de você começou a agir estranho do nada?

    — Não, não e não. Não tem nada sério acontecendo, Terça… Só que… Sei lá, eu não queria ninguém no meu pé. Você sabe como isso é complicado.

    — Guarda o choro pra quando estivermos as cinco juntas. Quarta-feira vai te buscar em dois minutos

    Quarta apareceu em um minuto. A irmã do meio era o puro estereótipo da mulher de negócios. Roupas formais, aspecto impecável e cara de que o tempo dela valia ouro.

    — Sabe que não precisamos fazer tudo que ela manda, né?

    — Ela é a Mãe, Segunda-feira. Você pode comandar nós quatro, mas ela comanda todas as outras.

    Segunda deu ombros. A irmã abriu novamente a passagem dimensional por onde tinha vindo e instantes depois elas estavam na casa de Terça-feira. Tanto a casa quanto a dona pareciam ter sido transportadas direto dos anos sessenta. Terça tinha uma capacidade de clarividência forte o suficiente para fazer dela uma das videntes mais requisitadas da cidade.

    — Finalmente, estava ficando preocupada. Quinta, Sexta, elas chegaram.

    As gêmeas pareciam ter vindo de uma festa de música eletrônica. Quinta tinha os cabelos pretos, usava maquiagem pesada e roupas escuras, Sexta era loira, usava roupas multicoloridas e maquiagem extravagante. Apesar da aparência diferente, as duas pareciam quase sincronizadas, principalmente no quesito empolgação.

    — É só me dizer uma balada legal, Segunda. A gente entra lá e só sai com seu Cavaleiro — disse Quinta.

    — Quem sabe a gente não arruma mais de um, tô meio enjoada do meu Cavaleiro — falou Sexta.

    — O assunto é sério, meninas — Começou Terça-feira. — Nossa Mãe colocou Segunda contra a parede e disse que ela precisava arrumar um Cavaleiro já e de quebra ainda ordenou que toda e qualquer Dama ajudasse nessa empreitada. Sentem-se que eu preciso fazer uma coisa antes de continuar — as Damas se sentaram nas almofadas do chão. Terça revelou uma bola de cristal e colocou entre ela e Segunda. — Primeiro precisamos saber o quanto você está perto de ficar pirada.

    — Eu não vou ficar pirada.

    — Calada. Coloque as mãos na bola.

    Segunda-feira obedeceu. Colocou suas mãos sobre o globo e esperou. A esfera começou a brilhar. A luz foi aumentando aos poucos. Mudando de cor, oscilando, piscando. Em alguns momentos parecia bater como um coração. A luz diminuiu até se apagar, depois disso a bola de cristal ficou completamente escura e opaca.

    — E aí? — Disse Quinta.

    — E aí que temos um problema — respondeu Terça. — O nível de energia dela está bem acima do normal. Próxima segunda é feriado, isso deve te descarregar um pouco, mas não podemos demorar muito com isso.

    — O que você sugere, Terça? — Disse Segunda externando toda a raiva que sentia com aquela situação. — O que sugerem irmãs? Que eu enlouqueça por causa de um mortal? Que eu conceda uma dádiva a um ser humano indigno?

    — Não precisa levar tudo tão a sério. Um Cavaleiro é só uma ferramenta, uma ajuda na manutenção dos nossos poderes — Interrompeu Sexta.

    — Isso é pra você, Sexta — rebateu Segunda. — Antigamente as Damas escolhiam seus Cavaleiros como se escolhe um filho e os amavam como se fossem seus irmãos. Quinta, não é muito diferente disso. Para os mortais ela é casada com o Cavaleiro dela.

    — Casos como o meu são cada vez mais raros, irmã. Veja Terça, que trocou o último Cavaleiro por cinco.

    — Cinco? — Disse Quarta. — Que obscenidade é essa? Nosso poder não pode ser distribuído desse jeito.

    — É um time de MOBA, não tem como agraciar apenas um deles com minha dádiva.

    — O que é MOBA? — Perguntou Sexta.

    — Deve ser algum tipo de seita — respondeu Quarta.

