Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Tag: Romance

O Sexo dos Pombos

Esses dias eu estava viajando a trabalho. Como da outra vez em que isso aconteceu, interrompi o fluxo normal de publicações deste maravilhoso blog. Nessa onda de parar de publicar eu não fiz post por causa do meu aniversário, nem por causa do dia das mães ou por causa do aniversário do Cachorros de Bikini (completamos dois anos no começo deste mês). Também mantive a política editorial em relação aos temas pessoais que chegam a ser publicados por aqui. Normalmente ninguém liga pra essa parada, mas um certo amigo do trabalho passou o último mês e meio inconformado com a minha negligência. Em um dos picos de insatisfação ele me disse: “Vou te dar um tema, você vai fazer um post sobre o sexo dos pombos”. O pedido era compreensível, afinal um par dessas aves tão singulares estava passando as últimas noites tendo um romance ardente na janela do quarto desse meu amigo. Imediatamente eu preparei o “não”, mas o meu cérebro acabou me traindo. Durante o meio segundo que levou pra negativa sair do cérebro e chegar na garganta, as engrenagens trabalharam e cá estou eu pra falar do sexo dos pombos.

Sempre ouvi falar que duas coisas que não se vê muito por aí é enterro de anão e filhote de pombo. Tendo isso em mente, não parece absurdo pensar que os pombos são gerados espontaneamente já na forma adulta, o que removeria de suas vidas a necessidade do envolvimento carnal entre os indivíduos de gêneros opostos, removeria inclusive a necessidade de haver a diferenciação de gêneros. Mesmo contrariando esse conhecimento popular perpetuado ao longo de tantas gerações, os pombos não só se reproduzem da mesma forma que as outras aves, como também são um padrão para os casais apaixonados. Não é raro ouvir em novelas ou filmes dublados que os casais apaixonados são “dois pombinhos”. Isso nos leva ao primeiro ponto relevante dessa nossa conversa: o romance dos pombos.

Nunca consegui processar direito essa associação entre os casais apaixonados e os pombos. Normalmente aves não são muito expressivas, o pombo não foge muito a essa regra, mas eis que estou um dia olhando pela janela e vejo uma cena muito semelhante à essa aqui:

Sim, você acabou de ver o registro de um pombo cortejando uma pomba e, por incrível que pareça, o pombo me pareceu bem mais respeitoso com sua paquera do que boa parte dos animais que eu já vi em situação similar. Antes que você ache que eu sou um voyeur de bicho, devo dizer que assisti um tanto considerável de Globo Rural ao longo da minha, não tão curta assim, vida de 27 anos. Também devemos lembrar que os pombos são monogâmicos, ou seja, não possuem mais de um parceiro por vez. Levando isso tudo em consideração podemos dizer que o pombo é um animal relativamente romântico. Então chegamos ao ponto principal deste post: o tal sexo dos pombos.

Segundo a Wikipédia, os pombos se reproduzem ao longo de todo ano e preferem fazer isso em locais que se assemelham aos ambientes onde eles fazem seus ninhos na natureza. Os locais preferidos atualmente são os parapeitos das janelas e estruturas similares. Essas duas informações nos levam a duas conclusões: a primeira é que os pombos são seres naturalmente fogosos e não tão nem aí pra épocas propícias, o negócio é procriar. A segunda é que os pombos querem mais é que todo mundo testemunhe o amor deles.

Aí acaba o bem bom. Os ovos chegam ao ninho e lá vão os dois pombinhos pro revezamento de chocar as crias. Depois que eles nascem eles são “amamentados” por suas mães com o chamado leite de bucho, presente nas aves amamentadoras. Depois dessa acho que não tenho mais o que dizer. Até a próxima e não alimente os pombos.

Contos de Segunda #69

Jorge e Cristina são os protagonistas do nosso especial de ano novo, mas a história de hoje é uma continuação direta dos eventos de Contos de Segunda #66.

— Fábio vai mesmo arrumar os ingressos?

    — Vai. Hoje mesmo ele deve deixar comigo.

    Cristina e Luciana estavam resolvendo os planos para a virada de ano. Cristina estava um pouco tensa, os planos foram deixados para o último momento, já que Fábio, namorado de Luciana e guitarrista, estava esperando aparecer algum convite para tocar em uma festa de Reveillon e possivelmente conseguir levar as duas amigas de graça. Dois dias atrás Fábio recebeu a confirmação, mas Cristina não estava nem um pouco crédula e já tinha preparado o psicológico para uma virada de ano assistindo duas queimas de fogos.  Das cidades dentro e fora do horário de verão.

    — Pena que não vai ter ingresso pra Roberta — lamentou Luciana.

    — Roberta viajou — replicou Cristina. — Adiantou uns dias das férias, colocou o cachorro na mala do carro e partiu pra casa da família no interior.

    — E eu aqui preocupada com ela — Luciana fez uma pausa para olhar a mensagem de Fábio no celular. — Tudo certo. Hoje de noite eu pego os ingressos.

