Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Mês: novembro 2016 Page 1 of 2

2016, Um Ano para Recordar (?)

    Esse ano um evento movimentou as interwebs. Do nada os meus feeds foram invadidos por todo o tipo de manifestação apaixonada, sites que eu visito começaram a falar sobre isso, podcasts que eu escuto foram afetados e pessoas que eu conheço foram totalmente absorvidas pela magia desse acontecimento. Esse ano rolou o retorno/despedida de Gilmore Girls. Aqui no Brasil a última temporada das Lorelai lá ganhou um subtítulo bastante sugestivo: Um Ano para Recordar. Depois de filtrar todo esse excesso de nostalgia e overdose de Lorelai, café, diálogos rápidos e fãs tirando a poeira do Stars Hollow que existe dentro de seus corações, meu cérebro começou a trabalhar.

2016 está no fim. Hoje é o último dia de novembro e amanhã começa oficialmente o fim do ano. Finalmente os enfeites de natal estarão dentro do contexto, os comerciais da Coca-Cola vão mostrar a magia dessa época e vão começar a anunciar a programação de fim de ano da Globo. Pensando sobre o final de mais um ciclo solar e em todas as desgraças coisas que aconteceram nesses trezentos e trinta e poucos dias me veio a seguinte questão: 2016 é um ano para recordar?

Nem sempre os anos são memoráveis. Muitas vezes os anos são tão qualquer coisa que a gente vive lembrando das coisas que rolaram nele como se acontecessem em algum outro ano que foi mais relevante. Outras vezes os anos são tão bons que a gente nem se incomoda dele demorar um pouco mais a passar, outras vezes o bom e o ruim se equilibram de tal forma que fica difícil de saber se o saldo do ano foi negativo ou positivo. Algumas vezes os anos são 2016.

É bem provável que 2016 termine com um saldo negativo pra maioria das pessoas, mas de todo jeito algumas coisas boas aconteceram em 2016 pra todo mundo. Olhando para o calendário eu vejo que o ano pareceu longo por causa do tanto de coisa que aconteceu e quando eu penso mais um pouco vejo que apesar de muito canalha, 2016 foi um ano que trouxe consigo muitas coisas legais. Talvez não em número suficiente pra suplantar as coisas boas, mas em número suficiente pra nos fazer aguentar até agora esse ano cão. É só procurar que dá pra achar, é só catucar que aparece é só raspar que eu tenho certeza que tem.

É bem provável que o meu 2016 seja melhor de lembrar do que foi de viver. Inclusive algumas das coisas boas desse ano aconteceram dentro das páginas deste humilde blog. Conquistas pequenas como a publicação de número cem, os cinquenta contos de segunda, a página do Facebook e o primeiro aniversário, são tão significativas e tão banais quanto todas as outras pequenas coisas que aconteceram fora da internet. Em algum momento algo bom aconteceu no 2016 de todo mundo. Nem que seja o retorno/despedida de uma série que mora no coração.

Contos de Segunda #64

Erick caçava dragões. Depois de uma orientação profissional relativamente ineficiente, ele virou vendedor ambulante na fila do desemprego. O Caldo do Dragão ficou tão famoso que Erick tinha funcionários vendendo o ensopado em mais três pontos da cidade. Erick finalmente havia encontrado uma profissão menos mortal e os negócios estavam crescendo. Tudo parecia bem… Até um certo dia em que o passado bateu na porta do caçador.

Asas negras fizeram sombra sobre a cidade. Jatos de fogo lambiam os telhados das casas e uma cauda açoitava o alto das muralhas. Com uma frase a apresentação foi encerrada.

— Tragam-me Erick, o caçador — a poderosa voz do dragão podia ser ouvida em toda a cidade.

Ninguém precisou dizer a Erick o que ele precisava fazer. Mesmo longe da profissão, o escudo revestido de couro de dragão e a espada sempre estavam com ele. O elmo, a placa do peito e as manoplas da armadura estavam disfarçadas entre os ingredientes do caldo. O selo mágico dado pelo sindicato foi rompido. Mesmo um caçador aposentado tinha um juramento a cumprir. Seguindo o selo quebrado outros chegariam logo, mas ele precisava ganhar tempo. Precisava tirar o dragão da cidade.

