Não é um blog sobre cachorros e bikinis

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Quando a Quarentena Acabar…

Outro dia estava com a cabeça desocupada e acabei lembrando dessa música aqui:

Imediatamente fiz uma versão adaptada para os tempos de hoje do verso de abertura da música. “Quando a quarentena acabar…”, cantarolei eu na minha cabeça que, a partir daquele momento, não estaria tão desocupada assim. Desde então um pensamento recorrente toma conta da minha cabeça. O alívio da falta de ansiedade pelos dias presentes me manteve superficialmente tranquilo até então, mas o encontro constante dos últimos dias tem sido com aquilo que, até então, eu não sabia que perturbava o meu sono. As minhas ansiedades estão depois do fim.

Antes de começar a discorrer com mais detalhes sobre o assunto gostaria de dizer que eu não estou pessimista. Eu acredito que essa crise vai acabar, que covid-19 vai ser só mais uma das inumeras doenças com as quais a gente convive todos os dias, que qualquer dano social e econômico vai ser razoavelmente superado e que apenas o prejuízo humano, como em qualquer outra crise, vai ser irreparável. Sei que o caminho até o fim de tudo pode ser ainda muito longo, ou nem tanto, quem sabe até um pouco maior, mas a espera faz parte da minha vida há tempo suficiente pra me munir da paciência necessária em uma situação dessas… Todas essas palavras não parecem as de alguém preocupado com o que está para acontecer. De fato essas não são, mas as próximas talvez.

Fico pensando no dia em que poderemos dizer que tudo isso acabou. Quando olharemos os destroços do que foi destruído e as ruínas recém nascidas daquilo que acabou de ser abandonado e permanecerá abandonado dali em diante. Penso em todas as mudanças que estão crescendo em seus casulos, esperando o dia de abrir as asas na direção do céu de um mundo que, em vários níveis e proporções, não será o mesmo. Penso no quanto estaremos traumatizados, ou não, depois de tudo isso. Se todas as quedas de braço, as trocas de acusações, as discussões inflamadas, as decisões tomadas e as atitudes adotadas terão valido de alguma coisa.

O futuro aguarda por todos. Vítimas, fatais ou não, filhos e filhas, esposas e maridos, mães e pais, viúvas, viúvos e órfãos da quarentena. Por aqueles que pararam suas vidas e pelos que, feliz ou infelizmente, não tiveram esse privilégio. Por aqueles que contarão essa história toda como um resumo das manchetes dos jornais ou como um relato de guerra. O futuro aguarda por todos que sobreviveram. Ao vírus, ao medo, ao trabalho e à falta dele, à fila do banco, ao calendário, à espera, ao tédio, ao isolamento, à falta de rotina ou ao excesso dela, à solidão, à depressão. À morte batendo na porta ou apenas espiando pela janela. O futuro virá e tenho a inabalável esperança que poucos de nós não estarão aqui para vê-lo, mas, se pensarmos bem, sempre foi assim. As coisas que virão, virão para todos, o quanto delas virá para cada um é uma pergunta que não nos cabe responder.

Espero não ter deixado você, pessoa leitora preocupado ou temeroso. Nunca foi a minha intenção. Os tempos que vivemos já faziam isso bem antes de qualquer novo vírus Made in China. Não gosto muito de falar sério por aqui, mas algumas coisas mais leves só saem da nossa cabeça quando as mais pesadas saem primeiro. Um aperto sem mão, um abraço sem braço e um beijo de longe sem encostar a mão na boca pra todos vocês e até uma próxima com as palavras mais leves que eu puder escrever.

Retrospectiva 2018

2018 já respira por aparelhos e deve ir pra vala na próxima segunda. Justamente por isso eu resolvi bater a poeira do teclado e fingir que eu não tô devendo a retrospectiva de 2017 fazer uma breve recapitulação do ano que tá tão no fim que os próximos dias já tão dentro da margem de erro.

Esse ano foi um ano muito doido. O nível da loucura dos anos anteriores não só está sendo mantido como novos patamares são alcançados todos os dias. 2018 foi o ano das fake news, das internet sem freio, das brigas por causa de política tomando conta de todos os redutos da internet.