    Dois dias depois Cristina estava diante do espelho, toda de branco, conferindo a maquiagem antes de Luciana aparecer com o carro. Depois de contemplar o reflexo por alguns segundos, Cristina chegou à conclusão de que estava realmente bem bonita. Ela nem lembrava qual foi a última vez em que tinha se sentido daquele jeito, tanto que imediatamente começou a vislumbrar a possibilidade de aparecer algum fulano interessante que estivesse igualmente interessado… E a possibilidade de aparecer alguns fulanos não tão interessantes assim. Repassou mentalmente o repertório de foras e as bebidas que seriam evitadas por deixarem o jogo mais fácil para os fulanos menos interessantes.

    — Uau — disse Luciana quando Cristina entrou no carro. — Por favor, moça, você poderia sentar no banco de trás? Minha amiga vem aí e ela gosta de andar no banco da frente.

    — Nossa, Luciana. Demorou muito pra pensar nessa piada?

    — Que mulher azeda, meu Deus — respondeu Luciana. — Mudando um pouco de assunto. Fábio disse que vai entrar no palco logo depois dos fogos. Vou ficar na contagem regressiva atrás do palco com ele, quando ele for tocar a gente se encontra. Antes de chamarem ele a gente fica no bar.

    — Não tô com muita vontade de ficar de vela hoje, Luciana. Depois que a gente definir o ponto de encontro eu deixo vocês sozinhos.

    Foi exatamente o que aconteceu. Depois de cumprimentar Fábio, Cristina pegou uma bebida colorida e foi circular pelo evento. Uma multidão vestida de branco estava na frente do palco. Infelizmente a banda da vez tinha um repertório baseado em sertanejo universitário e forró estilizado. Baseado nas piores músicas possíveis de forró e sertanejo. Já que assistir esse show estava fora de questão, ela resolveu arrumar um bom lugar para ver os fogos. Depois de muito procurar, Cristina encontrou um mirante em cima do bar. Dali a visão do palco era péssima, mas a visão do céu estava ótima. Aparentemente as outras pessoas da festa estavam pouco interessadas em ver o céu, deixando a varanda só para Cristina e mais um ou dois casais. Com um pouco de esforço Cristina localizou Luciana e Fábio. O namoro dos dois ainda era uma surpresa e, do jeito que ia, o casamento não tardaria a chegar. Sem dúvida uma das apostas de Cristina para o ano novo. E aparentemente não tinha só ela fazendo apostas de ano novo. Várias pessoas fugiram do branco e estavam usando cores que chamam dinheiro, saúde, amor… Menos uma pessoa que estava usando uma camiseta marrom.

    — Que tipo de mané vira o ano usando marrom? — Questionou ela num tom irônico. O tal fulano vestido de marrom acabou olhando de volta para ela. — Jorge? Só me faltava essa.

    Jorge aparentemente não reconheceu Cristina. Ele estava mais preocupado em manter a conversa com uma moça de cabelo loiro comprido e jeito de musa fitness. Para Cristina a cena era mais uma surpresa do que um incômodo. Na cabeça dela Jorge era incapaz de sustentar uma conversa interessante por muito tempo. Riu sem querer dos próprios pensamentos. Lembrou do incidente do elevador, do jantar desastroso no dia dos namorados e de como tudo estava mais tranquilo agora que Jorge não trabalhava mais com ela. Tranquilo demais. Cristina sentia falta de um rival. Ninguém conseguia oferecer tanto desafio quanto Jorge.

    Ela olhou para o relógio. O ano terminaria em dez minutos. O céu estava sem nuvens e a lua crescente abria um sorriso fino no céu. Infelizmente todas as estrelas estavam cegas pelas luzes. A bebida acabou, ela pegou outra com um garçom errante que passava por ali. Olhou novamente para Jorge e notou que a conversa com a loira fitness não estava indo muito bem. Entre um gole e outro da bebida Jorge ficou fora de vista. Mais cinco minutos e o ano daria adeus. Luciana e Fábio já deviam estar atrás do palco esperando o ano novo chegar.

    — Não imaginei que te veria por aqui — disse uma voz familiar.

    — Não imaginei que existisse gente que vira o ano de marrom.

    Jorge estava parado do lado dela. Ele segurava um copo com alguma bebida transparente e olhava direto para a Lua.

    — Nunca gostei muito dessas coisas de cor de roupa no ano novo. Algumas pessoas ficam realmente incomodadas quando você diz isso ou quando você não acredita em horóscopo.

    — Foi por causa disso que a tua amiga galega desistiu de conversar contigo?

    — Mais ou menos — disse ele sem jeito. — Ela disse que eu tinha que prestar atenção nela e não na moça que estava no mirante. Claro que ela usou alguns termos menos brandos, mas é melhor não repetir exatamente o que ela me falou.

    Cristina corou de leve. As palavras de Jorge a pegaram de surpresa.

    — Mal sabe ela do que se livrou.

    — Concordo. Hoje eu não estou muito pra interagir com desconhecidos. Se Fábio não precisasse de uma ajuda com o equipamento eu nem estaria aqui.

    Começou a contagem regressiva.

    — Hora de fazer um pedido de ano novo, Jorge.

    — Pedido? Nem sei se tem alguma coisa pra pedir. Acho que vou pedir alguém pra arengar contigo no escritório.

    — Acho válido. Não tem ninguém naquele escritório que dê uma briga boa.