    — Ah, esquece — interrompeu Terça. — Não estamos aqui pra discutir as nossas escolhas. Precisamos ajudar nossa irmã e se alguém não tiver algo útil pra dizer é melhor não dizer nada.

    — Na verdade tem uma forma de conseguir um Cavaleiro — Quinta falou essas palavras com cuidado, como se quisesse garantir que as irmãs saberiam o que ela falaria em seguida.— Existe uma Dama que pode ajudar, mas se a Mãe-de-Todas sonhar que encontramos com ela…

    — Não, não podemos — interrompeu Quarta. — Ela foi banida, é uma Dama renegada, por pouco não foi executada pela Mãe. Se você ousou entrar em contato com ela, Quinta-feira…

    — Não sou tão transgressora quanto pareço, Quarta-feira. Ela e eu… Nos conhecemos muito antes de tudo acontecer. Antes dos crimes, antes de toda aquela confusão.

    — O que acha, Segunda? — Perguntou Terça.

    — O que eu acho? Eu acho que vamos precisar colocar um ou dois biquínis na mala, meninas.

    Quinta não conseguiu segurar o sorriso. Sexta bateu palmas de satisfação. Quarta fez uma careta de reprovação e Terça cobriu o rosto com as mãos.

    — Vamos atrás da Dama Renegada. Eu quero aprender o canto de sereia da Dama do Mar.

Barata Voadora

Uns quinze dias atrás estava eu interagindo alegremente com meus amigos no chat quando um deles, que não estava tão participativo e interativo, relatou a experiência de ter vencido, em combate singular, uma barata voadora. Depois de comentar uma ou outra coisa sobre o ocorrido, esse mesmo amigo matador de barata me diz: “tu precisa escrever sobre barata voadora”. Naquele momento eu percebi que, apesar de não saber até então, eu realmente precisava falar sobre barata voadora.

Antes de discorrer sobre essa cria do demônio esse ser tão peculiar, precisamos falar um pouco sobre a barata padrão. A barata é um ser cabalístico, misterioso e  intrigante. Além de sua capacidade de aparecer em qualquer lugar, desaparecer que nem fumaça, ter super velocidade e resistência suficiente pra resistir aos efeitos da radiação ou ao impacto de uma chinela. Ela consegue viver muito tempo sem comer, vários dias sem cabeça e se reproduzir em larga escala. Esses são só alguns dos poderes super artrópodes das baratas. Como se já não bastasse tudo isso, um belo dia a barata foi tocada pelas forças mais malignas da galáxia. Confira abaixo o que (mais ou menos) aconteceu com a barata.

Exatamente isso, caro leitor. Depois de ser tocada pelas forças das trevas mais desgraçadas do universo, a barata comum se transformou em um ser que mais parece ter saído de uma história de Lovecraft: a barata voadora.

Uma barata normalmente não tem habilidades suficientes pra agredir um ser humano. Apesar de suja, inconveniente e transmissora de doenças, a barata não é um ser agressivo. A menos que ela seja uma barata voadora. Pois a primeira coisa que esse engenho de satanás inseto maldito faz é voar direto. DIRETO. DI-RE-TO na sua cara. Essa habilidade ofensiva dispara um gatilho no nosso cérebro que nos faz correr da maldita barata. Ao escapar do voo suicida da maldita, sofremos o efeito da névoa nefasta que ela espalha pelo ar com o bater de suas asas. Depois de nos fragilizar psicologicamente e agredir olfativamente, a barata fica parada esperando terminar o cooldown das skills recuperando suas energias para mais um ataque ou para sua fuga. Nesse momento juntamos o que nos resta de determinação, improvisamos uma arma e partimos pro ataque. Acertamos o alvo, mas o sabor da vitória passa rápido. Mas porquê? Por que a desgraçada ainda está VIVA. As energias das trevas protegem a barata voadora de uma forma que ela se torna um ser imorrível ou pior, ela já morreu e foi ressuscitada pelas energias obscuras do universo. Se tornando um inseto-demônio-zumbi-imortal from hell.