Peguei essa lá no Angulo de Vista

Qualquer notícia, publicação, compartilhamento e hashtag gerava todo tipo de comentário maluco e briga sem sentido. Isso nos leva pra um dos fatos mais marcantes de 2018: a prisão do ex-presidente Lula. Tudo isso rolou depois de alguns meses de novela, de um monte de manchete de jornal e do nosso compadre dos nove dedos ter se transformado num novo paradoxo quântico.

E a prisão de Lula gerou o quê? Briga. Coisa que se repetiu em vários momentos de 2018 por motivos variados, a maioria deles estava dentro do tópico de política. Isso me leva a um segundo evento que marcou 2018: a Copa do Mundo da FIFA.

Pela imagem dali de cima já deu pra ver que a nossa seleção terminou o torneio sem nem relar os dedos na taça, que foi pra casa junto com os franceses. Além disso os nossos amigos croatas que, apesar de perderem na final, conseguiram um resultado inédito e comemoraram como se fosse o título de campeão do mundo. Basta ver essa imagem  da presidente da Croácia feliz da vida entregando as medalhas pros jogadores debaixo de um toró pra ter uma ideia da alegria dos croatas.

E depois da Copa teve o quê? Eleição. E o povo tava como? Tava com o sangue nos olhos. Amizades foram desfeitas, relacionamentos acabaram, irmão se virou contra irmão, pai contra filho e nos grupos de família tinha tudo menos mensagem de bom dia. A porteira das fake news foi aberta e finalmente a internet, na verdade o Whatsapp, mostrou o seu poder de espalhar informação. E o Facebook? O Facebook virou uma terra de ninguém tão grande que nem a Mulher Maravilha topa entrar lá (fica aí a referência pra quem pegou).

Mas nem só de briga se fez a eleição desse ano. Junto com todas as coisas anteriormente listadas temos o cara que realmente surpreendeu durante o pleito eleitoral. Não sabe quem é?

Cabo Daciolo é um dos memes do ano, um dos melhores memes do ano. Com toda a sua narrativa sobre revelações divinas, perseguição dos Iluminati e comentários de um nível altíssimo de acidez, nosso compadre Daciolo conseguiu uma quantidade de votos que ninguém esperava que ele teria, superando grandes nomes da política nacional que tinham muito mais tempo de televisão e gastaram infinitamente mais grana.

Falando em votação, não podemos esquecer do cara que venceu o pleito eleitoral. Bolsonaro, o cara mais controverso já eleito desde a redemocratização desta terra verde e amarela. Digo controverso por causa de todo o barulho que ele gerou, contra e a favor dele, sem nem começar a governar nada. Mas não é hoje que a gente vai falar dele por aqui, na verdade nem sei se um dia a gente vai. Já falaram tanto dele em 2018 que eu não só não tenho muito o que dizer como também tô meio farto desse assunto.

Em 2018 também rolou o incêndio do Museu Nacional que, não só escancarou o descaso com que os nossos museus, e por que não dizer nossa História, são tratados, mas também gerou aquele prejuízo sem tamanho pro patrimônio histórico da humanidade. Também não podemos esquecer daquele que deve ser o último casamento real pelas próximas décadas. O principe Harry seguiu o exemplo do pai e do irmão e casou com uma plebeia. Obviamente a plebeia da vez, a atriz Meghan Markle, não é nenhuma pobre lascada e tem tudo pra virar uma versão mais bronzeada de Lady Di.

Como em todos os anos, muitos nomes de peso deixaram o mundo nos últimos doze meses. Na TV tivemos a partida de dois ícones do entretenimento infantil: Simon Shelton Barnes, o Tinky Winky dos Teletubbies, e Stefán Karl Stefánsson, o  vilão Robbie Rotten de Lazy Town. Além deles tivemos o falecimento de Gil Gomes, Graça Araújo, um dos principais nomes do jornalismo pernambucano, e de um dos caras mais criativos que já trabalhou na produção de um desenho animado, Stephen Hillenburg, o criador de Bob Esponja. Por aqui também nos despedimos do cara que provavelmente mais fez o papel de Jesus no mundo, José Pimentel. No mundo da música perdemos Aretha Franklin, Carlos Eduardo Miranda, um dos maiores produtores musicais e um dos jurados mais icônicos da televisão brasileira, Joe Jackson, pai de Michael Jackson e uma das figuras mais controversas da história da música americana, e por último, mas não menos importante, temos Mr. Catra.