Erick subiu na construção mais alta que encontrou. Não precisou nem se esforçar, o dragão chegou antes que ele pudesse pensar em uma forma de chamar atenção. Negro e cinza tingiam as escamas da fera. Um dos olhos fora arrancado. As inúmeras cicatrizes eram lembranças vivas das inúmeras batalhas travadas pela besta alada.

— Ah, caçador. Pensaste que teu novo disfarce te esconderia de mim?

— Jamais, nobre Cicatriz. Apenas acreditei que meus colegas seriam um pouco mais eficientes ao tratar contigo.

Um jato de fogo que teria largado a carne de Erick dos ossos foi segurado pelo escudo. Aproveitando a distração, Erick saiu do alcance do fogo pelo lado do olho cego do dragão e deu uma estocada entre os dedos da criatura. Saltou para o próximo telhado e depois para a rua na direção do portão principal.

— Foges de mim, caçador? — Debochou Cicatriz. — Das outras vezes te mostraste um combatente mais digno.

A serpente alada saiu no encalço de Erick por cima dos telhados. O escudo de Erick já estava nas costas para prevenir qualquer sopro de fogo que viesse por trás. O portão estava perto, logo ele atrairia o dragão para longe da cidade. O plano daria certo se o dragão não tivesse se colocado entre Erick e o portão.

— Não escaparás agora, caçador.

Espada de volta na bainha e escudo de volta no braço esquerdo. Erick não queria ferir o dragão, só precisava de uma abertura para passar. Correu para o lado cego da fera, forçando o maldito a se virar para enxergá-lo. Tudo para tirar a cauda da besta do portão. Correu com o escudo na frente. As chamas banharam a investida, mas o dragão não soprou chamas por muito tempo, ele precisava localizar o alvo que já estava quase passando por ele. Tentou acertar Erick com a garra das asas, mas com um salto e um rolamento o caçador se livrou do ataque. Quando Cicatriz se deu conta o caçador já tinha passado pelos portões. Em uma investida mal planejada ele se lançou contra o homem de armadura, mas não terminou o ataque. O corpo do dragão ficou preso no portão.

— Muito esperto, caçador. Mas muito te enganas se achas que estou derrotado.

— Infelizmente, Cicatriz, não há escapatória para ti hoje. Os caçadores logo chegarão para te dar o fim que mereces. Eu poderia te oferecer uma refeição enquanto esperas, mas meu caldeirão de ensopado ficou do lado de dentro dos muros.

Hoje é Black Friday

Sexta-feira. Até pouco tempo atrás esta seria uma sexta comum, afinal faz bem pouco tempo que a sexta-feira depois da 4ª quinta-feira de novembro começou a significar alguma coisa para nós brasileiros. Faz pouco tempo que chegou no Brasil a Black Friday.

Pelo nome já dá pra concluir que a Black Friday é coisa de norte-americano. Nos Estados Unidos as lojas costumam fazer promoções violentas na sexta-feira depois do Dia de Ação de Graças como uma forma de abrir a temporada de compras de Natal e aproveitar que muita gente está de folga por causa do feriado de Ação de Graças. Por lá isso rola faz bastante tempo. De acordo com um artigo da Wikipédia em inglês, o costume de fazer promoções nesse dia começou em 1932. Obviamente naquela época as coisas aconteciam em escala muito menor.

Então chegamos ao Brasil. A Black Friday brasileira começou lá em 2010 em mais ou menos cinquenta lojas online. A prática Black Friday foi ganhando força até chegar às lojas físicas e até mesmo aos comerciantes informais. Aparentemente todo mundo quer entrar na brincadeira, mas não, ninguém quer uma multidão de consumidores em uma histeria coletiva e por isso que a Black Friday no Brasil não é aquela coisa que se diga “minha nossa, mas que Black Friday”.

