Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Mês: junho 2016

Contos de Segunda #45

Erick caçava dragões. “Caçava”, hoje em dia não caça mais. Além de ser muito perigoso, muitas vezes chato e normalmente solitário, o sindicato conseguia deixar tudo ainda pior. Por causa de um dragão ele deixou essa vida de caçar dragão. Isso fez Erick e o dragão em questão se tornarem grandes amigos… Mas não ajudou a pagar as contas. Diante da perspectiva de falência, Erick deixou sua amizade com o dragão de lado e partiu em busca de trabalho.

    Ultimamente alguns reinos estavam em guerra e todo mundo estava meio perdido. Muitos fazendeiros estavam sem fazenda, soldados sem exercito, cavaleiros sem cavalo e taverneiros sem taverna. Muitas dessas pessoas acabavam fugindo para os reinos que estavam em paz e para organizar toda essa massa de trabalhadores os sindicatos fundaram um órgão regulador. Na falta de nomes melhores, as pessoas que trabalhavam nesse órgão ficaram conhecidos como ministros do trabalho. Justamente para encontrar esses ministros que Erick viajou para uma das maiores cidades do reino.

    O sol mal tinha saído quando o ex-caçador chegou ao portão principal e quase uma centena de pessoas já aguardava na fila. Vendedores ambulantes circulavam nos arredores vendendo pães, maçãs e carne seca, em algumas barraquinhas próximas era possível comprar cerveja e vinho, Erick pediu uma caneca de cerveja escura para o desjejum. Depois de um tempo suficiente para as pessoas que aguardavam ficarem todas amigas íntimas a fila começou a andar. Levou quase duas horas para Erick finalmente ser atendido pelo ministro.

    – Saudações, rapaz – disse Erick observando o jovem franzino sentado do outro lado da mesa. Um pergaminho em branco estava na frente dele e uma pena em sua mão.

    – Saudações, senhor. Em que posso ser útil?

– No momento procuro por um trabalho. Digamos que mudei de ramo recentemente e estou… Como posso dizer… Um pouco desinformado sobre as opções de ofício para um homem com as minhas habilidades.

O rapaz molhou a pena e se preparou para escrever.

– Como te chamas, senhor?

– Erick. Sem sobrenome, apenas Erick.

– Ocupação anterior, Erick?

– Eu caçava dragões.

O ministro levantou uma sobrancelha e encarou Erick por um instante. O couro do colete que ele usava sobre a camisa, a pele bronzeada, a queimadura no rosto e a cicatriz na testa confirmavam o que ele dizia.

– Entendo… – o jovem começou a escrever no pergaminho. – Quantos anos de experiência, Erick?

– Cinco anos de treinamento e serviço na sede do sindicato, três anos como caçador auxiliar operando catapultas e balistas e mais quatro como caçador titular, sendo um ano caçando totalmente sozinho.

– Tem familiaridade com quais tipos de arma, Erick? – A pena corria ligeira sobre o pergaminho.

– Espada, longa e de duas mãos, arco longo e de caça, martelo, mangual, machado de arremesso, lança de arremesso e longa. Minha especialidade é combater usando escudos de qualquer tamanho.

– Tens equipamento próprio, Erick? – A pena continuava frenética sobre o papel.

– Sim, é… Uma espada, um escudo revestido de couro de dragão, uma armadura leve feita com as escamas mais duras e uma cota de malha. Também tenho uma catapulta que pode ser convertida em balista, os documentos e a manutenção estão todos em dia.

– Alguma pendência com o sindicato?

– Creio que não. Meu desligamento ocorreu sem problemas.

– Sabes ler, Erick?

– O suficiente para entender as placas da estrada e as mensagens simples dos cartazes da cidade.

– Alguma habilidade adicional digna de nota?

– Trabalho bem com couro, principalmente de répteis, tenho bom senso de orientação, consigo viver durante longos períodos em regiões ermas. Sou acostumado a ambientes com temperaturas elevadas, toco alaúde e não tenho problemas de visão.

– Excelente – o ministro escreveu mais algumas linhas, parou e encarou o que estava escrito antes de continuar. – Erick, tuas opções são bem limitadas. Caso não queiras caçar outro tipo de fera, pode ajudar no treinamento dos patrulheiros da cidade. Nossos homens de armas mais habilidosos foram convocados para a fronteira por causa da eminência da guerra e os que patrulham a cidade têm pouca habilidade. Soube que os mercenários estão arrendando armas de cerco, caso esteja interessado. Nossos artesãos de couro não costumam ter uma demanda alta, mas nossos ferreiros costumam pagar bem para ajudantes que não desmaiam com o calor. Talvez alguém queira um guarda-costas, mas isso não posso garantir – o jovem derreteu um pouco de cera sobre o pergaminho e marcou com o anel. – Apresenta este documento quando procurares por trabalho. Tenha um bom dia e boa sorte na tua nova vida profissional.

Erick pegou o documento e saiu. A fila atrás dele parecia ainda maior, já passava e muito dos portões da cidade. Tantas pessoas procurando um rumo na vida deixaram o ex-caçador pensativo. Talvez ele seguisse alguma das indicações do ministro do trabalho, talvez seguisse todas, mas a vontade que tinha era de não seguir nenhuma delas. Pensou no que tinha conquistado até ali, no que tinha conseguido juntar para si e o que podia deixar de herança para seus possíveis filhos. Lembrou com uma certa saudade dos tempos antes da caça aos dragões. Lembrou de como era viver com a família cuidando de uma taverna e de como ele se imaginava fazendo aquilo no futuro… Ao lembrar daquilo Erick percebeu o que precisava fazer.