    — Claro que tem. É só saber bater que aparece alguém pra bater de volta.

    Os gritos interromperam a conversa. Os fogos iluminaram o céu. Por dez minutos todos contemplaram o céu em silêncio.

    — Vou lá encontrar com Luciana — disse ela olhando para o celular. — Foi bom te ver, Jorge.

    — Vai ver Fábio tocar?

    — Acho que não. Luciana me adiantou o set list do show e a gente não gostou muito. E você?

    — Acho que vou ficar por aqui pro caso de vocês ficarem com vontade de conversar com alguém conhecido.

    — Volta pra tua galega, Jorge. Se depender da gente, o teu começo de ano vai ser bem solitário.

    A frase mal terminou e Cristina saiu andando. Depois de dois passos ela ouviu a resposta de Jorge.

    — Feliz ano novo, Cristina

    Ela não se incomodou em parar, muito menos em desejar o mesmo.

Contos de Segunda #61

O conto a seguir é uma continuação dos eventos do nosso especial do Dia dos Namorados. Para saber o que aconteceu entre Jorge e Cristina nessa data tão romântica é só dar uma lida no Contos de Segunda #46.

  Cristina estava contando os minutos para as seis da tarde. Normalmente a segunda, apesar de ser o pior dia da semana para ela, costumava passar rápido, mas aquela segunda em especial estava custando a passar… E o mau humor de Cristina estava crescendo junto com a lerdeza das horas.

    — Que cara é essa, amiga? — A pergunta vinha de uma pessoa que ultimamente estava se esforçando para não ser brutalmente assassinada por Cristina.

    — Só tenho essa cara, Luciana — respondeu Cristina passando os olhos rapidamente pela caixa de emails e anotando algumas coisas em um bloquinho.

    — Nem parece que o final de semana foi bom — disse Luciana sem tirar os olhos das fotos na tela do computador. Aparentemente ela tinha esquecido de organizar as fotos dos eventos da empresa desde o início do ano, mas estava tão tranquila com o prazo apertado que parecia estar adiantando trabalho do ano que vem.

    — Não tem nada a ver com meu fim de semana, Luciana.

    — Ah, então quer dizer que o professor rendeu alguma coisa. Muita malvadeza tua não compartilhar com as amigas.

    — Nem tem o que compartilhar, Luciana. O professor é um cara legal, mas… — Ela tirou a cabeça da frente do monitor. — Sei lá, não deu aquele estalo.

    — Que nem dá com Jorge?

    Apesar de não ter gostado do comentário Cristina não podia negar. Depois do Dia dos Namorados ela não tinha mais falado com Jorge sobre assuntos que não fossem relacionados ao trabalho. De lá pra cá ela saiu com pelo menos quatro caras diferentes e outros três foram eliminados antes do primeiro encontro. Todos eles eram bajuladores. Cristina não gostava de ficar num pedestal. Namoro tinha que ser uma mistura de queda de braço, cumplicidade criminosa, alguns nãos antes dos sins e uma pitada de rivalidade. Fugir do restaurante japonês junto com Jorge no Dia dos Namorados teve um sabor parecido.

— Jorge não dá nada, Luciana, nada além de trabalho. Sabia que ele veio reclamar comigo por causa da ação do Dia das Crianças no nosso site?

— Só por causa da falta de autorização do uso das imagens?

— Ninguém ia ligar praquelas imagens, ele só queria arrumar motivo pra se meter no trabalho da gente. O trabalho seria bem mais tranquilo se ele fosse embora.

Roberta entrou na sala assim que a frase terminou. Qualquer um que olhasse no rosto dela pensaria que ela ia explodir se não começasse a falar logo.

— Volte daí mesmo, Roberta — disparou Cristina assim que viu a amiga. — A vontade de te assassinar ainda não passou toda.

— Deixa eu soltar a bomba que eu saio — rebateu Roberta virando imediatamente na direção de Luciana. — Jorge foi chamado pra trabalhar no Ministério Público… Ele começou a cumprir aviso prévio hoje.

— Roberta, fecha a porta — disse Luciana puxando uma cadeira para a amiga sentar. — Explica essa história.

— Jorge passou num concurso antes de vir trabalhar aqui. Na verdade ele tinha trabalhado aqui quando era estagiário e saiu pra poder estudar pra esse concurso. Esse resultado saiu tem quase dois anos. Ele tinha acabado de voltar pra cá.

— Ele vai embora no começo do mês que vem? — Perguntou Luciana.

— Isso. Pelo menos ele pediu pra não tirar ele do amigo secreto do jurídico, o que é uma maravilha por que ele sempre dá presente bom.

— É bem a cara dele gostar dessas coisas de amigo secreto — desdenhou Cristina.

— Que maldade, Cristina — Roberta fez um bico. — Jorge é uma das melhores pessoas dessa empresa e você fica com essas coisas.

— Liga não, Roberta — o tom de Luciana dava uma prévia da dose de veneno contida na frase seguinte. — Ela tá assim por que ela não agarrou o boy e agora ele vai embora.