A galera que gosta de quadrinhos lamentou a partida da dupla que criou o amigão da vizinhança. Steve Ditko e Stan Lee, apesar de há muito separados, partiram no mesmo ano para a eternidade. Os dois juntos criaram um dos super-heróis mais queridos do público, o Homem-Aranha e Stan Lee junto com vários outros artistas criou o resto do universo Marvel e de quebra deu aquela revolucionada no mercado de quadrinhos americano. De uns tempos pra cá ele só vinha revolucionando o mundo das participações especiais em filmes com personagens Marvel

Em 2018 também demos adeus a Stephen Hawking, um dos poucos físicos famosos que também era famoso fora do meio da física. Billy Graham, um dos maiores nomes do protestantismo norte americano e ex-conselheiro de um monte de presidente dos Estados Unidos. Fechando a lista temos a vereadora Marielle Franco.

Esse ano que passou foi um ano meio esquisito. Não consigo dizer que de fato foi um ano ruim, já que dentre as desgraças que saltam aos nossos olhos sempre estão as pequenas alegrias, os momentos preciosos e as conquistas que só tem valor pra quem foi lá e fez. Os sorrisos entre lágrimas, o mal previsível e o bem inesperado ou só a satisfação de ver o tempo passar por nós sem nada nos fazer.

Não dá pra saber o que 2019 vai ser, mas dá pra começar a imaginar… E pra compor a trilha sonora desse momento de reflexão eu deixo vocês com o hit supremo do ano de 2018.

Feliz ano novo e até 2019.

 

2017, 75 Anos e 285 Textos

Dezembro. Ano terminando, a internet já tá cheia de gente falando de uva passa e a voz de Simone já pode ser ouvida nos mais diversos estabelecimentos do Brasil. Juntamente com o final de ano temos algumas pautas prontas alguns posts tradicionais deste querido blog. Provavelmente o mais legal deles seja o post que comemora os 75 anos de coisas diversas. Normalmente ele sai em um post com a numeração terminada em 5, mas como o 283 foi uma homenagem motivada por uma fatalidade, eu vou dar uma roubada e dizer que esse aqui é o post 285 que vale.

Começando, como sempre, com a ala musical da coisa temos os 75 anos de algumas moças já falecidas, Nara Leão, a musa da Bossa Nova, Celly Campello, a moça que tomava banho de lua e pedia pro Cupido deixar ela em paz, Clara Nunes, a primeira cantora a ter um disco com mais de 100 mil cópias vendidas. Passando pra ala masculina dos defuntos temos Ronnie James Dio, o cara que cantava Holy Diver, e o cara que minha mãe parafraseia pra me lembrar de acender os faróis na estrada, Tim Maia. Ainda nessa ala falecida temos duas vítimas da maldição dos 27 anos, Brian Jones, membro fundador dos Rolling Stones, e um dos guitarristas mais importantes de todos os tempos, Jimi Hendrix. Passando rapidamente pra parte da galera viva pra fechar logo esse tópico temos Paulinho da Viola, Milton Nascimento, Caetano, o Veloso, e seu brother Gilberto Gil. Juntamente com eles temos o possívelmente falecido Beatle Paul McCartney e Jorge Ben Jor.

Na parte de cinema abrimos os trabalhos com os 75 anos de Bambi. Sim, você não leu errado, faz 75 que a mãe do Bambi morreu. Também temos Casablanca, um clássico do cinema que provavelmente é a única coisa além de Bambi que eu reconheço da lista da Wikipédia. Na lista de personalidades do cinema que estão completando 75 anos temos Martin Scorsese e Harrison Ford, conhecido principalmente como Han Solo ou Indiana Jones.