Depois de tudo isso eu só tenho uma coisa a dizer: sou grato a Deus por cada dia que eu passo sem encontrar uma barata voadora. E tenho fé de que Ele vai proteger todo aquele que precisar enfrentar esse ser maldito.

18 a 25 Anos

“Estamos ficando velhos, Magneto”. Essa frase eu mandei pro meu irmão poucos minutos depois da meia-noite do dia 14 de Maio de 2016, também conhecido como último sábado, dia em que chegamos à marca histórica de vinte e seis anos de idade. “Eita, Filipe, grandes merdas completar vinte e seis, nem dá pra dizer que é marca histórica”, pode até ser, mas eu só vou completar vinte e seis uma vez na minha vida inteira, o que qualifica essa como uma marca histórica. Com a cabeça nesse número me dei conta que eu ia mudar de faixa etária.

“Jovens de 18 a 25 anos”. Normalmente é a faixa considerada pela pesquisa. Diante desse cenário atentei para o fato que as pesquisas não me consideram mais jovem. Partindo do pressuposto de que a divisão de faixa etária feita pelas pesquisas tem lógica e coerência, posso dizer que não sou mais considerado jovem. Se não sou mais considerado jovem, então de fato me tornei um adulto… Pausa ligeira pra assimilar minha repentina saída da juventude e avaliar minha nova condição de ex-jovem de pesquisa.

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Obrigado pela paciência, vou continuar.

Logo no primeiro mês do Cachorros de Bikini eu falei sobre os mandamentos de um adulto feliz. Escrevi esse texto já com meus vinte e cinco e com essa idade já tinha acostumado com a ideia de ter virado um adulto, mas até então nunca tinha chegado alguém e carimbado “ADULTO” na minha testa. Paro, penso e vejo que no final isso não mudou foi nada.

A partir de um certo ponto da minha vida eu parei de me incomodar com esse lance de idade. O mundo tenta enfiar na sua cabeça que envelhecer é um negócio instantâneo. Ouvir coisas como “tá se sentindo mais velho?” é muito comum quando se faz aniversário, normalmente minha resposta é “não”. Criou-se a ideia de que quando o relógio marca 00:00 no dia do seu aniversário você automaticamente envelhece um ano. Quando eu acordei no sábado só tinha envelhecido um dia, assim como em todos os dias anteriores. Nessa de envelhecer um dia de cada vez passaram os meses, os anos. Do primeiro dia dos dezoito até o último dos vinte e cinco foram 2921 dias. Dias que me envelheceram um pouco de cada vez, que suavemente me transformaram no adulto que sou hoje.

A idade pesa? Pesa. Olhar pra trás e ver quanto tempo passou sempre é um momento meio amargo. Saber que uma criança que nasceu no dia em que eu fiz dezoito já sabe ler, escrever e precisa das duas mãos pra contar a própria idade, assusta. Assusta saber que as amizades já duraram tanto e da idade que as boas lembranças têm. Mas só os números assustam, só me assusto quando conto, só me assusta quando eu olho pra trás e vejo o quanto caminhei. Então eu esqueço dos números, lembro olhando pra frente e se precisar olhar pra trás eu olho o retrovisor. Ficar mais velho é inevitável, mas se repararmos bem, o tanto de mudança que chega com a idade depende só de nós mesmos… Exceto a dor que dá nas costas por sentar em assento sem encosto.

Contos de Segunda #42

Os fatos narrados a seguir são uma continuação direta do Contos de Segunda #34 e tem relação direta com os eventos do Contos de Segunda #27, leia aqui a Parte 01 e a Parte 02.

Roberta estava impaciente. Fazia três semanas que ela tentava extrair uma informação muito importante: para qual amigo Jorge contava tudo da vida dele. Essa informação era vital para o plano de Luciana de juntar Jorge e Cristina. Roberta não entendia bem o por quê, mas concordou em ajudar. De fato teria ajudado, se Jorge não tivesse passado quase duas semanas viajando e tivesse voltado ao trabalho por tempo o suficiente para contrair zika, mas estaria de volta a partir daquela segunda-feira. Exatamente uma semana antes de Cristina voltar de férias e poder interceptar o plano. O problema era como fazer isso. Roberta estava perdida em pensamentos cupidoconspiratórios quando Luciana entrou na sala.

