Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Tag: Raiva

Contos de Segunda #90

Fernanda estava tentando controlar a raiva. A terapia estava começando a dar bons resultados e os acessos de fúria eram cada vez mais raros. Atualmente pouquíssimas pessoas tinham medo dela e menos ainda tinham motivos concretos para tanto. Uma dessas poucas pessoas era Cristina.

Fernanda e Cristina se conheciam desde sempre e, apesar de serem grandes amigas, as duas conheciam muito bem qual era o tamanho do pavio de cada uma, por isso elas sabiam quem chamar quando entravam numa briga. Não por acaso o contato de Fernanda no no celular de Cristina tinha o sugestivo nome de “Tropa de Choque”.

Cristina estava comprando o presente de aniversário da mãe quando recebeu uma mensagem:

“Tá afim de jantar hoje?”.

A mensagem era de Augusto, um cara com quem Cristina tinha saído umas três vezes. Ele não fazia muito o tipo de Cristina, mas tinha acabado de voltar da Europa e a moça estava começando a pensar no roteiro das próximas férias. Pelo menos os dois teriam bastante assunto. O encontro estava indo muito bem até que Augusto começou com um papo muito estranho sobre futuro, compromisso, relacionamentos e outras coisas que Cristina sabia muito bem onde iam dar. Era melhor dar um jeito de terminar logo aquele encontro.

— Desejam escolher uma sobremesa? — Disse o garçom ao recolher os pratos.

— Já passei do meu horário — respondeu a moça. — Só a conta por favor.

— Cristina, eu estive pensando muito nesses últimos dias… Pensando muito na gente — começou Augusto.

“Ah, não”, pensou ela.

O rapaz colocou a mão sobre a dela e olhou direto nos olhos da moça.

“Pelo amor de Deus… Não”.

— Faz tempo que eu quero assumir um compromisso, só faltava a pessoa certa.

Ela tirou a mão debaixo da mão dele.

— Não vai rolar, Augusto — cortou ela. — É melhor a gente só pagar a conta, eu pego o presente da minha mãe, entro num táxi e cada um segue o seu caminho.

***

O telefone de Fernanda tocou. Para a surpresa da moça, era uma ligação de Cristina.

— Oi, sumida — atendendeu Fernanda.

— Amiga, eu tô com um problema e preciso de uma ajudinha.

— Diz aí.

— Um cara me chamou pra jantar e quando a gente tava esperando a conta ele me pediu pra namorar com ele.

— E o que tem isso?

— Vamos dizer que eu… Dei um fora no sujeito e ele não aceitou muito bem.

— Ele fez alguma coisa contigo? — O tom de Fernanda estava mais sério.

— Não, mas lembra que tá chegando o aniversário da minha mãe?

— Sei.

— Eu comprei o presente antes de vir jantar e deixei no carro do sujeito. Agora ele não quer me deixar pegar.

— Onde vocês estão?

— Naquele restaurante que teu pai trazia a gente pra almoçar.

— Chego aí em um minuto, não deixa ele sair até eu dizer.

— Pode deixar — disse Cristina antes de largar o celular.

Ela estava tentando aplicar a variante mais desajeitada e ineficaz do mata-leão no ex-futuro namorado. Teria funcionado se Augusto não fosse uns trinta centímetros mais alto e Cristina soubesse o que estava fazendo.

— Me solta, sua louca — disse ele.

— Só depois de devolver o presente

— Eu não vou devolver nada.

Menos de um minuto depois o telefone de Cristina tocou.

— Oi — disse a moça.

— Deixa ele sair — respondeu Fernanda do outro lado da linha.

Imediatamente Cristina libertou Augusto da semi-imobilização. O rapaz entrou apressado no carro e saiu, mas não antes de colocar a cabeça para fora da janela e gritar.

— SUA DOIDA!

O carro de Augusto mal tinha colocado as rodas na avenida quando foi atingido por outro veículo no lado do passageiro. Ainda desnorteado pelo susto, Augusto olhou para o motorista do outro veículo. Atrás do volante estava uma moça, ela usava um colar cervical, um protetor bucal, igual ao que lutadores usam, e um capacete. Ela tirou o capacete, o protetor bucal, o colar cervical, abriu a porta e desceu do veículo carregando uma marreta. Deu a volta no carro e bateu de leve no vidro do lado do motorista com dois dedos. Augusto abriu.

— E aí, meu velho, tudo certo? — Fernanda estava sorrindo, um sorriso demoníaco demais para transmitir simpatia.

— Mais ou menos — respondeu Augusto ainda tentando processar o ocorrido.

— O negócio é o seguinte — começou ela. — O presente da mãe da minha amiga tá aí no teu banco traseiro e ela tá querendo de volta.

— Ela que compre outro presente.

Fernanda girou a marreta e estourou o vidro da porta de trás.

— Eu podia só pegar o presente, mas eu prefiro que você me entregue. Sabe como é, eu prefiro quando as pessoas colaboram comigo.

Alguns instantes depois Fernanda estava entrando no estacionamento com um sorriso no rosto e a sacola do presente na mão. Ao longe dava para ouvir o som dos pneus de Augusto cantando.