A verdade é que os calendários das promoções para os lojistas é mais ou menos fixo e adivinhem o que acontece quando entra uma data promocional nova no calendário? Exato, todo mundo quer participar, mas participar do dia do ano em que, pelo menos teoricamente, os preços deveriam atingir seu nível mais baixo menos de um mês antes do natal…

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É, se eu fosse um dono de loja não ia me parecer uma ideia muito boa, mas como participar então? Aí depende da matemática de cada um. Tem loja que sobe preço e dá o desconto que puxa de volta o produto pro preço antigo, tem loja que aproveita pra desencalhar aquelas paradas que ninguém quer e outras gambiarras diversas que só o brasileiro é capaz de fazer. E como tudo feito por brasileiro, boa parte dessas promoções realmente estão tirando onda com a sua cara.

Imagine que você quer um negócio. Agora imagine que existe um produto similar que é um pouco melhor, mas bem mais caro e que provavelmente é bem menos vendido. Você espera pela Black Friday e quando ela chega… O produto mais caro ficou um pouco mais barato e o que você queria continua a mesma bosta. Não é muito difícil que você acabe comprando exatamente aquilo que o lojista quer. Pior que isso só aqueles descontos mínimos que no máximo compensam o valor do frete.

Mas aí eu pergunto: como vai ser a Black Friday com todo mundo liso?

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É, acho que vai ser meio, digamos, morna essa Black Friday de hoje. Desconto é desconto, mas a fatura do cartão ainda chega no fim do mês e o efeito das magias mentais dos lojistas andam cada vez mais fracos. Eu mesmo estou determinado a não… Pior que tem um negócio que eu ia comprar de todo jeito na promoção e um jogo que eu sou bem curioso pra jogar tá com um desconto muito louco… Boa Black Friday pra vocês e até semana que vem.

Eu, Você e A Indecisão

    Desde ontem uma pergunta martela na minha cabeça: sobre o que escrever no post de quarta? Lembrei que queria escrever um negócio faz tempo, mas depois senti que devia escrever sobre outra coisa, cogitei usar um tema sobre o qual estou querendo muito escrever, mas só vai sair em dezembro por ser um post com a cara do fim do ano, também veio à mente uma conversa que tive ontem e hoje percebi que tinha esquecido de fazer um post sobre uma determinada música. O resultado disso tudo foi que eu não não consegui escolher. A minha sorte é que aqui eu posso escrever sobre tudo e qualquer coisa, inclusive sobre não conseguir escolher as coisas. Hoje vamos falar de indecisão.

    Até um tempo atrás a gente conseguia ser mais assertivo com as coisas. Um dos males da modernidade e da ascensão do capitalismo é que nós temos opção demais pra tudo. Tudo que é possível consumir apresenta um leque de opções tão grande que escolher está cada vez mais difícil. Desde uma roupa ou um celular, até os filmes no Netflix ou os jogos em diversas plataformas, pra tudo temos opções suficientes pra perdermos horas escolhendo e não nos decidirmos por nada.

    Imagine que você precisa comprar um calçado. A primeira escolha é: loja física ou virtual. Depois você precisa escolher a loja e finalmente iniciar as buscas pelo modelo desejado. Se você estiver ciente exatamente do que você precisa já temos metade do caminho andado, se não você se lascou e muito provavelmente vai perder um tempo considerável perdido entre todos os sapatos, sandálias e derivados. É bem provável que a impossibilidade de escolher te faça comprar mais de um ou de comprar nenhum. Depende também da verba disponível, saldo do cartão de crédito e mais algumas outras variáveis dessa natureza.

    Percebeu que a simples compra de um calçado apresenta uma quantidade enorme de escolhas que precisam ser feitas? Pois é, pequena criança leitora, veja o tanto de escolhas precisamos fazer antes de colocar um pé no chinelo. Agora imagine que a todo momento fazemos escolhas. Boa parte delas são automáticas e para nós nem se parecem com escolhas, já que a decisão é tão rápida que nem parece que escolhemos alguma coisa. Agora imagine que muitas das alternativas apresentadas parecem igualmente boas, ou igualmente ruins. Imagine que a pessoa que precisa escolher não sabe bem o que diabos ela quer. Eis que surge a indecisão.

Algumas pessoas são indecisas por natureza. De fato nem sempre é possível decidir ligeiro sobre algo, mas eu imagino o pânico sentido por uma pessoa que não consegue decidir nunca ou a raiva que sente uma pessoa que depende de uma pessoa indecisa pra saber o que deve fazer. Agora imagine isso em um mundo que cada vez mais se esforça pra nos deixar na dúvida. É, eu também achei essa imagem mental uma bosta.