    — O boy de Cristina morreu? Volta mais não?

    — Bom dia pra você também, Luciana.

    — Eu aviso quando estiver bom — ela puxou uma cadeira para perto de Roberta e sentou.

— Três semanas, Roberta, três malditas semanas que não me renderam nada. Pensei que você e Jorge eram amigos o suficiente pra desenrolar fácil essa história.

— Faz três, como é mesmo? Malditas semanas que eu não vejo Jorge, e até onde eu sei, só encontro com ele aqui no escritório.

— Nem pra pescar no Facebook, Roberta?

— Depois que você começou com essa história ele desfez a amizade comigo, disse que não era nada contra mim, era por sua causa. Depois disso ele ativou opções de privacidade que nem Mark Zuckerberg conhece.

— Instagram?

— Jorge é tão inativo no Instagram quanto minha vó. Ela sempre espera um neto passar lá pra ajudar ela com os filtros.

— Nem Linkedin?

— Nem sei, não uso Linkedin.

    — Deve ter alguma coisa em algum lugar. E-mail ou celular… Isso, preciso do celular.

    — Ah, não. Não vou roubar celular de seu ninguém.

    — Deixa de ser dramática, Roberta. Esse vai ser o plano B. Se não der pra conseguir nada hoje, amanhã a gente tenta o celular.

    — A gente você, Luciana. Eu tô fora dessa de pegar celular dos outros.

    — Só não te digo umas verdades por que o boy já passou ali do outro lado e eu tenho uns cinco segundos pra sair sem ele me ver. Vê se consegue as coisas hoje, beijo.

    Poucos segundos depois Jorge entrou na sala. Ele parecia estar totalmente recuperado.

    — Bom dia, Roberta. Como ficaram as coisas aqui enquanto eu estava fora?

    — Melhor do que você imagina. Curtiu bem a zika?

    — O máximo que eu pude. Nos primeiros dias eu fiquei dormindo sem parar, só depois que eu consegui fazer alguma coisa. E os preparativos do casamento?

    — Meu irmão tá me deixando maluca, é pior que a noiva. Agora ele cismou que quer uma banda que toque só rock.

    — Um amigo meu é guitarrista. A banda dele é muito boa, toca todo tipo de rock. Se quiser eu passo o contato.

    — Sério?

    — Sério. Nunca vi ele dizendo que tocou em casamento, mas acho que ele topa. Se ele disser que não aceita, me avisa que eu converso com ele. Tenho alguns favores pra cobrar.

    — Ah, Jorge — o rosto de Roberta corou de leve . Nunca que eu ia te pedir pra fazer uma coisa dessas.

    — Fábio é quase meu irmão, pra mim ele desenrola essa guerra.

    — Valeu mesmo, Jorge.

    Roberta voltou para seu computador. Quando estava para voltar ao trabalho teve um estalo. Um detalhe que por pouco escapava. Foi quando a chama da conspiração se acendeu no seu peito. Ela pegou o celular, abriu o chat com Luciana e mandou uma mensagem.

    “Já tenho o nome do alvo.”

    “Só com o nome não dá pra achar.”

    “Nome e telefone. Depois eu explico melhor.”

    O pacto de cumplicidade acabava de ser selado. Roberta não gostava muito de fazer essas coisas… Mas agora não tinha mais volta.

Espirro

O tema da postagem dessa sexta-feira foi decidido na semana passada. Em alguns períodos mais inspirados eu consigo a proeza de ter uns quatro ou cinco temas já escolhidos. Acordei hoje de manhã com a certeza que ao fim do dia eu teria uma análise bem humorada sobre uma tendência social que vem crescendo nos últimos tempos, mas o processo criativo é aleatório e de vez em quando rende umas surpresas interessantes, pelo menos interessantes pra mim. O tema programado pra hoje, infelizmente, vai ser sumariamente descartado e no lugar dele teremos um dos temas mais bestas já tratados nesse blog.