Contos de Segunda #86

Moacir estava de mau humor, não que isso fosse novidade. Ele deixava o mau humor de todas as segundas ao lado da carteira ou no bolso da calça para não correr o risco de esquecer. A diferença naquela segunda em especial era justamente o fato do mau humor ter um motivo, coisa bem rara atualmente. Moacir estava com um humor péssimo por estar com a sensação de que não tinha mais tempo para nada.

Na semana passada Moacir comprou um livro novo e um jogo de computador que estava em promoção, descobriu que tinha saído a temporada nova da série que ele acompanha e que rolou a estreia de mais duas séries novas que ele estava doido para ver, apareceram os amigos com a história de fazer encontros periódicos de jogatina offline e, além disso tudo, ainda estava chovendo todo dia.

Em todos os dias da semana anterior Moacir saiu de casa quebrando a cabeça para tentar achar uma forma de como otimizar o tempo. Tentou almoçar perto para ter mais tempo no horário do almoço, mas tudo que ele conseguiu foi encontrar com os colegas de trabalho que almoçavam perto e formavam uma fila que mais parecia a fila do show de um popstar adolescente. Experimentou pedir uma marmita da tia do almoço, só para descobrir que a tia do almoço tinha uma média de atraso de quarenta minutos em dias de chuva. Tentou levar a marmita de casa e acabou descobrindo que os outros marmiteiros do trabalho tinham um senso de comunidade tão forte que eles paravam para puxar papo mesmo nos dias em que ele não levava marmita, principalmente na hora do almoço.

Já que a hora do almoço se tornou inviável, ele decidiu diminuir a hora do almoço para tentar sair mais cedo. Teria dado certo se ele não tivesse feito isso justamente nos dias em que precisou fazer hora extra. Tentou acordar mais cedo, mas tudo que conseguiu foi descobrir como odiava o som do despertador antes do sol nascer. Ele teria conseguido dormir mais tarde se tivesse tentado isso antes de tentar acordar cedo, mas o sono dele estava tão doido que ele passou o resto da semana só pensando em dormir. O fim de semana chegou e tudo teria dado certo se a internet não estivesse com problemas, impedindo Moacir de baixar o jogo novo e de assistir às séries que queria.

E eis que chegou a segunda-feira. O coração de Moacir estava borbulhando com o ódio mais puro e profundo que uma pessoa poderia sentir. Ele sentou diante do computador com a plena certeza de que poderia matar alguém. Ligou a máquina e esperou aparecer a tela do login. No lugar dela apareceu uma tela de erro. Moacir juntou as mãos no rosto e se perguntou o porquê de tamanho sofrimento. Antes de obter uma resposta satisfatória o telefone tocou.

— Moacir, verifica aí teu e-mail que parece que o relatório da semana passada acabou voltando — disse o chefe. — A gente vai precisar rever.

Silêncio.

— Moacir?

Silêncio.

— Alô?

Um som alto de algo quebrando veio como resposta.

— É… Chefe?

— O que foi isso, Moacir?

— Não vou poder trabalhar no relatório.

— Por que, Moacir?

— Meu monitor acaba de quebrar.

— Teu monitor quebrou?

— É. Eu coloquei a senha errada e a tela explodiu.

— Aconteceu alguma coisa contigo?

— Só a minha mão que tá meio machucada, mas nada que um pouco de gelo não resolva.

Contos de Segunda #71

Fernanda estava tentando controlar a raiva. Depois de ter acertado uma voadora nas costas de um colega de trabalho com todo mundo do escritório vendo, Fernanda decidiu que a raiva estava atrapalhando um pouco a sua vida.

Como Fernanda não conhecia ninguém que pudesse indicar um psicólogo, resolveu procurar por conta própria. Foi na lista fornecida pelo plano de saúde, achou um que ficava perto de casa e ligou para o consultório… Ninguém atendeu. Ela tentou mais uma, duas, três vezes antes de alguém atender.

— Centro de psicologia clínica, boa tarde — disse uma voz feminina em um tom monótono.

— Boa tarde. Eu quer… – Começou Fernanda.

— Aguarde um instante por gentileza — respondeu a moça do outro lado da linha logo antes de colocar uma música para tocar.

Fernanda tirou o telefone do ouvido e encarou o aparelho com um olhar incrédulo. “Já começou mal”, pensou ela. Lembrou que todos os psicólogos da lista do plano de saúde ficavam estupidamente longe da casa dela e arrumou um pouco mais de paciência para gastar enquanto tocava a musiquinha da ligação em espera. Paciência essa que estava bem perto do fim quando a voz do outro lado da linha retornou.

— Alô, senhor?

— Eu não…

— Como posso ajudar, senhor?

— Eu quero marcar um horário, mas eu não sou…

— É particular ou plano, senhor?

— Estou tentando dizer que eu não…

— Senhor, sem essas informações eu não posso marcar a consulta.

Fernanda respirou fundo, deu um murro na mesa, se concentrou para não subir o tom de voz e finalmente disse:

— Não sou homem, moça… E vai ser pelo plano.