Eu sei que muitas ideias me ocorreram para o final deste post, mas como não consegui escolher nenhuma vou encerrar por aqui mesmo.

Contos de Segunda #63

    Moacir estava de mau humor. Não que isso fosse novidade, principalmente em segundas-feiras. Se bem que para Moacir o ano inteiro foi uma grande segunda-feira. Tudo deu errado desde o primeiro dia do ano. As piadas sobre o presente errado que ele deu no amigo secreto que normalmente duravam até o carnaval ainda estavam rolando no Dia de Finados. O aumento de salário que foi prometido não veio, assim como o novo computador e a entrega do apartamento. A mudança devia ter acontecido enquanto Moacir estava de férias, mas uma briga entre a construtora e a imobiliária acabou atrasando a mudança em três meses. Fazia duas semanas que Moacir empacotava as coisas.

    Naquela segunda em específico ele estava de mau humor por causa do ano que custava terminar. O calendário que ficava pendurado na parede da cozinha foi feito em pedaços, o bom dia do porteiro foi respondido com alguma grosseria ininteligível e todos os xingamentos possíveis e imagináveis foram ditos no caminho até o trabalho. Chegando lá Moacir se depara com alguns colegas tendo alguma discussão banal sobre qualquer coisa. Passou por ela torcendo para que ninguém tentasse puxá-lo para dentro da conversa, mas uma frase frustrou seus planos.

— Num dá vontade de dar uma voadora nas costas com um murro na nuca de um sujeito desses?

— Só sendo muito idiota pra achar que dá pra fazer um negócio desses — rebateu Moacir.

Um silêncio funeral tomou conta da roda de conversa. Talvez se Moacir tivesse pensado por meio segundo ele não teria dito aquilo. Porque ninguém naquele recinto tinha coragem de falar daquele jeito com a autora da frase. A autora da frase era Fernanda, provavelmente a pessoa mais raivosa da face da terra, uma mulher que normalmente era bastante controlada… Até que alguém soltasse uma resposta igual a essa de Moacir.

— Como é, Moacir? — Fernanda estava claramente começando a ferver por dentro.

Moacir olhou nos olhos da moça, viu a fera que se escondia atrás deles e decidiu que precisava brigar com alguém.

— É, Fernanda, tem que ser idiota pra pensar um negócio desses. Imagina a cena. Não dá pra acertar uma voadora nas costas de uma pessoa e um murro na nuca ao mesmo tempo. Você já deu uma voadora em alguém? Já tentou fazer alguma coisa enquanto dava uma voadora em alguém?

— Tá maluco, Moacir? Você chega, nem pra dar um “bom dia” pro pessoal, ouve a conversa pela metade e ainda fica me chamando de idiota? — Ela deu um murro na mesa. — Eu não tenho culpa que você acordou de ovo virado hoje. Se você quiser falar merda pra alguém que vai aguentar calado, você vá falar com a senhora sua mãe ou praquela mosca morta que você chama de namorada.

— Eu não tenho que falar com ninguém. A culpa não é minha se você não aguenta ouvir uma verdade.

— Verdade? VERDADE? Agora você conseguiu me irritar de verdade.

— Ainda por cima fica fingindo raiva. Sabia que essa tua fama de esquentada era só marketing.

Uma caneca saiu voando na direção de Moacir. Por sorte Fernanda tinha errado.

— Ficou louca? E se aquilo me acertasse?

— Se te acertasse eu fazia questão de aparecer no hospital pra arrancar os pontos que iam fazer no buraco da tua cara. Só pra te ver sangrar mais um pouco, filho da…

A frase não terminou. Fernanda foi segurada por alguns colegas enquanto outros recomendavam que Moacir fosse embora. Ele obedeceu. Saiu andando pelo corredor e quando estava chegando perto da porta da sala ele ouviu passos acelerados, como se alguém estivesse correndo. A ideia disso estar acontecendo parecia tão absurda que ele nem fez questão de se virar na direção do som. Um piscar de olhos depois ele estava de cara no chão, com uma dor no meio das costas.