Tudo começou hoje de manhã. Estava eu alegremente a caminho do trabalho juntamente com uma amiga minha que sempre pega carona comigo. Durante o trajeto em direção ao Raincife notei que ela realizou um rápido movimento de cabeça com uma das mãos no rosto. Prontamente perguntei “Isso foi o quê, hein? Foi um espirro?”, e ela me respondeu que sim, aquela era a versão do espirro dela para ambientes fora de casa. “Meu espirro é muito escandaloso”, justificou ela. Não preciso nem dizer que imediatamente meu cérebro começou a trabalhar. Não que meu cérebro tenha feito um trabalho extraordinário, normalmente ele só faz o basicão mesmo e ocupa o resto do tempo com toda sorte de besteira, mas ele trabalhou o suficiente pra chegar à conclusão de que eu precisava falar sobre isso, hoje e aqui.

Durante toda a minha vida eu vi, mas depois de muitos anos eu atentei para o fato de que mulheres normalmente tem um pequeno problema em relação a tosses e espirros. Principalmente espirros. Farei um desafio para você, leitor do sexo masculino, puxe da memória alguma vez em que você viu uma mulher dar um espirro alto, ruidoso, sonoro e/ou escandaloso. Conseguiu? Eu também não. Isso me leva à conclusão de que mulheres não conseguem simplesmente espirrar de boas.

Uma disfarçada, uma segurada ou a incapacidade de espirrar pra fora. Não, não estou exagerando, já ouvi relatos de uma moça que afirmou não conseguir espirrar da forma que eu considero biologicamente mais apropriada. Aí nesse momento eu me pergunto:

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Gostaria muito de ser esclarecido quanto essa particularidade feminina em relação à etiqueta do espirro. Infelizmente minha cabeça não consegue chegar sozinha à uma resposta satisfatória. Se alguma moça puder clarear minha mente em relação a isso ficarei eternamente grato. Desde já agradeço pela atenção e até a semana que vem com um texto um pouco mais relevante.

Dia das Mães

No último domingo, também conhecido como dia 8 de Maio de 2016, foi comemorado o Dia das Mães. Nem preciso dizer que o tema do texto dessa quarta-feira já estava definido muito tempo atrás, afinal esse é o primeiro Dia das Mães do Cachorros de Bikini e data tão importante não poderia passar batida. Já tinha me preparado pra fazer alguma coisa parecida com o que eu fiz no Dia dos Pais, mas eis que um evento recente fez tudo mudar. A análise sobre a data em si vai ter que ficar pra 2017.

Na semana passada foi aniversário de Vó. No dia 4 de Maio ela chegou à impressionante marca de 84 anos. Infelizmente não pude dar os parabéns pessoalmente no dia 4, por isso dei uma ligada pra ela. Até aí nada de muito diferente dos anos anteriores, foi quando ela me disse uma coisa que me deixou pensativo. Em meio à alegria de receber os parabéns, ela me diz “você é um filho que eu não tive, os outros todos eu tive, não tive você, mas você ainda é meu filho”. Caso as palavras de Dona Irene tenham te deixado com dúvida, me dê um momento e eu vou esclarecer. Vovó teve um monte de filhos, alguns morreram ainda muito pequenos, o mais velho morreu adulto, e os outros cinco que restaram são todos filhos ótimos, ou seja, de filho minha vó não tem do que reclamar. Pra ela os netos sempre foram tão filhos quanto qualquer um dos outros, filhos que não foram gerados por ela. Pode parecer redundante falar isso, afinal, por definição, vó é mãe duas vezes, mas uma coisa é você saber que é assim, outra é você ouvir isso da matrona da família Gomes. Até por que nem todas as avós pensam nos netos efetivamente como filhos. Refletindo sobre isso atentei para um detalhe. Atentei pra todas as mães que tem filhos que elas não tiveram.