— Ah, ok então.

Depois de passar todas as informações do plano de saúde, Fernanda estava pronta para considerar o assunto resolvido e muito satisfeita por não ter perdido a calma… Mas ela devia saber que só acaba quando termina.

— Estamos sem horário, senhor… Quer dizer, senhora.

— Sem horário?

— Exato. Estamos enfrentando alguns problemas com o seu plano e reduzimos os horários de atendimento para quem tem esse convênio. Atualmente todos os horários estão ocupados. A senhora vai querer fazer particular?

— E quanto seria?

— Atualmente o valor fica em torno de quinhentos reais.

— QUINHENTOS REAIS?

— Não precisa gritar, senhora.

— Não preciso? É, não preciso, mas motivo não falta.

O telefone foi desligado antes de qualquer resposta. A raiva de Fernanda estava em uma crescente quando ela decidiu canalizar sua fúria para algo mais produtivo.

Rapidamente ela pegou o nome do psicólogo e jogou na busca do Facebook. Poucos minutos depois ela tinha um plano traçado.

Sete horas da noite. O psicólogo saiu do escritório, destravou o carro, abriu a porta, sentou no banco do motorista, fechou a porta. Só que ele ouviu o som de duas portas fechando. Ele olhou para o banco do passageiro e encontrou Fernanda lá sentada.

— Boa noite, doutor — disse ela com um sorriso maldoso nos lábios. — Ouvi falar que todos os seus horários estão ocupados, mas por um acaso eu também descobri que o doutor leva cerca de uma hora e meia pra chegar em casa.

— Que maluquice é essa? Eu vou chamar a polícia e…

Fernanda puxou o psicólogo pelo colarinho.

— É o seguinte, doutor. Eu tenho sérios problemas para controlar a minha raiva e preciso de terapia. Então eu recomendo que durante a próxima hora aconteça uma sessão aqui dentro desse carro e para o seu bem é melhor que os duzentos reais que eu tenho no bolso sejam mais que o suficiente para pagar por ela.

 

Contos de Segunda #63

    Moacir estava de mau humor. Não que isso fosse novidade, principalmente em segundas-feiras. Se bem que para Moacir o ano inteiro foi uma grande segunda-feira. Tudo deu errado desde o primeiro dia do ano. As piadas sobre o presente errado que ele deu no amigo secreto que normalmente duravam até o carnaval ainda estavam rolando no Dia de Finados. O aumento de salário que foi prometido não veio, assim como o novo computador e a entrega do apartamento. A mudança devia ter acontecido enquanto Moacir estava de férias, mas uma briga entre a construtora e a imobiliária acabou atrasando a mudança em três meses. Fazia duas semanas que Moacir empacotava as coisas.

    Naquela segunda em específico ele estava de mau humor por causa do ano que custava terminar. O calendário que ficava pendurado na parede da cozinha foi feito em pedaços, o bom dia do porteiro foi respondido com alguma grosseria ininteligível e todos os xingamentos possíveis e imagináveis foram ditos no caminho até o trabalho. Chegando lá Moacir se depara com alguns colegas tendo alguma discussão banal sobre qualquer coisa. Passou por ela torcendo para que ninguém tentasse puxá-lo para dentro da conversa, mas uma frase frustrou seus planos.

— Num dá vontade de dar uma voadora nas costas com um murro na nuca de um sujeito desses?

— Só sendo muito idiota pra achar que dá pra fazer um negócio desses — rebateu Moacir.

Um silêncio funeral tomou conta da roda de conversa. Talvez se Moacir tivesse pensado por meio segundo ele não teria dito aquilo. Porque ninguém naquele recinto tinha coragem de falar daquele jeito com a autora da frase. A autora da frase era Fernanda, provavelmente a pessoa mais raivosa da face da terra, uma mulher que normalmente era bastante controlada… Até que alguém soltasse uma resposta igual a essa de Moacir.

— Como é, Moacir? — Fernanda estava claramente começando a ferver por dentro.

Moacir olhou nos olhos da moça, viu a fera que se escondia atrás deles e decidiu que precisava brigar com alguém.

— É, Fernanda, tem que ser idiota pra pensar um negócio desses. Imagina a cena. Não dá pra acertar uma voadora nas costas de uma pessoa e um murro na nuca ao mesmo tempo. Você já deu uma voadora em alguém? Já tentou fazer alguma coisa enquanto dava uma voadora em alguém?

— Tá maluco, Moacir? Você chega, nem pra dar um “bom dia” pro pessoal, ouve a conversa pela metade e ainda fica me chamando de idiota? — Ela deu um murro na mesa. — Eu não tenho culpa que você acordou de ovo virado hoje. Se você quiser falar merda pra alguém que vai aguentar calado, você vá falar com a senhora sua mãe ou praquela mosca morta que você chama de namorada.

— Eu não tenho que falar com ninguém. A culpa não é minha se você não aguenta ouvir uma verdade.

— Verdade? VERDADE? Agora você conseguiu me irritar de verdade.