Na última das categorias tradicionais temos os personagens de histórias em quadrinhos. Esse ano não tem muita gente, mas tem umas coisas interessantes. O primeiro da lista é mais um vilão do Batema, o Duas-Caras, que ficou bem famoso por causa do filme lá que tinha o Coringa Heath Ledger. Juntamente com ele temos Zé Carioca nos quadrinhos da Disney e a primeira edição do título solo da Mulher Maravilha, que trouxe uma série de personagens que apareceram no filme dela e que estão completando 75 anos em 2017, tais como Doutora Veneno e Etta Candy.

Mais um post de 75 anos se foi. Ele é só mais um lembrete de como 2017 tá perto do fim. Enquanto contamos regressivamente e riscamos compulsivamente os dias do calendário, lembramos desse ano e de tudo que esperamos dele. Confesso que esperava bem menos do que recebi e bem mais do que eu ofereci, mas isso é coisa pra outro dia.

Playlist de Bikini #2

Amanhã é dia 7 de setembro, também conhecido como o Dia da Independência do nosso querido Brazéu e por isso vamos celebrar esta data tão festiva com uma playlist temática feita com todo o amor e carinho.

A escolha do tema de hoje pode parecer até um pouco óbvia, mas não poderia ser outro. Para celebrar a nossa independência fiz uma playlist só com artistas independentes brasihueiros. Eu não tenho certeza se todo mundo que eu joguei na lista é, de fato, artista independente, não sei se todo mundo tem gravadora ou se ter gravadora exclui o artista/banda. Também é possível que alguém da lista não seja independente atualmente ou que só tenha a cara de independente. Infelizmente não tenho como fazer e nem quero fazer uma auditoria pra saber se todo mundo da lista é de fato independente.

Devo lembrar que as escolhas feitas são puramente pessoais e de forma alguma tenta eleger as melhores coisas independentes. Justamente por isso a lista ficou bem grande, pra você poder pular as músicas que menos te agradarem sem se preocupar em deixar a lista muito pequena. Garanto que pelo menos umas dez ou doze músicas devem passar no crivo da maioria das pessoas.

Essa lista maravilhosa também está lá no Deezer.

Se você não se utiliza, ou não quer utilizar, dos serviços da galera do Spotify ou do Deezer, tem uma versão da playlist no YouTube com uma ou duas faixas faltando por causa das limitações de disponibilidade.

Bom feriado para todos.

Playlist de Bikini #1

Na última quarta-feira eu publiquei um texto por aqui e coloquei uma playlist pra dar uma complementada no bagulho. Isso acabou me dando a ideia pra uma nova linha de publicação para o Cachorros de Bikini. Este é o primeiro post da série, ainda sem periodicidade definida, Playlist de Bikini, onde eu vou publicar playlists temáticas porque de vez em quando dá preguiça de escrever e fazer playlist é mais fácil  com temas diversos e provavelmente bem limitados porque eu não sou uma pessoa entendida das coisas.

A playlist de hoje tem um tema, digamos, doméstico. Fiz uma lista só com músicas que inspiraram personagens, histórias ou apareceram de alguma forma na nossa série semanal de contos.

A lista está disponível lá no Spotify

E no Deezer

Se você não se utiliza de Spotify ou de Deezer, pode ouvir a playlist lá no Youtube.

 

Ficando Velho Cada Vez Mais Novo

Essa semana estava eu procurando coisas pra ouvir. Dei uma passeada na lista de artistas que eu sigo no Spotify e resolvi jogar na fila de reprodução os discos que saíram esse ano. Puxei rapidamente da memória alguns fulanos que tinham disco recente e fui lá catar as músicas pra jogar na fila. Fui lá no primeiro artista todo animado e descobri que o disco do cara era do ano passado. Passei para o próximo, para o seguinte e o que veio depois dele, quase todos tinham discos que datavam de 2016. Obviamente minha reação inicial foi:

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Parei pra pensar um pouco sobre a questão e acabei achando a explicação na obra de uma pessoa que parece entender muito de como funciona o mundo: Neil Gaiman. Lá em Sandman ele define que os Perpétuos, seres imortais próximos do que entendemos como divindade, têm uma percepção diferente do tempo conforme a idade deles avança. Um Perpétuo recém nascido provavelmente percebe o tempo como nós percebemos, com as horas, dias e anos com a duração padrão, um Perpétuo com milhares de anos provavelmente sente o tempo passando bem mais rápido. Imediatamente eu pensei em algo que já vem martelando na minha cabeça faz algum tempo. Eu olhei pra mim mesmo e pensei “eu tô velho mesmo”.

