Fernanda estava tentando controlar a raiva. Depois de ter acertado uma voadora nas costas de um colega de trabalho com todo mundo do escritório vendo, Fernanda decidiu que a raiva estava atrapalhando um pouco a sua vida.
Como Fernanda não conhecia ninguém que pudesse indicar um psicólogo, resolveu procurar por conta própria. Foi na lista fornecida pelo plano de saúde, achou um que ficava perto de casa e ligou para o consultório… Ninguém atendeu. Ela tentou mais uma, duas, três vezes antes de alguém atender.
— Centro de psicologia clínica, boa tarde — disse uma voz feminina em um tom monótono.
— Boa tarde. Eu quer… – Começou Fernanda.
— Aguarde um instante por gentileza — respondeu a moça do outro lado da linha logo antes de colocar uma música para tocar.
Fernanda tirou o telefone do ouvido e encarou o aparelho com um olhar incrédulo. “Já começou mal”, pensou ela. Lembrou que todos os psicólogos da lista do plano de saúde ficavam estupidamente longe da casa dela e arrumou um pouco mais de paciência para gastar enquanto tocava a musiquinha da ligação em espera. Paciência essa que estava bem perto do fim quando a voz do outro lado da linha retornou.
— Alô, senhor?
— Eu não…
— Como posso ajudar, senhor?
— Eu quero marcar um horário, mas eu não sou…
— É particular ou plano, senhor?
— Estou tentando dizer que eu não…
— Senhor, sem essas informações eu não posso marcar a consulta.
Fernanda respirou fundo, deu um murro na mesa, se concentrou para não subir o tom de voz e finalmente disse:
— Não sou homem, moça… E vai ser pelo plano.
— Ah, ok então.
Depois de passar todas as informações do plano de saúde, Fernanda estava pronta para considerar o assunto resolvido e muito satisfeita por não ter perdido a calma… Mas ela devia saber que só acaba quando termina.
— Estamos sem horário, senhor… Quer dizer, senhora.
— Sem horário?
— Exato. Estamos enfrentando alguns problemas com o seu plano e reduzimos os horários de atendimento para quem tem esse convênio. Atualmente todos os horários estão ocupados. A senhora vai querer fazer particular?
— E quanto seria?
— Atualmente o valor fica em torno de quinhentos reais.
— QUINHENTOS REAIS?
— Não precisa gritar, senhora.
— Não preciso? É, não preciso, mas motivo não falta.
O telefone foi desligado antes de qualquer resposta. A raiva de Fernanda estava em uma crescente quando ela decidiu canalizar sua fúria para algo mais produtivo.
Rapidamente ela pegou o nome do psicólogo e jogou na busca do Facebook. Poucos minutos depois ela tinha um plano traçado.
Sete horas da noite. O psicólogo saiu do escritório, destravou o carro, abriu a porta, sentou no banco do motorista, fechou a porta. Só que ele ouviu o som de duas portas fechando. Ele olhou para o banco do passageiro e encontrou Fernanda lá sentada.
— Boa noite, doutor — disse ela com um sorriso maldoso nos lábios. — Ouvi falar que todos os seus horários estão ocupados, mas por um acaso eu também descobri que o doutor leva cerca de uma hora e meia pra chegar em casa.
— Que maluquice é essa? Eu vou chamar a polícia e…
Fernanda puxou o psicólogo pelo colarinho.
— É o seguinte, doutor. Eu tenho sérios problemas para controlar a minha raiva e preciso de terapia. Então eu recomendo que durante a próxima hora aconteça uma sessão aqui dentro desse carro e para o seu bem é melhor que os duzentos reais que eu tenho no bolso sejam mais que o suficiente para pagar por ela.