A maternidade é algo natural. Ela deriva dos instintos de preservação da espécie e zelo pela prole, acredito que todos os mamíferos agem movidos por esse instinto. Porém nem sempre o processo de gerar um filho é obrigatório para manifestação da maternidade. Tem vez que acontece por escolha, outras por acidente, mas boa parte das pessoas acaba sendo um filho pra várias mães. Tias, avós, vizinhas e derivados são candidatas fortes à essa maternidade extra-uterina, principalmente as que já geraram seus filhos e os rebentos já estão crescidos. A prole cresce, fica independente, mas mãe não funciona do mesmo jeito. Mãe é mãe e pronto. Outras candidatas fortes são as que sempre quiseram, mas nunca geraram um filho. Com essas é um pouco diferente, nesses casos a maternidade não é só o instinto, é um chamado. Mulheres que nasceram com um alerta luminoso no coração que diz “INSIRA UM FILHO AQUI”.

E isso tudo eu falei só pra poder dizer que pra ser mãe basta ser mulher. Basta ter amor, vontade de nutrir e cuidar, um coração com espaço pra sempre caber mais um. Pra ser mãe basta ter um útero, não importa se ele já gerou dez filhos ou nenhum. Nem todo útero consegue gerar um filho, mas todos eles conseguem gerar uma mãe.

Contos de Segunda #41 – Parte 02

Para ler o início dessa história é só dar uma lida em Contos de Segunda #29 e Contos de Segunda #32. Para ler a primeira parte desse conto, é só clicar no link e ler Contos de Segunda #41 – Parte 01.

O táxi até o jockey club consumiu praticamente tudo que restava na minha carteira. Segunda-feira não costumava ser um dia movimentado, os páreos principais aconteciam normalmente no domingo. No máximo alguma categoria amadora ou juvenil competiria naquele dia. Diante do fraco movimento imaginei que seria fácil conversar com alguém que trabalha na bolsa de apostas. Passava um pouco do meio-dia e o tempo estava correndo. Angela dependia de mim para comprovar a sua inocência.

    Não demorou muito para encontrar a bolsa de apostas. Vários nichos protegidos por grades de ferro. Não era muito diferente de uma bilheteria. A maioria dos guichês estava fechada, apenas um estava aberto. Um funcionário operava uma máquina calculadora e não parecia notar a minha presença.

    — Boa tarde — tentei parecer o mais gentil que o meu estômago faminto me permitiu.

    — Boa tarde, senhor. Hoje as apostas estão fechadas, voltamos só na quarta-feira.

    — Não estou aqui para apostar, meu caro. Estou aqui por causa de um apostador.

    — Não costumamos trabalhar com informações de nossos apostadores, senhor — uma resposta tão metódica e desprovida de emoção deixava claro a falta de suspeita daquele homem.

    — Vou ser bem direto. Preciso saber sobre alguém que ganhou alguma quantidade de dinheiro fora do comum nos últimos dias.

    — Infelizmente, senhor, nenhuma quantidade de dinheiro é considerada fora do comum na nossa bolsa de apostas. E de qualquer forma, eu não costumo ver os apostadores que vêm reclamar seus prêmios maiores.

    Aquilo teria me deixado encurralado, mas meu cérebro não me deixou na mão daquela vez.

    — Imagino que os apostadores mais antigos daqui se conheçam.

    — Creio que sim, principalmente os que costumam ganhar pouco.

    — Algum desses está por aqui hoje?

    — Não… Mas todos eles são conhecidos de Gregório. Gregório é o responsável pela manutenção dos estábulos. Todos vão atrás dele tentando conseguir uma dica valiosa. Você sabe, algum jóquei doente ou um cavalo que esteja mais cansado do que o normal.

    — Agradeço pela atenção, meu amigo. Boa tarde.

    Estábulos. Talvez a única área do jockey que funcionava sete dias por semana. Alguns cavalos ficavam aqui a semana toda, outros só chegavam para as provas, mas nenhum deles entrava ou saía sem que Gregório soubesse. Não foi difícil de vê-lo assim que cheguei. Um homem corpulento com mais ou menos sessenta anos estava dando uma bronca em um jovem de uns quinze anos. Aparentemente o proprietário de um dos cavalos estava insatisfeito por culpa dele. Esperei Gregório ficar sozinho para me aproximar.