Uma certa vez uma amiga minha me mandou uma playlist com o sugestivo título de “ficando velho cada vez mais novo”. Você pode ouvir ela logo aqui embaixo.

Não preciso dizer que nenhuma das músicas dessa lista é nova, a mais recente tem quase dez anos. Dez anos que englobam praticamente todos os eventos e coisas que eu tenho na minha cabeça como coisas recentes. Qualquer coisa que ocorreu a menos de quatro anos aconteceu “um tempo desses” e é muito fácil confundir os acontecimentos de um ano com os do anterior. Também não é difícil levar um susto ao descobrir que coisas que aconteceram ontem já têm mais de cinco anos e que boa parte das crianças que eu conheci já estão na faculdade ou que os bebês já sabem ler. Aí chego à questão crucial desta dissertação. Como a gente tá ficando velho tão rápido?

A definição de velho é bastante abrangente. Em valores absolutos a velhice só chega quando a gente já passou um tanto bom da metade dos nossos anos estimados de vida. Em valores relativos depende muito de quem observa. Uma pessoa idosa pode não me achar velho enquanto um adolescente pode pensar exatamente o contrário. Mas e a gente? Como é que a gente chega à conclusão de que tá velho?

Pessoalmente considero que você se sente velho quando de alguma forma a idade pesa. Seja na dor das costas depois de sentar numa posição errada ou nas marcas dos anos que a gente vê no espelho. Qualquer período de tempo inferior a dois anos parece pouco e você lembra de um monte de coisa que existiam até um dia desses, mas que uma geração inteira não vai fazer ideia do que é. 

Ficar impressionado com as facilidades mais bestas da tecnologias e usar com uma frequência razoável expressões como “no meu tempo” e “antigamente”.

Assim como a percepção do tempo é relativa, podemos dizer que a percepção da própria idade é tão relativa quanto. Enquanto eu já vivi, em termos numéricos absolutos, duas vezes mais do que algumas pessoas que eu conheço, não vivi nem um terço do que viveu meu avô e nem metade do que viveu meu pai, chegarei a essa marca no ano que vem. Mesmo me achando velho quando eu olho no calendário, por dentro eu ainda não me sinto com essas idades todas. A falta de maturidade e uma aversão ao comportamento adulto padrão estão ajudando nesse sentido. Fico pensando quando eu não só me sentirei, mas de fato estarei velho. Fico pensando como é ter a idade dos meus avós e se o tempo vai parecer mais ligeiro do que me parece hoje… Ia concluir, mas esqueci como era pra terminar, deve ser a idade

Contos de Segunda #85

Aluísio tinha uma relação muito particular com a segunda-feira. Praticamente todas as coisas importantes da vida dele aconteciam no primeiro dia útil da semana. O último exemplo dessa máxima foi o nascimento das suas duas filhas gêmeas, Olívia e Alice, em meados de agosto do ano passado. As duas não só nasceram antes do tempo como também conseguiram a proeza de enganar todos os exames de imagem feitos ao longo da gestação. Ninguém estava esperando duas meninas.

Em uma certa segunda-feira, Aluísio estava em casa com suas filhas. Ele estava de férias e passava a maior parte do tempo com as meninas. Para aqueles trinta dias Aluísio tinha um plano: ensinar as duas a falar “papai”. Na prática ele não precisava ensinar, já que, segundo relatos de sua esposa, as duas já tinham falado “papai” em algum momento ao ver alguma foto dele. Aparentemente uma imagem estática fazia muito mais efeito, então ele bolou um plano.

Assim como muitos pais, Aluísio apelava em vários momentos para coisas do calibre da Galinha Pintadinha. Obviamente ele detestava a ideia de usar um truque tão rasteiro em suas próprias crianças, mas muitas vezes as medidas desesperadas precisavam ser tomadas. Mais uma vez a Galinha seria usada, mas para um propósito ligeiramente mais nobre.