— É. Parece que não dá pra acertar um murro na nuca enquanto se dá uma voadora… Babaca.

Fernanda levantou e saiu andando. Ela gostou tanto de acertar um chute em Moacir quanto ele gostou de receber. No final todos receberam um convite a comparecer na sala do chefe e precisaram ouvir um sermão de meia hora. Não dá para dizer que eles se tornaram amigos, mas nunca mais eles se estranharam.

2016 Já Deu

Lá no finalzinho de 2015 eu fiz uma ligeira retrospectiva do ano. Lá eu fiz uma previsão tão óbvia que não precisou ser prevista pelos Simpson: se 2015 foi um ano difícil, 2016 não ficaria atrás. Quando eu escrevi essas palavras eu ainda estava otimista com o ano que viria. Eu acreditava que essa previsão poderia estar enganada. Não estava. 2016 foi um ano esforçado. Provavelmente o ano que mais se esforçou em ser um ano ruim. Eu já tive anos ruins, mas 2016 está de sacanagem e por isso que ainda estamos na metade de novembro e faz uns dois meses que eu tô desejando que esse ano acabe.

Já deu de 2016. Sério, já foi toda a paciência, coragem, determinação e derivados de todo mundo. Tá todo mundo liso, cansado, olhando pro calendário e achando que nunca demorou tanto pra passar. Já deve fazer uns 10 anos que 2016 começou, uns 20 que Temer é presidente, Dilma já foi impichada umas 200 vezes e todo dia Trump ganha a eleição americana. O campeonato brasileiro já teve umas mil rodadas, Anitta já fez plástica suficiente pra criar outro corpo, Wesley Safadão já ficou 100% vagabundo e já já começam os Jogos Olímpicos de Tóquio e esse ano cão não acaba.

O desejo pelo fim de 2016 só não é maior do que o medo de 2017 ser pior, o que é bem difícil porque convenhamos, esse ano tá entre os piores de todos os tempos. A minha vontade é chamar 2017 de 2016 pra ver se salva por cima e apaga esses 366 dias. Se o ano for bom o suficiente é bem capaz de apagar das nossas cabeças toda essa mazela que atende pelo número de 2016.

42 dias. É isso que falta pra 2016 acabar. Quarenta e dois dias. O relógio está desacelerando e o contador do calendário anda preguiçoso, vão ser dias demorados e tão complicados quanto o resto do ano. Só posso dizer a você, e a mim mesmo, que não se aflija, não tema, porque 2017 não tarda a chegar.

Pode Até Ser Bom, Mas Eu Não Gosto

Uma coisa que eu demorei pra aprender foi a ter (o mínimo de) respeito pelo gosto dos outros, afinal já dizia o ditado: “gosto é que nem braço, tem gente que não tem”. De fato muita gente não tem um gosto, digamos, refinado ou que faça sentido. De fato tem gente que gosta de coisa ruim, mas o foco de hoje não é exatamente esse. Da mesma forma que achar uma coisa ruim boa é relativamente comum, também é comum achar uma coisa boa ruim, mas e quando você sabe que uma coisa é boa em um, ou vários, aspectos, mas mesmo assim você não gosta?

Como eu já falei por aqui um tempo atrás, hoje tudo anda bem polarizado. A famosa escala “de 0 a 10” ou “ de 0 a 5 robôs gigantes estrelas” acabou virando uma escala de “0 ou 10”. Mesmo sem querer a gente acaba absorvendo um pouco esse pensamento polarizado e quando a gente se depara no meio termo fica meio sem saber o que fazer ou sentir. Você olha pro negócio, vê que realmente aquilo tem um certo valor ou relevância, consegue reconhecer os méritos da coisa, mas… Sei lá… Né? Não dá aquele estalo, não rola aquela identificação e você não é cativado.