No outro dia ele retornou para a fila. Ficou nela desde o amanhecer até o sol se pôr. Chegou inseguro, passou o dia sorrindo e voltou para casa satisfeito. Ele passou o dia empurrando um carrinho com um panelão de ensopado. Por duas moedas a tigela era acompanha por meio pão, por três o freguês levava um pão inteiro e uma tira de carne seca de brinde e por dez era possível levar para casa uma escama de dragão como souvenir.

Aniversário de Bikini #1

3 de Junho de 2015. Naquela quarta-feira eu coloquei um sonho no ar. Foi naquele dia que a primeira postagem do Cachorros de Bikini foi publicada. O tempo foi passando, mais coisa foi sendo publicada e eu já estava achando uma pena não publicar um texto exatamente no dia do aniversário do blog. Aí eu olho no calendário e, graças à magia cabalística do ano bissexto, o 3 de Junho de 2016 caiu na sexta-feira…

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É engraçado pensar em como ter um blog mudou a minha vida. A responsabilidade de publicar alguma coisa três vezes na semana e a decisão de levar um projeto tão descompromissado com o máximo de seriedade acabaram transformando a minha rotina. A exemplo daqueles que vivem pra chegar na sexta-feira, os meus sete dias semanais se transformaram em três. Não é raro passar o fim de semana pensando no conto de segunda ou a terça-feira inteira pensando no texto de quarta. Preocupação com postagem que tá quase atrasando, tensão por um tema promissor estar virando um texto ruim e todos os malabarismos que eu fiz pra salvar esses textos. Tudo isso feito com a maior satisfação do mundo. Mas esse texto tá ficando muito sério. Hoje é dia de festa. Dia dos nossos queridos cachorros apagarem as velinhas e caírem com tudo pra cima do bolo.

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Um ano atrás eu escrevi “Bem Vindo ao Cachorros de Bikini”. 366 dias, 134 posts e dois hiatos depois eu me sinto exatamente do mesmo jeito. Eu ainda espero que ao entrar você deixe as coisas sérias da vida na porta e desfrute de um momento repleto das banalidades cotidianas e das coisas mais irrelevantes da vida. Ainda estamos longe de ser o melhor blog do universo, mas já somos o melhor blog com nome de caninos em roupas de banho que publica toda segunda, quarta e sexta e não tem o menor compromisso de falar sério ou de mudar a vida de ninguém. Parabéns, Cachorros de Bikini. Muitas felicidades, muitos anos de vida e todas aquelas coisas clichê que todo mundo deseja nos aniversários. Apague a vela e faça um desejo, mas não conte a ninguém ou não vai se realizar.

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Poucos

Existem algumas vantagens em ser um escritor com poucos leitores. A principal delas é que não tem muitas pessoas pra decepcionar com aquilo que você escreve.

    Não tenho certeza de quantas pessoas já leram meus textos, os poucos publicados antes e os vários publicados depois da criação do Cachorros devem ter atingido algumas poucas centenas de pessoas numa projeção muito otimista. Porém o feedback que eu recebo sobre aquilo que eu coloco no papel, ou publico por aqui, vem de um grupo bem restrito. Meus leitores regulares são todos conhecidos. Uns são amigos de longa data, outros de uma data nem tão longa assim, mas todos dedicam um pouco do seu precioso tempo pra me ajudar a escrever alguma coisa decente. Eles são poucos, são meus amigos, mas nem por isso cobram menos de mim.

    Quantas vezes eu já fui intimado a produzir mais coisas novas. Outras tantas me cobraram a publicação de um ou de outro texto ainda em fase de revisão. Fora as vezes em que eu recebo um “Esse tá legal, mas não tá melhor que aquele outro” por um texto que consumiu horas pra ser escrito e revisado ou ainda um “Essa é a melhor coisa que você escreveu” por um texto ainda inacabado. Isso sem contar os comentários do tipo “Queria que tivesse mais coisa, acabou rápido” ou o tão temido “Isso daria um livro, escreve mais”.

    Fico pensando nos escritores que vendem milhares de livros e na forma feroz como são cobrados pelos seus leitores. Muita gente pra atender e muita gente pra decepcionar. Espero o dia em que serei cobrado por desconhecidos e decepcionarei pessoas que eu nunca vi mais gordas. Enquanto não chega esse dia continuo aqui, escrevendo pros que colocam os olhos nos meus rascunhos e apontam os defeitos que eu não consigo ver. Pessoas que aguardam as versões finais como se esperassem pelo ultimo capítulo da novela. Que comentam o bom e o ruim sem reservas e reclamam dos finais que os enche de curiosidade.

    Para esses poucos eu digo: “Um dia sai”, “Falta sentar e escrever”, “Não sei o que fazer com ele no final”, “Ainda não sei como colocar no papel”, “Falta revisar”, “Escrever um livro dá muito trabalho” e por último, mas não menos importante, eu digo “Obrigado”.

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