Depois de algumas milhares de vezes, Aluísio tinha certeza que aqueles malditos vídeos da galinha estavam gravados no cérebro das duas meninas. Exatamente por isso ele gastou algumas horas com programas de edição para adulterar todos os vídeos, inserindo algumas fotos suas em locais diversos. Ao ver o pai dentro dos vídeos, Alice e Olivia ficariam tão surpresas que diriam um “papai” bem sonoro. Pelo menos era assim que acontecia na cabeça de Aluísio toda vez que o plano era repassado.

Ele colocou o primeiro vídeo. O ponto em que ele aparecia estava quase chegando quando o celular tocou. Era Amélia, sua esposa, querendo saber se estava tudo bem. A ligação demorou tempo suficiente para a primeira aparição de Aluísio no clipe da Galinha passasse. Se as meninas falaram, ele não ouviu, mas de certa forma o plano tinha dado certo. As duas estavam olhando para ele e apontando para a tela da televisão. O fracasso momentâneo foi eclipsado pelo aparente progresso. Ele ainda tinha mais ou menos vinte chances antes de precisar repetir os vídeos. Infelizmente nenhuma delas teve muito efeito. Depois do celular foi o interfone, a fralda cheia de cocô, o banho, a hora do lanche, do almoço e da soneca, dele e das meninas. Também teve a ida à padaria e ao parque. Já era quase noite quando Aluísio conseguiu outra chance, foi quando o sono bateu e ele apagou no sofá, exatos três minutos antes da esposa chegar a tempo de ver a foto do marido aparecer do lado do galináceo azul e ouvir as duas filhas apontando para a tela dizendo em uníssono:

“Papai”

São As Águas de Março Fechando O Verão

O carnaval acabou, Março já tá na metade e a gente já viveu quase 25% de 2017 e, assim como em outros anos, tem chovido para caramba. Afinal são as águas de março fechando o verão.

Sem título

Mesmo a chuva de março rolando praticamente todo ano, eu nunca tinha parado pra fazer a associação dessas famosas águas pluviais do mês três com o final de alguma coisa. Não sou um admirador do trabalho de Elis, a Regina, e de Tom Jobã, mas acabei pensando neles e nas citações que fizeram à famosa composição do nosso amigo Tommy. Prestando atenção na chuva e no calendário acabei vendo que março é um moço peculiar dentro do calendário. E não é só por causa das águas que fecham o verão.

Começa que Março é o primeiro mês pra valer do ano. Janeiro tem muita gente de férias, fevereiro tem carnaval e, mesmo quando não tem folia, continua lá com seus 28 dias. Abril vem logo depois, abre a temporada de feriados nacionais e normalmente traz consigo a primeira data comercial do calendário, a Páscoa. Peço perdão para aqueles que, assim como eu, comemoram a Páscoa pelo seu significado para os cristãos, mas as lojas só querem mesmo saber de vender chocolate. Aí você me pergunta: “E março, Filipe? Tá ali em cima dizendo que o texto é de março, cadê março? Quero meu dinheiro de volta”. Aí eu digo: tô chegando lá.

Março é tipo julho e agosto. Feriado, se tiver, é só estadual ou municipal. Os três são considerados meses longos e normalmente não figuram entre os primeiros lugares no ranking geral de meses preferidos do ano. Só que, ao contrário dos seus outros amigos, março tem uma coisa que o torna praticamente um mês coringa: em março pode ter carnaval, pode ter Páscoa e pode não ter nada. Ainda assim ele permanece com aquele mesmo jeito de março. Tá ligado/ligada jeito de março? Então, é esse mesmo.

Em março pode ter carnaval, mas nem por isso fevereiro deixa de ter a cara de “mês do carnaval”. Quando o carnaval cai em março, automaticamente nossa cabeça é transportada por cinco ou seis dias de volta pra fevereiro. Tanto que, quando o carnaval cai em fevereiro, a gente quase não ouve “esse ano o carnaval cai em fevereiro”, mas quando a festa da carne cai em março o aviso começa no ano anterior quando o carnaval termina. É que nem quando sua mãe fica te lembrando de um negócio o tempo todo pra não ter risco de você esquecer e fazer no dia errado. A mesma coisa rola com a páscoa, mas como a quantidade de festa e dias de folga é menor, não precisa desses alertas todos.