— Morreu esse assunto por hoje! — Esbravejou Cristina. — Roberta, volta pra tua sala antes que o pessoal volte do café e te veja por aqui. Luciana, organiza logo essas fotos que é melhor

Cristina respirou fundo, pegou a caneca térmica e tomou um gole longo de café. Pela porta que Roberta deixou aberta ela conseguia ver uma movimentação anormal no corredor. Aparentemente muita gente apareceu para dar os parabéns a Jorge. Ela nunca tinha reparado em quantos amigos ele tinha no escritório. Quando o gole acabou ela ainda estava pensando se também sentiria falta dele.

Contos de Segunda #46

Todo o plano de Luciana e Roberta para juntar Jorge e Cristina não começou hoje. Esse conto, além do retorno de Jorge e Cristina à nossa série semanal,  é uma continuação dos Contos de Segunda#34, Contos de Segunda #42 e Contos de Segunda #44.

— Você e seu rolo atual vão jantar no dia dos namorados, mas em vez de aproveitar o romantismo de um momento a dois comendo sushi, vocês vão articular um blind date comigo e um amigo dele.

    Era sexta-feira. O dia dos namorados daquele ano caía no domingo e Luciana estava tentando convencer Cristina a não passar o dia 12 sozinha em casa. As duas estavam almoçando, Luciana resolveu comer um sanduíche, ela sabia que Cristina comeria alguma salada complicada que deixaria metade do cérebro dela ocupado durante a refeição. Quando o sanduíche terminou o prato de salada ainda estava na metade.

    — Falando desse jeito até parece um absurdo, Cristina. Minhas intenções são puras e minhas ações movidas exclusivamente pelo sentimento sincero que eu nutro por você – uma dose cavalar de teatralidade estava depositada em cada palavra.

    — Sei lá, Luciana. Não tô no clima de romance ultimamente, principalmente quando aparece uma oferta pra segurar vela em dupla — apesar da complicação da salada o cérebro de Cristina estava funcionando melhor que o esperado.

    — Vai ser legal, amiga. Preciso que você vá lá pra aprovar meu guitarrista. Lembra dos meus outros namorados? Graças a você eu me livrei de dois malucos, um eco terrorista e um fanático por futebol. Nunca namorei um músico, sua avaliação se faz necessária… E vai ser de graça.

    Cristina revirou os olhos como se procurasse uma solução dentro da própria cabeça. Olhou para o prato de salada, mas o alface não parecia ter uma solução escrita nas folhas. Ela respirou fundo, olhou Luciana nos olhos e disse:

    — Tá bom, tá bom — ao ouvir essas palavras Luciana bateu palmas eufóricas de satisfação. — Mas você tem que me garantir que esse amigo não é um daqueles malucos de academia, nem um que vai votar em Bolsonaro, nem daquela galera do “ain, não tinha isso no livro” e nem aqueles malucos por quadrinhos — cada um dos tipos proibidos era contado nos dedos.

    — Relaxa, gata. Pode ter certeza que o cara é perfeito pra você.

    — Já te disse pra não me chamar assim

    — Assim como?

    — “Gata”. Vi em algum lugar que não se deve confiar em uma mulher que chama a outra de “gata”, acabei ficando com isso na cabeça. Não sei se isso tem fundamento, mas por via das dúvidas não me chame desse jeito.

    O dia 12 não demorou para chegar. Era fim de tarde quando Luciana colocou a chave do carro na mão do manobrista. O restaurante japonês não era tão grande, mas era bem refinado. Em condições normais seria impossível conseguir uma reserva para o dia dos namorados tão em cima da hora, mas o guitarrista de Luciana faria uma apresentação no restaurante às oito da noite, de alguma forma aquilo ajudou com a reserva. Pouco depois de cruzar a porta um rapaz se aproximou para atendê-las.

    — Boa tarde, senhoritas. Qual o nome que está na reserva?

    — Boa tarde — respondeu Luciana. — A reserva está em nome de Fábio. Imagino que ele já esteja por aí.

    — Está sim, me acompanhem por favor.

    O rapaz conduziu as duas até chegar a um salão. Próximo do bar estava um pequeno palco onde uma moça tocava piano e cantava. Cinco mesas antes do palco estavam Fábio e seu amigo. Os dois conversavam empolgados e não notaram as moças até que as duas estivessem bem perto.

    — … Eu tô dizendo, meu velho, essas coisas só funcionam na televisão e… Olha elas aí — disse Fábio.

    Instintivamente o outro homem da mesa se virou ainda achando graça da conversa interrompida. Em uma fração de segundos o ar de riso foi convertido em uma cara de velório. A reação de Cristina não foi muito melhor.

    — Ah, não… — Disse ela baixinho. — Oi… Jorge.

    — Cristina, que… Surpresa — o olhar de Jorge foi desviado imediatamente para Luciana. — Não sabia que a menina de quem Fábio estava falando era você, Luciana.

    — É sempre bom te ver também, Jorge. A gente chegou muito cedo, Guitarrista?

    — Na hora certa, Lulu — Fábio se levantou, deu um beijo no rosto de Luciana e ofereceu a cadeira ao lado de Jorge. — E você é Cristina. Sou curioso pra te conhecer faz tempo.

    — Digo o mesmo, Fábio. Não sabia que você e Jorge eram amigos — respondeu Cristina sentando de frente para Jorge, o olhar dos dois se encontrou por um instante. Ele estava tão raivoso quanto ela.