— Ainda por cima fica fingindo raiva. Sabia que essa tua fama de esquentada era só marketing.

Uma caneca saiu voando na direção de Moacir. Por sorte Fernanda tinha errado.

— Ficou louca? E se aquilo me acertasse?

— Se te acertasse eu fazia questão de aparecer no hospital pra arrancar os pontos que iam fazer no buraco da tua cara. Só pra te ver sangrar mais um pouco, filho da…

A frase não terminou. Fernanda foi segurada por alguns colegas enquanto outros recomendavam que Moacir fosse embora. Ele obedeceu. Saiu andando pelo corredor e quando estava chegando perto da porta da sala ele ouviu passos acelerados, como se alguém estivesse correndo. A ideia disso estar acontecendo parecia tão absurda que ele nem fez questão de se virar na direção do som. Um piscar de olhos depois ele estava de cara no chão, com uma dor no meio das costas.

— É. Parece que não dá pra acertar um murro na nuca enquanto se dá uma voadora… Babaca.

Fernanda levantou e saiu andando. Ela gostou tanto de acertar um chute em Moacir quanto ele gostou de receber. No final todos receberam um convite a comparecer na sala do chefe e precisaram ouvir um sermão de meia hora. Não dá para dizer que eles se tornaram amigos, mas nunca mais eles se estranharam.

Eu, Você e A Muriçoca Perto da Orelha

Ontem estava eu deitado na cama quase pegando no sono. Me viro de lado e imediatamente uma coisinha começa a zumbir perto da minha orelha. Nem preciso dizer que o zumbido era provocado por uma muriçoca, oficialmente conhecida como mosquito. Em outras vezes eu já tinha conseguido exterminar às cegas uma ou outra muriçoca, mas obviamente que a taxa de sucesso pra esse tipo de tentativa é bem baixa e é claro que eu não conseguir matar a maldita. A raiva gerada pelo momento motivou a publicação dessa sexta-feira.

A muriçoca é uma cria do demônio, mas ao contrário da barata voadora, que é uma forma hedionda da barata regular, a muriçoca foi engenhada pra ser um bicho maldito. Já começa que ela usa o nosso sangue pra nutrir as suas crias, crias que usam uma quantidade obscena de sangue porque com o sangue de uma muriçoca cheia dá pra fazer o teste de glicose umas cinco vezes. Depois tem a quantidade de doenças que a muriçoca pode transmitir. Nesse campo a estrela é o nosso brother aedes aegypti, também conhecido como o mosquito da dengue, que não só transmite uns 10 tipos de dengue, mas também zika e febre chikungunya. Além de já estar ensinando às muriçocas normais algumas dessas doenças.

Mas o verdadeiro propósito da vida da muriçoca é irritar o ser humano. Seja aparecendo pra dar aquela dentada surpresa ou simplesmente orbitando a sua cabeça. E é no som que a desgraçada encontra o maior aliado. É mais fácil você aguentar o vizinho passar o dia ouvindo Wesley Safadão do que ouvir dez minutos da muriçoca voando ali pertinho da sua orelha. Você pode estar nu, com todas as partes que a muriçoca poderia morder desprotegidas, mas a cria do inferno sempre, sempre vai voar perto da sua orelha. Não importa a posição em que você está deitado, sempre vai voar perto da sua orelha e se você conseguir matar a maldita, outra vai assumir o lugar dela.

  Por hoje é só pessoal. Qualquer dia desses eu volto pra comentar mais sobre algum bicho desgraçado do nosso pálido ponto azul.

Contos de Segunda #48

    Fernanda estava muito feliz. Quando chegou em casa depois de uma segunda-feira de trabalho foi recebida por um e-mail de uma loja de sapatos. Promoções exclusivas para aqueles que clicassem no link. Fernanda clicou e poucos minutos depois estava sorrindo de orelha a orelha por causa do tamanho do desconto em um salto alto, que não só era a sua cara, mas também refletia vários aspectos interessantes de sua personalidade. Ele foi adicionado ao carrinho, Fernanda clicou em “Finalizar Pedido”, colocou o e-mail, a senha e os problemas começaram.

“Senha Incorreta”. De fato fazia muito tempo que Fernanda não comprava nada no site, esquecer a senha cadastrada era perfeitamente compreensível, por isso ela clicou em “Esqueci Minha Senha” e ficou esperando a senha provisória chegar. Um minuto, dois, ela olhou na caixa de spam e não tinha nada. Cinco, dez minutos se passaram e nada do e-mail com a senha. Ela foi lá e clicou novamente em “Esqueci Minha Senha” e dois minutos depois o sangue de Fernanda estava começando a ficar perigosamente quente. Antes de clicar pela terceira vez em “Esqueci Minha Senha” ela notou que tinha escrito “fermanda” e não “fernanda” no endereço de e-mail. Corrigido esse erro o sistema aceitou a senha e a página de confirmação dos dados e pagamento abriu. Tudo bem quando acaba bem… Ou seria se tivesse acabado.