É março e tem chovido. Esse ano as águas de março vieram logo depois do carnaval, logo no começo do mês, pra deixar bem claro que aquela moleza do começo do ano acabou. É de março que a expectativa pelo milho do São João começa, principalmente praquela galera mais velha que cresceu, assim como eu, ouvindo que se chover no dia de São José o ano vai ser bom de milho. Enquanto o dia de São José não chega, as águas de março vão fechando o verão.  

Contos de Segunda #78

    Vocal, Guitarra, Baixo e Bateria, os quatro elementos fundamentais do 4Ladies. Garotas que ainda nem saíram da escola e já demonstram um nível de comprometimento e dedicação raro na maioria das pessoas com a mesma idade. Para elas a banda é mais do que uma diversão, é um projeto de vida feito em conjunto. Infelizmente nem sempre as coisas são tão fáceis para essas quatro meninas.

Era segunda-feira e Guitarra tinha acabado de chegar da aula. Mais uma vez ela tinha recebido o boletim e mais uma vez ela esconderia bem longe das vistas da mãe. A menina entrou no quarto e procurou pelo case vazio da guitarra que ficava jogado ao lado do guarda-roupa. Abriu o zíper e soltou um pedaço do forro, revelando o paradeiro dos boletins dos dois últimos bimestres, onde o terceiro boletim estava prestes a ser guardado.

— AGNES! — Gritou uma mulher surgida não se sabe de onde.

— AAAAHHHH! — Assustou-se a pobre guitarrista desavisada. — Mãe? É… Oi… Porque a senhora tava dentro do guarda-roupa?

A mãe de Guitarra ainda estava parcialmente coberta com as roupas da filha quando saiu de dentro do guarda-roupa.

— Eu sabia que você tinha dado sumiço nos boletins, pensou que ia sair dessa ilesa? Cadê? Eu quero ver esses boletins.

    — Mãe, vai por mim, a senhora não quer ver esses boletins — respondeu Guitarra tentando manter a calma. — Vamos manter a situação das minhas notas longe dessa casa, não gosto de trazer os problemas de fora pra cá.

    — Agnes, você tem três segundos pra me dar esses malditos boletins.

    Ela só precisou de um segundo.

    — Que notas são essas, Agnes? Que tanto vermelho é esse? Um bicho morreu por cima desses boletins?

    — Ah, mãe… É que a escola tá muito complicada e…

    — E mais nada! A senhorita vai dar um jeito de recuperar essas notas… E nada de guitarra enquanto não tiver melhora.

    — Não, não, nãonãonãonão — repetiu Guitarra sem querer acreditar. — Por favor, mãe. Eu estudo, eu tiro nota boa, prometo, mas não me deixa sem guitarra… A gente finalmente arrumou um lugar pra tocar, a gente não pode deixar essa passar.

    — Quando vocês tocam?

    — Daqui a duas semanas mais ou menos.

    — Pode tocar com suas amigas, mas SÓ se começar a estudar, e depois desse show a senhorita só encosta nessa maldita guitarra depois que as notas saírem.

    — Mas…

    — Sem “mas” — interrompeu a mãe. — Se reclamar eu jogo essa guitarra no rio.

    A conversa acabou ali, mas imediatamente Guitarra convocou uma reunião da banda. Normalmente elas trocavam mensagens, mas esse assunto era muito sério, era melhor fazer uma videoconferência. Vocal, Baixo e Bateria ligaram seus computadores imediatamente. A conversa só começou de verdade quando Guitarra terminou de contar a história toda.

    — Tu é MUITO BURRA, Guitarra — explodiu Bateria. — Como é que tu me tira esse tanto de nota vermelha?

— Te dana, Bateria. Até parece que só eu aqui tiro nota vermelha.

— Eu já estou quase passada de ano — disse Vocal meio sem jeito.

— Eu só tô abaixo da média em duas — ostentou Bateria.

— Chega dessa conversa de “o meu é maior que o seu” e vamos focar no problema — cortou Baixo.

— Baixo tá certa, a gente precisa dar um jeito nessa situação — continuou Vocal.