    — Então, Luciana, foi Roberta que apresentou vocês dois? — Perguntou Jorge desbloqueando a tela do celular.

    — Ela me levou pra um ensaio do casamento do irmão dela e a gente se conheceu lá.

    — Ah, é mesmo? — Os dedos de Jorge digitavam rapidamente uma mensagem para Roberta. “Você não devia ter se metido nisso, Roberta”.

    — Eu não tinha sido convidada pro casamento e estava curiosa sobre a banda. Cristina não topou me levar de penetra e Roberta acredita piamente que o irmão dela me detesta.

    — Tenho a forte impressão que o irmão dela também acredita nisso — interrompeu Cristina enquanto enviava uma mensagem para Roberta. “Vou te enforcar com as tuas tripas, Roberta”.

    — Se vocês me dão licença, eu vou no banheiro e volto logo — disse Jorge olhando diretamente para Cristina.

    A moça entendeu a deixa. Jorge podia estar no topo da lista negra, mas eles precisariam trabalhar juntos pra sair dessa situação.

    — Eu vou dar uma passada no bar, estou com planos de ficar meio bêbada, melhor começar cedo.

    Os dois seguiram caminhos distintos. Jorge partiu em direção ao banheiro, mas antes disso entregou um cartão a um garçom qualquer pedindo para entregá-lo à moça que estava chegando no bar. Assim que o cartão chegou Cristina discou o número.

    — Se você tiver alguma coisa a ver com essa história… Alguma coisa com saquê e morango, por favor. Se você estiver no meio disso, Jorge, pode ter certeza que eu te mato antes de matar Roberta.

    — Me mata depois, aí eu te ajudo a esfolar Roberta viva. Eu convenci Fábio a tocar no casamento do irmão dela e é assim que ela me paga.

    — A culpa só podia ser tua, Jorge. Deus queira que esse teu amigo da guitarra não tenha muita coisa pra contar a Luciana.

    — Relaxa que Fábio sabe menos coisa do que Luciana, pelo menos sabia. A gente precisa de um plano.

    — Depois dessa mão-de-obra toda não tem plano? E Luciana ainda quer me juntar contigo, sinceramente.

    — E ainda me perguntam por que eu não gosto de você… Fábio toca às oito, são dez pras seis. Imagino que ele vai sair da mesa pelo menos meia hora antes…

    — Eu não vou ficar mais de duas horas olhando pra tua cara, Jorge. Antes disso eu pulo no pescoço de Luciana e a gente vai daqui pra delegacia ou pro hospital… Tais de carro?

    — Sim. E pelo jeito da pergunta Luciana é a tua carona.

    — Foco na solução, Jorge. É só a gente dar um jeito de disfarçar e depois dá uma escapulida. Eu fico no bar e você finge que tá com dor de barriga.

    — Por que eu tenho que fingir que estou com cag… Dor de barriga? É só eu ir pro bar também, digo que quero ver a pianista de perto.

    — Nós dois no mesmo lugar e eles não vão tirar os olhos da gente. Vou voltar pra mesa, lá a gente pensa em alguma coisa.

    Meia hora se passou. Luciana e Fábio pediram sushi, Jorge não pediu nada e Cristina resolveu não tomar mais nada alcoólico. A tensão da mesa era crescente. Luciana e Fábio pareciam estar se divertindo muito com toda a situação, enquanto Jorge e Cristina estavam se sentindo feras enjauladas.

    — Jorge, já comeu desses sushis com camarão? — Perguntou Fábio. — Eu acho meio estranho.

    — Esqueceu que eu sou alérgico? Se eu colocar um camarão na boca já começo a ter reação.

    — Sério? — Perguntou Luciana genuinamente surpresa.

    Cristina olhou para Jorge. Quando ele olhou de volta ela indicou o camarão com os olhos. Ele fez “não” com a cabeça, ela fez “sim.

    — Sério, Luciana. Vê só — antes que alguém pudesse ver Jorge jogou um pedaço de camarão dentro da boca, mastigou duas vezes e cuspiu.

    Imediatamente a língua dele dobrou de tamanho, o rosto ficou vermelho e estava começando a inchar.

    — Meu Deus, Jorge! — Gritou Cristina da forma mais exagerada que ela pode. — Tá doido? A gente tem que te levar pro hospital.

    — Assho que ffffim — respondeu o pobre Jorge.

    — Me dá a chave do carro, eu te levo — disse Cristina. — Fábio precisa tocar e Luciana leva ele depois.

    Os dois se levantaram e saíram correndo. Antes que Luciana e Fábio pudessem entender tudo, Cristina já estava dando partida no carro. Jorge abriu o porta-luvas, sacou um tubo de plástico, tirou uma ponta e cravou na perna. O antialérgico tinha sido rápido o suficiente para salvar Jorge de um possível choque anafilático. Cristina se colocou no caminho de casa, pouco antes de chegar lá Jorge conseguiu falar.

    — Você só pode ser doida, Cristina.

    — Não te obriguei a fazer nada, Jorge, mas não vou ser injusta com você. Parabéns pela coragem.