Coisas desse tipo acontecem comigo com uma certa frequência quando a conversa é música.  Eu consigo reconhecer a importância, o pioneirismo e a qualidade de um monte de gente. Consigo escutar um monte de coisa dos Beatles, Frank Sinatra, Queen, Chico Science e outros gigantes famosões da música sem achar ruim. Em algum momento vai ter alguma coisa que eu vou até gostar, mas eu ainda vou olhar praquilo e sentir que não é pra mim. Parece meio doido, né? Não achar ruim, achar bom em um certo grau e não conseguir gostar parece contraditório ou no mínimo incoerente. Principalmente porque eu sei que gosto de coisas piores, com bem menos qualidade e muito menos relevância, mas que de certo modo conseguiram me cativar. Claro que isso não acontece só com música. Filmes, séries, jogos, livros, comida e tudo mais que pode ser avaliado de alguma forma ou que esteja aberto ao gosto das pessoas segue essa mesma lógica.

Na vida a gente já tem obrigações demais, boa parte delas são obrigações ilusórias impostas pelos outros ou por nós mesmos, a gente não precisa se sentir cobrado a gostar disso ou daquilo. Inclusive a última coisa que deveriam cobrar da gente, ou que nós deveríamos cobrar de nós mesmos, é gostar de alguma coisa. A gente já tem seguro obrigatório, voto obrigatório, alistamento obrigatório, cadastro obrigatório, exame obrigatório, sorriso obrigatório e mais um monte de coisa obrigatória, deixa pelo menos o gosto, seu, meu e dos outros, ser facultativo.

Contos de Segunda #62

Os eventos narrados a seguir tem ligação direta com o que as nossas queridas Damas da Semana passaram em Contos de Segunda #50 – Parte 01 e Contos de Segunda #50 – Parte 02. Pra saber como toda essa história começou é só ler os Contos de Segunda #38 e Contos de Segunda #43.

— A Dama da Lua, Mãe-de-Todas, te deu uma bronca porque você passou tanto tempo sem um cavaleiro que os seus poderes estão quase descontrolando e no lugar de pedir ajuda às outras damas e encontrar uma solução boa, como a Mãe tinha ordenado, você foi até o santuário da Dama do Mar, que não passa de uma assassina louca, pra aprender o canto dela e atrair um cavaleiro? — Questionou a Dama da Biblioteca.

A Dama da Biblioteca, conhecida entre as outras damas como “Bibliotecária”, se manifestava na mesma universidade onde Segunda-feira dava aulas de literatura e história da arte. Como de costume a Dama da Segunda-feira aproveitou o intervalo no meio das tardes de segunda para visitar a amiga. Para variar Bibliotecária estava organizando livros em uma estante.

— Bem doido, né? — Respondeu Segunda-feira.

— Aprendeu o canto? — Questionou Bibliotecária sem tirar os olhos dos livros.

— Bem… Não, mas a Dama do Mar me deu uma dose única do canto dela. Só vai funcionar uma vez.

— Quanto tempo faz que ela te deu isso?

— Uns meses.

— E você ainda não usou?

— Não.

— E você contrariou as ordens da Mãe-de-Todas só por causa desse canto e não usou? Sabe o que acontece com uma Dama que passa tanto tempo quanto você sem um cavaleiro, não é?

— Sei, sei. Descontrole dos poderes e insanidade, mas todo o rolo com a Dama do Mar gastou muitas das minhas energias acumuladas. Ganhei um tempo pra pensar direito no que fazer.

— E já pensou?

— Já. Pensei bem e decidi que eu não quero um cavaleiro.

Bibliotecária encaixou um livro enorme com bem mais força do que o necessário. O barulho produzido foi bem acima do normal para um livro daquele tamanho. Ela virou para olhar nos olhos de Segunda.

— Então você voluntariamente vai abraçar a insanidade. É isso? Já ficou doida? As tuas irmãs sabem dessa maluquice?

— Ainda não… Mas elas vão comprar a ideia que eu tive — Segunda sorriu. Sorriu o tipo de sorriso que fez a Dama da Biblioteca sentir um calafrio. — Mas eu não consigo fazer sozinha, vou precisar de uma ajudinha sua.

— Não sei como te ajudar, Segunda, a menos que você… — Os olhos de Bibliotecária se arregalaram. — Não, não. Você não pode estar pensando nisso. Não, nem pensar, mas de jeito nenhum, Segunda. Você já ficou doida. Sabe quanto tempo faz que nenhuma de nós tenta um negócio assim?