Fernanda resolveu alterar o endereço de entrega, ela queria receber a encomenda no trabalho. Preencheu o novo endereço de entrega e os dados do cartão de crédito. A felicidade começou a voltar quando lembrou que a loja mantinha um estoque na cidade e a encomenda chegaria bem rápido. Dados conferidos, era só clicar em “Finalizar Pedido”. Ela clicou. A página exibiu o que estava sendo processado e… Ficou na mesma. A curta paciência de Fernanda só a permitiu clicar mais duas vezes.

Na terça-feira uma notícia tomou conta dos jornais. Uma mulher não identificada invadiu o galpão onde uma famosa loja de calçados na internet tem o seu estoque. Todos os seguranças foram desacordados e os cães de guarda foram encontrados apavorados, como se tivessem visto algo muito assustador. Nada foi roubado, apenas um par de sapatos de salto alto, mas segundo as informações divulgadas foi encontrada no local uma quantia em dinheiro, exatamente o valor do par de sapatos no site. O dinheiro foi encontrado dentro de um envelope onde se lia “EU TENTEI”.

Eu, Você e Os Jogos Malditos

    No último domingo um amigo meu entrou no grupo de chat e anunciou que estava jogando um jogo casual, simples e gratuito. “Baixa esse jogo, vocês vão se lascar, não posso me lascar sozinho”, foram essas palavras aflitas que o sujeito supracitado usou para convencer os integrantes do grupo a jogar também. Eu baixei o jogo, eu joguei o jogo e eu me lasquei.

    Não citarei o nome do jogo para não ajudar a espalhar essa desgraça pelo mundo, mas farei uma descrição ligeira dele. O jogo consiste em clicar na tela para eliminar monstrinhos e passar de fase. Você ganha dinheiro matando os monstros e faz uma infinidade de upgrades pra conseguir matar os monstros mais ligeiro. A graça do jogo desaparece pouco tempo depois, os números chegam a casas astronômicas e param de fazer sentido. Em vez de parar de jogar o que eu faço? Continuo jogando. Gasto um pouco mais de tempo e desligo. No outro dia eu abro de novo e o jogo não parou. Acho um absurdo e o jogo começa a parecer pior. Nem por isso eu paro de jogar.

    O tempo gasto nesse entretenimento maldito é muito menor do que eu costumo gastar em outros jogos, mas qualquer minuto gasto com isso parece custar horas do meu dia. Diante desse quadro revoltante eu fico pensando em quantas pessoas estão na mesma situação.

    O vício em jogos casuais é uma praga relativamente recente. Quem tem a minha idade lembra da febre que foram os jogos do Orkut. As pessoas mais improváveis gastavam a vida jogando Colheita Feliz e coisas do tipo. No Facebook isso também acontece e depois da popularização dos smartphones isso tomou proporções inimagináveis. Isso me leva a questionar o motivo pelo qual esses jogos nos escravizam dessa forma. Pensando um pouco só chego a uma conclusão: todos esses jogos foram tocados pelo demônio e estão infundidos com o poder das trevas.

    Pra mim não existe outra explicação. Algo sobrenatural move esses joguinhos e por isso ficamos presos apesar da raiva e da aversão que eles nos causam. Deixo aqui registrado que pretendo reverter essa relação nociva com o jogo maldito que apareceu na minha vida. Pretendo acabar com essa jogatina sem sentido e voltar minha atenção para vícios menos danosos opções de entretenimento mais saudáveis. Caso você, estimado leitor, esteja passando por uma situação semelhante, saiba que você não está sozinho. Um dia conseguiremos nos livrar dessa desgraça… Mas enquanto esse dia não chega, vou aqui olhar o quanto de dinheiro juntou enquanto eu escrevia esse texto.

Contos de Segunda #46

Todo o plano de Luciana e Roberta para juntar Jorge e Cristina não começou hoje. Esse conto, além do retorno de Jorge e Cristina à nossa série semanal,  é uma continuação dos Contos de Segunda#34, Contos de Segunda #42 e Contos de Segunda #44.

— Você e seu rolo atual vão jantar no dia dos namorados, mas em vez de aproveitar o romantismo de um momento a dois comendo sushi, vocês vão articular um blind date comigo e um amigo dele.

    Era sexta-feira. O dia dos namorados daquele ano caía no domingo e Luciana estava tentando convencer Cristina a não passar o dia 12 sozinha em casa. As duas estavam almoçando, Luciana resolveu comer um sanduíche, ela sabia que Cristina comeria alguma salada complicada que deixaria metade do cérebro dela ocupado durante a refeição. Quando o sanduíche terminou o prato de salada ainda estava na metade.

    — Falando desse jeito até parece um absurdo, Cristina. Minhas intenções são puras e minhas ações movidas exclusivamente pelo sentimento sincero que eu nutro por você – uma dose cavalar de teatralidade estava depositada em cada palavra.

    — Sei lá, Luciana. Não tô no clima de romance ultimamente, principalmente quando aparece uma oferta pra segurar vela em dupla — apesar da complicação da salada o cérebro de Cristina estava funcionando melhor que o esperado.