    — Não pensei muito, dois segundos a mais de raciocínio e a gente ainda estaria lá — o nervosismo na voz dele era perceptível.

    — A gente precisa dar um jeito nisso, Jorge, a situação tá fora de controle.

    — Segunda-feira a gente pensa nisso, Cristina. Esse remédio já tá me deixando com um sono inacreditável. Me deixa em casa que eu te coloco num táxi ou pego meu carro na tua casa amanhã cedo.

    — Eu que não vou pagar táxi, acabei de salvar tua vida. Mereço no mínimo uma carona, com ou sem você no carro.

    — Então considere isso como o seu presente… Feliz dia dos namorados, Cristina.

    Antes que ela pudesse responder Jorge já estava dormindo. Um sorriso surgiu no rosto da moça. Ela dobrou uma esquina e parou em um posto de gasolina, pegou o telefone de Jorge e ligou para a mãe dele. Ele dormiu antes de dizer onde morava.

Contos de Segunda #44

 As peripécias de Luciana e Roberta para fazer Jorge e Cristina ficarem juntos não começou hoje. Esse conto é uma continuação dos Contos de Segunda#34 e Contos de Segunda #42.

   — Deixa eu ver se eu entendi direito. Vai rolar um ensaio do casamento do seu irmão. A banda do amigo de Jorge vai estar lá e você quer que eu apareça lá pra chegar nele? — Luciana aparentava uma confusão proposital.

    — É — respondeu Roberta mais concentrada no salmão defumado do que nas sutilezas da amiga.

    As duas não se falaram muito desde o dia em que Fábio confirmou que tocaria no casamento do irmão de Roberta. Um ensaio do casamento marcado em cima da hora fez as duas almoçarem juntas

    — Quem ensaia casamento em dia de segunda?

    — Alguém que não pode ensaiar outro dia — no ranking da atenção de Roberta, Luciana estava atrás do salmão e do celular.

    — Foco, Roberta, estamos discutindo coisa séria.

    — Nem tem muito o que discutir. Hoje você aparece comigo lá no ensaio e quando acabar tudo conversa com Fábio. Simples assim.

    — Preferia fazer isso no casamento do teu irmão.

    — Não sei se você sabe, mas Cristina estudou com Beto na faculdade e ela vai estar lá no casamento. Acabo de lembrar que ele estudou contigo também, mas até onde eu sei Beto não vai com a tua cara.

    — E daí?

    — E daí que esse seu plano só vai funcionar se ela não suspeitar de nada. Por que se ela sentir o cheiro dessa armação, vai cantar essa pedra pra Jorge e já era esse teu Game of Thrones versão cupido.

    Contra esse argumento Luciana não encontrou resposta além do silêncio. O relógio estava quase nas nove horas da noite quando ela e Roberta chegaram ao salão de festas. Os noivos já tinham combinado a trilha sonora da cerimônia e agora estavam ensaiando a valsa. Somewhere Only We Know seguido de Burnin’ Love. A banda de Fábio tinha um homem no vocal, mas uma voz feminina foi recrutada para ajudar na versatilidade da banda e permitir os duetos.

    — Acho que ainda vai demorar — Roberta analisava o relógio arrependida, devia ter comprado um maior.

    — Então é a nossa chance — Luciana já tinha analisado todo o ambiente.

    — De quê?

    — De chamar a atenção de Fábio, o que mais seria?

    — O cara tá trabalhando, Luciana. Tem umas cadeiras ali e…

    — Nada disso — Luciana rapidamente se posicionou atrás da amiga, colocou as mãos nos ombros dela e começou a empurrar. — A gente vai esperar um pouco, quando eles se prepararem pra repetir a música você vai ali cumprimentar seu irmão e vai aproveitar a deixa pra falar com Fábio e vai dizer que é amiga de Jorge. Isso vai chamar a atenção dele o suficiente pra ele dar uma olhada ou outra pra onde a gente estiver sentada, o resto é comigo.

    Elas precisaram esperar só um minuto. A música terminou. Beto e sua noiva estavam bem satisfeitos com a performance deles e da banda. Roberta aproveitou a pausa para se aproximar.

    — Caramba, Beto. Não pensei que essa valsa ia ficar tão boa. Obviamente não por causa da noiva, sempre confiei em você, Angela.

    — Eu também pensei que não ia rolar. Nem sei como te agradecer por ter conseguido a banda.

    — Não fiz nada, Jorge que conseguiu convencer a banda a aceitar o convite — ela se virou para a banda. — Boa noite, pessoal.

    — Boa noite! — Respondeu a banda em coro.

— Você deve ser Roberta? — A pergunta vinha do guitarrista.

— Sou eu. Falei contigo no telefone.

— Avise a Jorge que ele só não fica me devendo essa, por que se der certo a gente pretende aproveitar esse segmento matrimonial. Vai ficar pra ver o ensaio?

— Sim, tô ali com uma amiga. Comentei sobre essa história de vocês tocando no casamento e ela ficou curiosa — Roberta olhou pro relógio. — Olha só a hora, e eu aqui atrapalhando. Vou ficar ali até vocês terminarem.

O ensaio recomeçou. Uma dúzia de passos e Roberta chegou onde estava Luciana.