— Não tem outro caminho, Teca, é isso ou camisa de força.

Um barulho interrompeu a conversa. Um ruído anormal para um ambiente silencioso como aquele. Algo parecido com uma turba furiosa ou uma multidão enlouquecida, mas que na verdade era apenas o barulho produzido por quatro moças que tinham acabado de chegar à biblioteca. Elas atendiam pelos nomes de Terça, Quarta, Quinta e Sexta-feira. Todas estavam com a cara de quem quer apagar um incêndio.

— Pare em nome da lei! — Gritou Sexta.

— Não deixa ela te colocar nesse plano dela, Teca! — Adiantou-se Terça.

— Já disse para não me chamarem de “Teca” e já disse para não fazerem barulho no meu santuário.

— Afe, que dama chata — resmungou Quinta.

— Como você quer fazer isso com a gente, Segunda? — Questionou Quarta. — A gente quase morreu pra conseguir esse canto maldito e você quer dar pra trás?

— Mas eu ainda não disse nada pra… Terça-feira, você espionou meu futuro de novo?

— Você faria a mesma coisa se eu estivesse doida — rebateu Terça. — Invadir o santuário de uma Dama renegada pra arrumar uma forma de fisgar um cavaleiro dá pra engolir, mas além de não fisgar o cavaleiro você ainda quer ter um filho? Tá demais Segunda.

— Já foi feito antes, Terça-feira, não é nada do outro mundo.

— Claro que já foi feito, mas na maioria das vezes deu errado — replicou Quarta. — Quantas damas você vê por aí com um menino debaixo do braço?

— Quantas você vê escolhendo cavaleiros a esmo só pra descarregarem suas energias? Quantas você vê que realmente amam seus cavaleiros? — Rebateu Segunda. — Eu só quero alguém que mereça receber uma parcela dos meus poderes, nem que seja merecido por direito de nascença.

— Acho que ela tem razão… Ou pelo menos um argumento bom. — Ponderou Quinta.

— Também achei super válido — concordou Sexta.

— Os riscos são muito grandes — ressaltou Terça.

— A Mãe-de-Todas vai matar a gente — suspirou Quarta.

— Não se fizermos direito… Outras tentaram antes de mim, não é possível que nenhuma delas tenha sido bem sucedida — disse Segunda.

— Várias delas foram — interrompeu Bibliotecária. Todos os olhares se voltaram para ela. — Todas as que tiveram sucesso, com exceção da Dama da Lua, foram auxiliadas pela mesma Dama — ela tirou um livro enorme da prateleira. Um livro que não estava lá um segundo atrás. Os dedos correram ligeiros pelas folhas encardidas do volume antigo e pararam repentinamente em uma das páginas. — Nossos registros são bem claros quanto às capacidades dessa nossa irmã . Ela foi gerada pela dor e pela morte nos campos de batalha, mas aos poucos ela foi encontrando algo diferente dentro da própria natureza. A formação da vida também fazia parte dela. A Dama de Sangue é a única que pode fazer dar certo.

Tá Todo Mundo Liso

Em 2016 um sentimento tomou conta dos brasileiros. Talvez “sentimento” não seja a palavra certa, provavelmente “condição” seria a palavra. Condição, penalidade, status alimentos negativo ou simplesmente mazela. Todas essas palavras definem bem o que aconteceu com a esmagadora maioria da população brasileira porque em 2016 todo mundo ficou liso.

Caso você seja que nem as maravilhosas pessoas de Orlândia (amo vocês, povo de Orlândia #ChupaBatatais) e não more em Pernambuco ou em outro estado do nordeste onde o termo é normalmente empregado, não se preocupe que eu vou esclarecer. Normalmente dizemos que estamos lisos quando falta grana, na pindaíba, falidos, quando as vacas magras ficaram anoréxicas e o maior sonho da vida é o salário do mês que vem. E em 2016 o liseu (estado de liseira) foi uma condição que afligiu muita gente e no final do ano essa realidade vai bater ainda mais forte.