    — Vai ser legal, amiga. Preciso que você vá lá pra aprovar meu guitarrista. Lembra dos meus outros namorados? Graças a você eu me livrei de dois malucos, um eco terrorista e um fanático por futebol. Nunca namorei um músico, sua avaliação se faz necessária… E vai ser de graça.

    Cristina revirou os olhos como se procurasse uma solução dentro da própria cabeça. Olhou para o prato de salada, mas o alface não parecia ter uma solução escrita nas folhas. Ela respirou fundo, olhou Luciana nos olhos e disse:

    — Tá bom, tá bom — ao ouvir essas palavras Luciana bateu palmas eufóricas de satisfação. — Mas você tem que me garantir que esse amigo não é um daqueles malucos de academia, nem um que vai votar em Bolsonaro, nem daquela galera do “ain, não tinha isso no livro” e nem aqueles malucos por quadrinhos — cada um dos tipos proibidos era contado nos dedos.

    — Relaxa, gata. Pode ter certeza que o cara é perfeito pra você.

    — Já te disse pra não me chamar assim

    — Assim como?

    — “Gata”. Vi em algum lugar que não se deve confiar em uma mulher que chama a outra de “gata”, acabei ficando com isso na cabeça. Não sei se isso tem fundamento, mas por via das dúvidas não me chame desse jeito.

    O dia 12 não demorou para chegar. Era fim de tarde quando Luciana colocou a chave do carro na mão do manobrista. O restaurante japonês não era tão grande, mas era bem refinado. Em condições normais seria impossível conseguir uma reserva para o dia dos namorados tão em cima da hora, mas o guitarrista de Luciana faria uma apresentação no restaurante às oito da noite, de alguma forma aquilo ajudou com a reserva. Pouco depois de cruzar a porta um rapaz se aproximou para atendê-las.

    — Boa tarde, senhoritas. Qual o nome que está na reserva?

    — Boa tarde — respondeu Luciana. — A reserva está em nome de Fábio. Imagino que ele já esteja por aí.

    — Está sim, me acompanhem por favor.

    O rapaz conduziu as duas até chegar a um salão. Próximo do bar estava um pequeno palco onde uma moça tocava piano e cantava. Cinco mesas antes do palco estavam Fábio e seu amigo. Os dois conversavam empolgados e não notaram as moças até que as duas estivessem bem perto.

    — … Eu tô dizendo, meu velho, essas coisas só funcionam na televisão e… Olha elas aí — disse Fábio.

    Instintivamente o outro homem da mesa se virou ainda achando graça da conversa interrompida. Em uma fração de segundos o ar de riso foi convertido em uma cara de velório. A reação de Cristina não foi muito melhor.

    — Ah, não… — Disse ela baixinho. — Oi… Jorge.

    — Cristina, que… Surpresa — o olhar de Jorge foi desviado imediatamente para Luciana. — Não sabia que a menina de quem Fábio estava falando era você, Luciana.

    — É sempre bom te ver também, Jorge. A gente chegou muito cedo, Guitarrista?

    — Na hora certa, Lulu — Fábio se levantou, deu um beijo no rosto de Luciana e ofereceu a cadeira ao lado de Jorge. — E você é Cristina. Sou curioso pra te conhecer faz tempo.

    — Digo o mesmo, Fábio. Não sabia que você e Jorge eram amigos — respondeu Cristina sentando de frente para Jorge, o olhar dos dois se encontrou por um instante. Ele estava tão raivoso quanto ela.

    — Então, Luciana, foi Roberta que apresentou vocês dois? — Perguntou Jorge desbloqueando a tela do celular.

    — Ela me levou pra um ensaio do casamento do irmão dela e a gente se conheceu lá.

    — Ah, é mesmo? — Os dedos de Jorge digitavam rapidamente uma mensagem para Roberta. “Você não devia ter se metido nisso, Roberta”.

    — Eu não tinha sido convidada pro casamento e estava curiosa sobre a banda. Cristina não topou me levar de penetra e Roberta acredita piamente que o irmão dela me detesta.

    — Tenho a forte impressão que o irmão dela também acredita nisso — interrompeu Cristina enquanto enviava uma mensagem para Roberta. “Vou te enforcar com as tuas tripas, Roberta”.

    — Se vocês me dão licença, eu vou no banheiro e volto logo — disse Jorge olhando diretamente para Cristina.

    A moça entendeu a deixa. Jorge podia estar no topo da lista negra, mas eles precisariam trabalhar juntos pra sair dessa situação.

    — Eu vou dar uma passada no bar, estou com planos de ficar meio bêbada, melhor começar cedo.

    Os dois seguiram caminhos distintos. Jorge partiu em direção ao banheiro, mas antes disso entregou um cartão a um garçom qualquer pedindo para entregá-lo à moça que estava chegando no bar. Assim que o cartão chegou Cristina discou o número.

    — Se você tiver alguma coisa a ver com essa história… Alguma coisa com saquê e morango, por favor. Se você estiver no meio disso, Jorge, pode ter certeza que eu te mato antes de matar Roberta.