— Valeu, amiga. Agora é só ele agir como o previsto e tá no papo.

O plano de Luciana deu certo. Volta e meia Fábio dava uma olhada discreta para onde as duas amigas estavam. Luciana respondia com olhadas nem tão discretas para o guitarrista. Quando os olhares ficaram mais frequentes ela resolveu brincar com o ego musical dele. Luciana começou a cantar as músicas junto, depois começou a se mexer na cadeira e terminou puxando Roberta para dançar imitando os passos dos noivos. Fábio já estava com a guitarra dentro do case quando foi falar com as duas.

— Que bom que gostaram da música.

— Vocês são muito bons mesmo eu até…

— Tô apaixonada pelo som de vocês — interrompeu Luciana. — Você deve ser o amigo de Jorge, né? Luciana, prazer — A mão já estava estendida antes do “prazer” terminar de sair da boca.

— Fábio. Se gostou agora vai ficar impressionada no casamento, vão rolar umas surpresas bem interessantes.

— Eu não fui convidada, há quem diga que o noivo me detesta.

— Jorge também não fala muito bem de você.

Luciana corou. Todas as dezenas de respostas possíveis morreram ainda na garganta. Ela gaguejou e não saiu nada. Fábio abriu um sorriso.

— É uma pena que você não vai pro casamento, mas se quiser ouvir a gente tocar e estiver com a quinta-feira livre, é só dar uma chegada nesse bar aqui — Fábio sacou um folheto do bolso e entregou a Luciana. — Depois do show você me explica por que Jorge gosta tão pouco de você. Agora preciso ir pra não perder a carona. Até mais.

    Elas esperaram o guitarrista se afastar em silêncio. Luciana ainda estava corada quando Roberta falou.

    — Pois é, amiga. Parece que tudo deu certo. Fico impressionada com a tua capacidade de interpretação.

    — Tô achando que não foi bem isso, Roberta — as palavras saíram devagar da boca de Luciana. — Acho que essa história não vai ficar só com Jorge e Cristina.

Contos de Segunda #42

Os fatos narrados a seguir são uma continuação direta do Contos de Segunda #34 e tem relação direta com os eventos do Contos de Segunda #27, leia aqui a Parte 01 e a Parte 02.

Roberta estava impaciente. Fazia três semanas que ela tentava extrair uma informação muito importante: para qual amigo Jorge contava tudo da vida dele. Essa informação era vital para o plano de Luciana de juntar Jorge e Cristina. Roberta não entendia bem o por quê, mas concordou em ajudar. De fato teria ajudado, se Jorge não tivesse passado quase duas semanas viajando e tivesse voltado ao trabalho por tempo o suficiente para contrair zika, mas estaria de volta a partir daquela segunda-feira. Exatamente uma semana antes de Cristina voltar de férias e poder interceptar o plano. O problema era como fazer isso. Roberta estava perdida em pensamentos cupidoconspiratórios quando Luciana entrou na sala.

    — O boy de Cristina morreu? Volta mais não?

    — Bom dia pra você também, Luciana.

    — Eu aviso quando estiver bom — ela puxou uma cadeira para perto de Roberta e sentou.

— Três semanas, Roberta, três malditas semanas que não me renderam nada. Pensei que você e Jorge eram amigos o suficiente pra desenrolar fácil essa história.

— Faz três, como é mesmo? Malditas semanas que eu não vejo Jorge, e até onde eu sei, só encontro com ele aqui no escritório.

— Nem pra pescar no Facebook, Roberta?

— Depois que você começou com essa história ele desfez a amizade comigo, disse que não era nada contra mim, era por sua causa. Depois disso ele ativou opções de privacidade que nem Mark Zuckerberg conhece.

— Instagram?

— Jorge é tão inativo no Instagram quanto minha vó. Ela sempre espera um neto passar lá pra ajudar ela com os filtros.

— Nem Linkedin?

— Nem sei, não uso Linkedin.

    — Deve ter alguma coisa em algum lugar. E-mail ou celular… Isso, preciso do celular.

    — Ah, não. Não vou roubar celular de seu ninguém.

    — Deixa de ser dramática, Roberta. Esse vai ser o plano B. Se não der pra conseguir nada hoje, amanhã a gente tenta o celular.

    — A gente você, Luciana. Eu tô fora dessa de pegar celular dos outros.

    — Só não te digo umas verdades por que o boy já passou ali do outro lado e eu tenho uns cinco segundos pra sair sem ele me ver. Vê se consegue as coisas hoje, beijo.

    Poucos segundos depois Jorge entrou na sala. Ele parecia estar totalmente recuperado.

    — Bom dia, Roberta. Como ficaram as coisas aqui enquanto eu estava fora?

    — Melhor do que você imagina. Curtiu bem a zika?

    — O máximo que eu pude. Nos primeiros dias eu fiquei dormindo sem parar, só depois que eu consegui fazer alguma coisa. E os preparativos do casamento?

    — Meu irmão tá me deixando maluca, é pior que a noiva. Agora ele cismou que quer uma banda que toque só rock.

    — Um amigo meu é guitarrista. A banda dele é muito boa, toca todo tipo de rock. Se quiser eu passo o contato.