    — Boa tarde, senhor. Imagino que seja Gregório?

    — Quem deseja? — ele parecia desconfiado, mas nem por isso menos cortês.

    — Pode me chamar de Carmim. Sou um investigador particular e estou trabalhando em um caso de desaparecimento.

    — Bem, senhor… Carmim, certo? Não sei como ajudá-lo, como pode ver eu só cuido dos estábulos e não me recordo de nenhum conhecido meu que tenha desaparecido.

    — Estou tentando encontrar Humberto Solini. Soube que ele costuma apostar por aqui. Ouvi falar que o senhor conhece os apostadores mais antigos daqui.

    — A segunda afirmação está correta, a primeira… Nem tanto — ele não parecia querer se esquivar do assunto, parecia mais que ele só estava me esperando perguntar.

    — E por que não estaria?

    — Solini não é só um apostador. Ele é dono de um dos melhores cavalos de corrida da região.

    — Então ele deve gostar de apostar no próprio cavalo.

    — Normalmente é isso que acontece, mas Solini não gostava de apostar quando o cavalo dele estava correndo. Você deve saber que apostar em um cavalo que vence quase sempre não paga muito bem. Isso ficava pros amigos dele. Eles sempre vinham aqui me perguntar dos outros cavalos do páreo.

    — Solini nunca apostava no páreo do próprio cavalo?

    — Nunca é um pouco exagerado, ele apostava às vezes. Outras vezes ele apostava nos cavalos concorrentes. Sempre aparece algum campeão regional pra correr por aqui. Ele fez isso nesse último sábado, apostou em um outro cavalo. Um azarão como eu nunca vi. Primeiro páreo dele e ganhou com um pescoço de vantagem. O cavalo de Solini ficou em terceiro. O jóquei dele não estava bem, morreu no sábado — mais um corpo na pilha.

    — E os amigos de Solini?

    — Não lembro deles por aqui.

    — Soube de alguém que perdeu muito dinheiro com essa corrida?

    — Não lembro de tanta gente perdendo dinheiro em um páreo. Era uma barbada, o cavalo de Solini era o melhor de todos, sem sombra de dúvida. Deve ter perdido por causa do jóquei. Solini devia saber, por isso apostou em outro cavalo.

    — Depois disso imagino que não tenha ouvido falar mais nada sobre Solini.

    — Nada… Mas talvez você consiga saber alguma coisa com o pessoal que vai levar o cavalo dele. Eles normalmente chegam em dia de segunda — ele conferiu o relógio. — Devem chegar a qualquer momento.

    — Qual o nome do cavalo?

    — Cubano.

    — Muito obrigado, Gregório.

    Finalmente um pouco de sorte. Bastava esperar os homens que buscariam o cavalo e segui-los até Solini. Ninguém estava vendendo cachorro quente naquela segunda, o almoço teria que esperar mais um pouco. O relógio marcava duas da tarde quando vieram buscar o cavalo. Não foi difícil me esconder no caminhão sem ser notado. Eu dividiria o compartimento de carga com Cubano, nunca tive afinidade com animais, mas ele me pareceu um cavalo simpático. A viagem foi rápida. Aparentemente Solini estava escondido em uma propriedade nos arredores da cidade. Esperei o cavalo sair e os homens se afastarem. Desci do caminhão e me dirigi para um casarão onde provavelmente Solini estava.

    De fato Solini estava lá. Provavelmente ele teria cooperado comigo e me explicado toda a situação, mas três carros cheios de homens armados e sem nenhuma paciência ou cortesia estacionaram na frente da casa. Ele não teve tempo de falar muita coisa além de…

    — Cuidado!

    A primeira rajada de balas não passou nem perto de acertar. Era só um aviso. Humberto tremia na minha frente, dava pra ver nos olhos do coitado que ele nunca tinha passado por uma situação semelhante. Eu precisava ajudar. Saquei minha pistola. Eu só tinha dois pentes, um deles estava carregando a arma. uma das janelas estava quebrada, me aproximei para espiar lá fora. Sete homens bem vestidos, todos eles armados. Um deles me viu.