    — Me mata depois, aí eu te ajudo a esfolar Roberta viva. Eu convenci Fábio a tocar no casamento do irmão dela e é assim que ela me paga.

    — A culpa só podia ser tua, Jorge. Deus queira que esse teu amigo da guitarra não tenha muita coisa pra contar a Luciana.

    — Relaxa que Fábio sabe menos coisa do que Luciana, pelo menos sabia. A gente precisa de um plano.

    — Depois dessa mão-de-obra toda não tem plano? E Luciana ainda quer me juntar contigo, sinceramente.

    — E ainda me perguntam por que eu não gosto de você… Fábio toca às oito, são dez pras seis. Imagino que ele vai sair da mesa pelo menos meia hora antes…

    — Eu não vou ficar mais de duas horas olhando pra tua cara, Jorge. Antes disso eu pulo no pescoço de Luciana e a gente vai daqui pra delegacia ou pro hospital… Tais de carro?

    — Sim. E pelo jeito da pergunta Luciana é a tua carona.

    — Foco na solução, Jorge. É só a gente dar um jeito de disfarçar e depois dá uma escapulida. Eu fico no bar e você finge que tá com dor de barriga.

    — Por que eu tenho que fingir que estou com cag… Dor de barriga? É só eu ir pro bar também, digo que quero ver a pianista de perto.

    — Nós dois no mesmo lugar e eles não vão tirar os olhos da gente. Vou voltar pra mesa, lá a gente pensa em alguma coisa.

    Meia hora se passou. Luciana e Fábio pediram sushi, Jorge não pediu nada e Cristina resolveu não tomar mais nada alcoólico. A tensão da mesa era crescente. Luciana e Fábio pareciam estar se divertindo muito com toda a situação, enquanto Jorge e Cristina estavam se sentindo feras enjauladas.

    — Jorge, já comeu desses sushis com camarão? — Perguntou Fábio. — Eu acho meio estranho.

    — Esqueceu que eu sou alérgico? Se eu colocar um camarão na boca já começo a ter reação.

    — Sério? — Perguntou Luciana genuinamente surpresa.

    Cristina olhou para Jorge. Quando ele olhou de volta ela indicou o camarão com os olhos. Ele fez “não” com a cabeça, ela fez “sim.

    — Sério, Luciana. Vê só — antes que alguém pudesse ver Jorge jogou um pedaço de camarão dentro da boca, mastigou duas vezes e cuspiu.

    Imediatamente a língua dele dobrou de tamanho, o rosto ficou vermelho e estava começando a inchar.

    — Meu Deus, Jorge! — Gritou Cristina da forma mais exagerada que ela pode. — Tá doido? A gente tem que te levar pro hospital.

    — Assho que ffffim — respondeu o pobre Jorge.

    — Me dá a chave do carro, eu te levo — disse Cristina. — Fábio precisa tocar e Luciana leva ele depois.

    Os dois se levantaram e saíram correndo. Antes que Luciana e Fábio pudessem entender tudo, Cristina já estava dando partida no carro. Jorge abriu o porta-luvas, sacou um tubo de plástico, tirou uma ponta e cravou na perna. O antialérgico tinha sido rápido o suficiente para salvar Jorge de um possível choque anafilático. Cristina se colocou no caminho de casa, pouco antes de chegar lá Jorge conseguiu falar.

    — Você só pode ser doida, Cristina.

    — Não te obriguei a fazer nada, Jorge, mas não vou ser injusta com você. Parabéns pela coragem.

    — Não pensei muito, dois segundos a mais de raciocínio e a gente ainda estaria lá — o nervosismo na voz dele era perceptível.

    — A gente precisa dar um jeito nisso, Jorge, a situação tá fora de controle.

    — Segunda-feira a gente pensa nisso, Cristina. Esse remédio já tá me deixando com um sono inacreditável. Me deixa em casa que eu te coloco num táxi ou pego meu carro na tua casa amanhã cedo.

    — Eu que não vou pagar táxi, acabei de salvar tua vida. Mereço no mínimo uma carona, com ou sem você no carro.

    — Então considere isso como o seu presente… Feliz dia dos namorados, Cristina.

    Antes que ela pudesse responder Jorge já estava dormindo. Um sorriso surgiu no rosto da moça. Ela dobrou uma esquina e parou em um posto de gasolina, pegou o telefone de Jorge e ligou para a mãe dele. Ele dormiu antes de dizer onde morava.

Contos de Segunda #31

— Fernanda, já vou entrar pra fazer meu exame. É o tempo de você chegar aqui.

— Tá certo, mãe. Saio em dez minutos.

Fernanda desligou o telefone, colocou uma calça, pegou as chaves do carro e a bolsa. Era segunda-feira, janeiro. Mês preferido da mãe dela para ir a inúmeros médicos e realizar toda a sorte de exames. Aquele seria o último exame daquela manhã, logo depois as duas almoçariam juntas. Fernanda deixaria a mãe em casa e depois partiria para uma entrevista de emprego. Ela já tinha feito aquilo várias vezes, exceto pela parte da entrevista, o caminho era conhecido e não tinha erro. De fato não teve, mas nem sempre as coisas são tão fáceis.