    — Sério?

    — Sério. Nunca vi ele dizendo que tocou em casamento, mas acho que ele topa. Se ele disser que não aceita, me avisa que eu converso com ele. Tenho alguns favores pra cobrar.

    — Ah, Jorge — o rosto de Roberta corou de leve . Nunca que eu ia te pedir pra fazer uma coisa dessas.

    — Fábio é quase meu irmão, pra mim ele desenrola essa guerra.

    — Valeu mesmo, Jorge.

    Roberta voltou para seu computador. Quando estava para voltar ao trabalho teve um estalo. Um detalhe que por pouco escapava. Foi quando a chama da conspiração se acendeu no seu peito. Ela pegou o celular, abriu o chat com Luciana e mandou uma mensagem.

    “Já tenho o nome do alvo.”

    “Só com o nome não dá pra achar.”

    “Nome e telefone. Depois eu explico melhor.”

    O pacto de cumplicidade acabava de ser selado. Roberta não gostava muito de fazer essas coisas… Mas agora não tinha mais volta.

Contos de Segunda #34

Os fatos narrados a seguir tem relação direta com os eventos do Contos de Segunda #27, leia aqui a Parte 01 e a Parte 02.

    O celular tocou de novo. Já era a quarta vez. O zumbido baixinho que o aparelho fazia não era suficiente para fazer Roberta acordar. Luciana sabia disso. Também sabia que Ned, o cachorro de Roberta, detestava o som do celular vibrando. Caso o celular passasse muito tempo vibrando, ele ficava com vontade de fazer xixi. Ned só fazia xixi na rua, então nesses momentos de desespero ele pedia ajuda à sua dona. Roberta não pôde negar o pedido do cachorro. Desceu vestindo as roupas de dormir, com uma cara amassada e os olhos ainda se acostumando com a claridade. Na frente do prédio uma moça a esperava encostada em um carro.

    — Até que enfim, faz um tempão que eu tô tentando falar contigo.

    — São cinco e meia da manhã, Luciana — respondeu Roberta. O sono ainda não tinha permitido que o cérebro da moça percebesse cem por cento do absurdo daquele momento.

    — Se você tivesse respondido minhas mensagens ou atendido minhas ligações, nenhuma de nós estaria aqui.

    — Eu só vim trazer Ned pra fazer xixi e… Ei, pera aí — finalmente ela tinha acordado. — Você deixou ele nervoso com a vibração do celular de novo?

    — Você podia ter atendido — disse Luciana de um jeito que pareceu mais um “não teve outro jeito”. — Preciso de ajuda.

    — Luciana, qualquer tipo de ajuda pode esperar até o horário comercial.

    — Que horror, Roberta. Eu aqui precisando e você me trata desse jeito?

    Roberta respirou fundo. Olhou para Ned que alegremente marcava o pneu do carro de Luciana. Olhou para o céu como se procurasse um sinal. Olhou para os próprios pés pra tentar criar coragem.

    — Vai, diz o que é.

    Luciana não conseguiu conter o sorriso.

    — Sabe que dia é hoje?

    — Segunda.

    — Sério, Roberta — disse ela fingindo estar ofendida. — Cristina entra de férias hoje.

    — E daí?

    — E daí que nós temos trinta dias para: número um, descobrir o que rolou com ela e o boy no fim do ano e número dois, ajeitar as coisas pra juntar os dois assim que ela voltar.

    — Ah, não. Nem venha, Luciana — Roberta sacudia as mãos. — Essa história já tá me deixando maluca. Deixa os dois se detestarem em paz.

— Que exagero, amiga. Eu conheço Cristina, ela quer o boy dela… Só não se ligou nisso ainda.

— E o que Jorge quer não conta?

— Ele é homem, Roberta. Não interessa o que ele quer.

— Ignorando essa parte. Qual o plano pra descolar a informação?

— Cristina não vai me contar nada. Já tentei de todo jeito, até soro caseiro da verdade ela tomou e não soltou a língua. A esperança é saber por Jorge, é aí que você entra.

— Ihhhhhhhh, nem invente. Jorge anda de péssimo humor e cada dia ele gosta menos dessa historinha que você espalha dele com Cristina.

— Não espalhei nada.

— Luciana, o estagiário que chegou semana passada entrou na sua sala por engano e voltou comentando o que tinha rolado entre Cristina e Jorge.

— Detalhes, detalhes. Eu tenho um plano perfeito pra conseguir matar dois coelhos de uma vez.

— Lá vem.

— Jorge e Cristina são muito parecidos. Cristina não consegue guardar tudo que acontece só pra ela. Ela sempre me conta tudo… Exceto o que aconteceu entre ela e o boy, mas isso é diferente. A gente precisa encontrar a pessoa pra quem ele conta as coisas e chegar no cara.

— Defina “chegar no cara”.

— Isso é comigo, sua parte é me mostrar o alvo.

    — Como não deve ter outro jeito, eu vou te ajudar, mas agora me deixa voltar pra cama. Só ajudo os outros em horário comercial.

    Luciana deu um pulo de alegria e abraçou a amiga. Entrou no carro e partiu. Deixando para trás a amiga sonolenta e seu cachorro mijão.

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