    — Jogue a arma pra cá e saia de mãos pra cima, Carmim. Você não tem como fugir.

    — Não atrapalhe nosso serviço e te deixamos sair ileso dessa.

    — Parece que tem algumas pessoas muito irritadas contigo, senhor Solini.

    — Nada disso devia acontecer, estava tudo certo. Se não fosse aquele maldito jóquei.

    — Esqueça o jóquei, precisamos sair daqui. Angela está esperando, ela me contratou para encontrá-lo.

    — Angela? Me esperando? Rá! Aquela desgraçada tem mais culpa nisso do que aquela meia dúzia de capangas lá na frente.

    — Droga, Angela — falei tão baixo que quase não consegui me ouvir. — De todo jeito precisamos sair daqui. Alguma ideia?

    — Eu tenho um carro na garagem lá de trás, um rápido.

    — Acha que consegue fugir sozinho?

    — Não quer vir comigo, senhor?

    — Serei mais útil como distração. Precisa ir direto à polícia. É o único jeito.

    — Mas e o meu dinheiro?

    — Melhor sem dinheiro do que morto — não havia como contra argumentar. Ele saiu correndo pela porta da sala, aparentemente ninguém tinha reparado. Coloquei a cabeça para fora da janela e falei com meus amigos armados. — Tudo bem, eu vou sair. Por favor, não atirem.

    Caminhei lentamente pela porta com as mãos para cima. Os homens tinham total atenção em mim.

    — Onde está Humberto Solini?

    — Não vi esse tal Solini — a mentira não podia falhar. — Quem abriu a porta foi o caseiro… Ele foi baleado e está caído ali no chão.

    — Baleado? — Pelo menos um tinha caído na mentira, os outros cairiam também.

    —O chefe pediu pra não ter ninguém ferido além do Solini — suas palavras expressavam preocupação.

    — Eu sei, eu sei. Vamos dar um jeito.

O ronco de um motor. Um carro esportivo saiu a toda velocidade pela estrada. Os meus novos amigos demoraram um pouco para entender o que estava acontecendo. Aquele que parecia o líder deles deu as ordens.

— Vocês três, entrem na casa, encontrem o dinheiro e não tirem os olhos desse detetive . O resto vem comigo.

Aparentemente eles esqueceram da parte de ficar de olho em mim. Passaram um bom tempo vasculhando o casarão. Tempo suficiente para não me ver entrar no caminhão que trouxe o cavalo e pegar a estrada para longe da perseguição. Meu trabalho havia terminado, agora tudo dependia de Solini.

No dia seguinte os jornais estampavam a história de um rico diretor de um banco que cometeu o erro de apostar contra o próprio cavalo em uma corrida que já tinha resultado definido. Todos aqueles que perderam grandes quantidades de dinheiro na ocasião estavam sendo investigados pela polícia. Aparentemente nenhum detetive que gostava de vermelho corria risco de vida. Eu estava quase aliviado quando o telefone tocou.

— Muito obrigado por nada, Carmim — a mulher no telefone não parecia nem um pouco agradecida.

— De nada, Angela. Da próxima vez que escolher um namorado novo, lembre que não precisa matar o namorado antigo. Bastava se separar, fazem muito disso hoje em dia.

— Não precisaria me preocupar com isso se um certo detetive não gostasse de planejar fugas.

— Da próxima vez arrume capangas mais eficientes.

— Ah, Carmim. Você não cansa de me maltratar, não é?

— Digo o mesmo, Angela. Digo o mesmo.

O telefone bateu de leve no gancho. Angela me mataria se pudesse, mas a lista de corpos já estava grande demais. A polícia não tinha descoberto a ligação dela com os assassinatos, provavelmente nunca descobriria. Mas ela ficaria com um bom pedaço do dinheiro recuperado de Solini. Apesar de tudo isso um envelope chegou na minha caixa de correio. A caligrafia do remetente era inconfundível. Angela podia estar furiosa comigo, mas pelo menos ela me pagou pelo serviço. Nada mal para uma segunda-feira de trabalho.

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