— Na verdade a gente não precisa fazer nada — ressaltou Bateria. — É só essa bandida estudar em vez de ficar tocando guitarra o tempo todo.

— Eu estudo guitarra, imbecil — rosnou Guitarra. — Coisa que você devia fazer de vez em quando.

— Se eu fosse ruim que nem você eu ia precisar estudar um bocado também — provocou Bateria.

— Da próxima vez que a gente se encontrar eu vou quebrar minha guitarra na sua cabeça.

— Meninas! — Interrompeu Vocal. — Foco no problema.

— Foi mal — se desculpou Bateria. — Quem pode ajudar Guitarra a estudar? Eu estou um ano na frente dela, mas ano passado eu fui bem mal na escola.

— Vocal tá um ano atrás, nem vai poder me ajudar… Acho que sobrou pra você, Baixo.

Baixo estudava na mesma escola que as outras meninas e era a única da banda no mesmo ano que Guitarra, elas até chegaram a estudar na mesma sala algumas vezes.

— Sei não… — resmungou Baixo. — A gente já tentou estudar e não deu muito certo.

— Baixo já tentou me ensinar matemática uma vez e… — começou Vocal. — Bem… A gente não quis tentar de novo.

— Faz pela banda, miga — suplicou Bateria.

    — Por mim, Laila — apelou Guitarra.

    — Tá bom, eu ajudo. Mas só dessa vez e só até as próximas provas… A gente ainda nem começou e eu já tô arrependida.

 

Wesley Safadão Cover

    Hoje acordei com uma expectativa boa pro texto dessa sexta-feira. Já tinha resolvido falar sobre o maravilhoso Logan, último filme de Hugh Jackman como Wolverino, e seria muito massa e talz. Só que eu fui atravessar a rua e dei de cara com isso aqui:

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    Sim. Isso mesmo. Eu vivi pra ver o anúncio do show de um cover de Wesley Safadão. Obviamente eu fiquei bem chocado com essa parada e, obviamente, isso despertou uma reflexão muito profunda e minha cabeça começou a fervilhar. Infelizmente o texto do Wolverino vai ficar pra semana que vem. Desculpa, Hugh Jackman.

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    O cover é uma prática muito comum no nosso planeta. Toda hora tem gente fazendo versão da música de outra pessoa. Normalmente as bandas começam fazendo isso enquanto não tem repertório próprio ou público cativo. Algumas bandas viram especialistas em fazer covers de determinados artistas e ganham a vida tocando músicas desse artista ou banda. Normalmente isso rola com artistas que já morreram, bandas que já acabaram, que são de outro país e raramente, ou nunca, passam por aqui e quando passam tem os shows meio caros. Aí chegamos no assunto de hoje e à pergunta fundamental: por que diabos existe um cover de Wesley Safadão?

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    Bora lá fazer uma lista dos motivos pelos quais isso é uma coisa meio absurda. Primeiro que nosso compadre Safadão não morreu, não é estrangeiro e faz show por aqui direto. Tô totalmente por fora do valor do ingresso pro show dele, mas acredito que não é um valor tão inacreditável ao ponto das pessoas precisarem ir pro show do cover. E por último temos o principal motivo pra um cover de safadão não fazer sentido: hoje em dia todo mundo toca música de todo mundo.

    Wesley Safadão toca música de um monte de gente e um monte de gente toca música dele. Além disso ele faz parceria com mais um monte de gente e acaba tocando as músicas em que ele fez participação e dos artistas que fizeram parceria com ele. Outros artistas do mesmo segmento têm uma prática similar, principalmente quando começou a rolar um intercâmbio entre a galera do forró e a galera do sertanejo universitário. Se repertório de todo mundo tá meio misturado e se você escuta música de todo mundo no show de todo mundo, não faz sentido existir um cover pra tocar as músicas de um cara que já tem as músicas tocadas por um monte de gente.

    Já disse e digo de novo: eu vivi pra ver esse dia chegar. O dia em que eu colocaria meus olhos num anúncio de um show do cover de Wesley Safadão. Não um cara que toca as músicas dele, não um cara que faz homenagens. Uma pessoa que é especializada em músicas de Wesley Safadão. O ser humano tá de parabéns mesmo.

 

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