Depois de entrar no carro a moça conectou o celular ao aparelho de som, escolheu uma playlist e partiu. Desceu a rua, virou uma esquina e caiu dentro do maior engarrafamento da sua vida até então. A rua estava passando por obras. Obras que tinham começado naquela manhã e que pegaram muitos motoristas de surpresa, inclusive Fernanda. A possibilidade de engatar a ré foi eliminada pelos oito carros parados atrás dela. Não tinha muito o que fazer além de continuar ouvindo música e andar a meio quilômetro por hora. O trecho até o ponto em obras era curto, não seria tanto transtorno. Foi quando começaram a buzinar.

Fernanda tinha um problema sério com buzinas. Bastava uma buzina para o pavio curto da moça ficar muito menor. Principalmente quando a primeira buzina era apenas o inicio de um verdadeiro coro. Quando a terceira buzina se juntou à sinfonia, Fernanda já apertava o volante com tanta força que os nós dos dedos já estavam ficando brancos. Ela aumentou o volume da música, mas do nada o celular desconectou. Depois de cinco tentativas ela resolveu ouvir rádio. Só que naquela rua, por algum motivo desconhecido, praticamente todas as estações ficavam fora do ar. Problema que normalmente não incomodava, já que passar por ali nunca demorava. Ela teve que se conformar em escutar o debate com um ateu, um deputado, uma freira, o comandante da polícia militar e um cara que tem um vlog de sucesso no YouTube. O debate já estava ruim o suficiente quando o ar condicionado parou de funcionar.

Quarenta minutos depois Fernanda conseguiu passar pelo trecho de obras. Com raiva, suada, sem paciência e com uma vontade incontrolável de meter a mão nas fuças de um certo carinha do YouTube que conseguiu irritar muito mais do que as buzinas.

— Que demora foi essa, Fernanda? Tô esperando tem vinte minutos. Veio com os vidros abertos nesse calor?

— Mãe, vem logo que eu preciso fazer uma coisa antes da gente almoçar.

— Não me apresse que você sabe como é ruim entrar nesse seu carro. Quem é que tá falando no rádio? Ah, é aquele menino da internet. Eu adoro os vídeos dele, é tão engraçado, né?

Fernanda não respondeu. Ela teve que deixar a mãe em casa, aparentemente ela tinha perdido a fome. Provavelmente a “coisa” que precisava ser feita antes do almoço foi um choque muito grande. Naquela tarde os jornais noticiaram o triste acidente sofrido por um jovem de sucesso no YouTube. Ele foi atropelado quando atravessava a rua saindo de uma rádio. O motorista não pôde ser identificado e não conseguiram anotar a placa do veículo.

Contos de Segunda #24

Fernanda parou na frente do computador e apertou o botão de ligar. O humor dela não podia estar melhor, a noite de domingo tinha sido incrivelmente produtiva e o relatório seria entregue sem problemas na metade da tarde… Mas o computador não ligou. Ela apertou o botão novamente… Nada, nem um apito, bip ou ruído de espécie alguma. O humor dela começou a piorar. O botão foi apertado mais três vezes antes de Fernanda entrar em um frenesi e apertar a pobre peça plástica mais rápido do que os olhos podiam ver. Nada. Nesse ponto Fernanda já estava trincando os dentes e esmurrando a mesa. “Maldito computador”, pensava ela. O rosto estava quente de raiva, a respiração estava acelerada. Ela levantou e começou a dar voltas pelo quarto, quando a paciência chegou a um nível abaixo de zero um chute atingiu a mesa. Miraculosamente o computador ligou.

Pouco tempo depois a tela de login apareceu. Oito letras e um enter depois o humor de Fernanda começava a dar sinais de melhora. “Senha Incorreta”. “É o quê?”, pensou a pobre moça enquanto digitava a senha novamente. “Senha Incorreta”. Um punho cerrado caiu pesadamente sobre a mesa. “Senha Incorreta”. “Filho da …”, a moça quase explodiu de fúria. Depois de respirar fundo três vezes ela digitou a senha novamente, pouco antes de teclar enter ela notou que a tela não exibia o seu usuário. Depois de inserir o seu nome de usuário e a senha correta a tela exibiu um “Bem Vindo”. E foi só isso que a tela mostrou por mais de cinco minutos.

Nesse ponto Fernanda já estava cega de ódio. O tempo estava correndo e o relatório não estava ficando pronto. Quando o computador finalmente exibiu a área de trabalho a pobre moça foi direto na pasta de documentos. A pasta não abriu. Mais alguns cliques frenéticos e nada. Fernanda estava à beira de um infarte quando a pasta finalmente abriu, o arquivo do relatório também e o trabalho pôde ser concluído. Agora bastava enviar o arquivo por email e tudo terminaria bem. Foi quando a internet resolveu cair.

Naquele inicio de tarde um laptop saiu voando pela janela. Fernanda estava com seu relatório são e salvo na nuvem. Ela sabia bem disso, tudo tinha dado certo, mas o computador não podia sair ileso.

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