Todo mundo está careca de saber o que normalmente acontece no fim do ano, mas resumindo bem resumido dá pra dizer que no fim do ano as pessoas gastam. Confraternizações, presentes de Natal, amigos secretos e a vinda do décimo terceiro são o combo matador da gastança. Você pode até querer gastar pouco, mas o que provavelmente acontece é você gastar mais do que queria e não gastar mais nada ou gastar pouco várias vezes de modo que no final você gastou mais do que queria. Só que estamos em 2016, ano em que todo mundo ficou liso e quem conseguiu escapar do liseu ainda está sofrendo com os efeitos do liseu ou se livrou dele faz tão pouco tempo que o trauma ainda não passou. Seja apenas psicologicamente ou na prática, a verdade é uma só: tá todo mundo liso.

O que eu mais ouvi em 2016 foram frases do tipo “posso não, tô liso”, “vou nada, tô liso”, “queria, mas tô liso”. Se você não estivesse liso a coisa mais fácil de acontecer era você não fazer nada junto com sua galera pelo fato de alguém, ou todo mundo, estar liso. É bem provável que isso se replique massivamente ao primeiro sinal de amigo secreto, confra da galera ou celebração natalina.

Pra encerrar, querido leitor, digo apenas que o liseu passa… Se não passar pelo menos diminui. Vai ser chato fim de ano sem grana? Já está sendo desde o começo do ano. Por isso não esquente sua cabeça, fica peixe que já já tudo melhora. Por enquanto dá pra ser otimista mesmo estando liso.    

Bem-Vindo Ao Mundo Bizarro

Lembro bem como estavam as coisas ontem quando eu fui dormir. A gasolina ainda estava cara, a novela ainda estava ruim, todo mundo ainda estava falando do Enem e nada parecia muito fora do normal. Aí eu acordo de manhã e vou olhar minhas mensagens no Whatsapp e vejo um amigo falando:

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Foi quando eu pensei “ah, mas isso foi antes de terminar a apuração, deixa eu ver aqui no Google como tá o resultado”. Entro no Google, digito “eleição estados unidos” e o buscador sacode isso aqui na minha face:

Resultado

Minha reação foi essa aqui:

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Passado o choque inicial eu parei pra pensar e chego à conclusão de que o mundo realmente ficou maluco. Não vou comentar a persona polêmica de Doutor Tiririca Donald Trump. Também não vou comentar que ele deve ser a pessoa mais maluca que já sentou em cima do botão da bomba atômica. Vou me ater apenas a alguns fatos

Donald Trump provavelmente é uma das pessoas mais odiadas dos Isteites. Ele é odiado, desde o começo da campanha dele nas primárias, por todo o eleitorado do partido adversário. Ao longo da campanha ele começou a ser odiado por todo mundo que estava concorrendo com ele pela vaga de candidato do partido republicano. Depois que ele ganhou a vaga do partido começou a campanha presidencial de fato e ele começou a ser odiado por boa parte dos outros políticos do partido dele e por uma parcela dos eleitores republicanos. Apesar de tanta gente odiando nosso compadre do topete, ele venceu. Mais alguém além de mim achou que os norte americanos estavam jogando uma espécie de jogo do contrário? Sabe onde mais tudo acontece ao contrário? Lá mesmo, no Mundo Bizarro.

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Caso você não saiba do que estou falando vou fazer um resumo ligeiro. O Super-Homem Bizarro é uma cópia imperfeita do Super-Homem que não só pensa, mas também age segundo uma lógica invertida. Mais ou menos como aconteceu na eleição de ontem pra presidente dos Estados Unidos.

A única coisa que posso dizer a todos vocês é: bem-vindo ao mundo bizarro. A partir de agora é bem provável que as maluquices desse mundo de meu Deus só aumentem e tudo vire uma espécie de versão absurdamente alucinada da nossa realidade. As eleições municipais de 2016 no Brasil foram um sinal claro de que o as coisas estão todas alopradas, mas a vitória de Trump realmente abriu as portas pra o Mundo Bizarro. Agora vamos esperar pra ver se as coisas vão pro saco do jeito que todo mundo espera. Eu sinceramente espero que não e mais do que isso espero que no Mundo Bizarro o Brasil tenha um pouco mais de sorte, porque no normal tá tenso o bagulho.

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