Não é um blog sobre cachorros e bikinis

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Contos de Segunda #55

    Vocal se mudou para uma casa nova. Na prática não existia a “casa velha” já que ela morava no mesmo apartamento de cinquenta metros quadrados desde sempre e pela primeira vez ela moraria em um lugar onde arrastar os móveis não acordava o bebê do vizinho ou que ouvir música sem fones de ouvido era uma espécie de crime, mas a melhor parte dessa mudança tinha relação com a banda. Finalmente as 4 Ladies teriam um lugar para ensaiar.

O antigo dono da casa era uma espécie de artista plástico e o local do antigo ateliê receberia um revestimento acústico e seria transformado em um estúdio. Custaria um ano de mesada de cada uma das integrantes da banda, seriam cinco anos, mas Baixo tinha uma mesada bem mais gorda do que as amigas. Amigas que não demoraram a chegar. O revestimento acústico só estaria instalado na semana seguinte, mas elas já estavam levando os equipamentos.

— Tu devia trazer tuas coisas sozinha, Bateria — reclamou Guitarra. — Minha guitarra e meu cubo já são muito pesados.

— A culpa não é minha — rosnou Bateria. — E para de reclamar que teu cubo tem rodinhas e tu nem pegasse nada muito pesado.

Guitarra estava com sua guitarra presa nas costas, o amplificador era puxado pela mão esquerda e a direita levava uma das peças menores da bateria.

— Cada uma devia cuidar do seu equipamento — rebateu Guitarra.

— Ela é quinze centimetros mais baixa e pelo menos dez quilos mais leve que a gente, Guitarra, ela ia demorar muito pra levar tudo sozinha — argumentou Baixo, ela levava o baixo nas costas e o bumbo da bateria. — Ainda demos sorte de arrumar uma kombi pra trazer as coisas pra cá.

— Isso mesmo, cala a boca e ajuda — completou Bateria. — Ou pelo menos para de atrapalhar.

— Vocês mal chegaram e já estão brigando? — Perguntou Vocal saindo do portão da frente.

— Gostei da casa, Vocal, parece que o tempo de morar num ovo acabou — elogiou Guitarra.

— Agora o plano de ter um cachorro vai sair do papel? — Perguntou Baixo.

— Só não vai rolar de chamar de Elvis — respondeu Vocal fazendo uma expressão desapontada. — É o nome do cachorro da vizinha.

— Tá, Tá. Casa bonita, muito legal, parabéns pros teus pais, mas vai ali pegar as coisas que o dono da kombi quer ir embora — interrompeu Bateria.

— Já vou, já vou. Tem uma porta lá nos fundos da casa, é só entrar por lá e armar as coisas — instruiu Vocal.

Meia hora depois o equipamento estava ligado. A bateria estava montada e uma gambiarra pouco confiável garantiu a eletricidade para os amplificadores.

— Acho que ninguém vai se incomodar se a gente tocar agora, né? — Perguntou Vocal já sabendo da resposta das amigas.

— A gente carregou tudo isso em uma kombi velha que fedia a ração de cachorro e não tinha os bancos — explicou Guitarra. — Não existe essa dúvida sobre tocar ou não.

— Eu quero dar o meu “oi” pros vizinhos — disse Bateria com uma piscadela. — E muito se engana quem pensa que eu coloquei um short só pra desfilar minhas pernas na rua.

— Vamos tocar a música nova — disse Baixo. — Guitarra, lembra de entrar depois que eu fizer a introdução uma vez, Vocal se liga de entrar depois do solo. Beleza? Bateria, conta quatro.

Uma, duas, três, quatro vezes as baquetas se bateram e a música começou. Rápida e agressiva. Os quatro corações acelerados batiam no ritmo da música, na sintonia perfeita que as quatro só tinham quando estavam juntas. Pelo menos até a poesia do momento ser interrompida. Do nada um cachorro atravessou a janela do antigo ateliê e caiu bem no meio do ensaio.

— O que foi isso? — Gritou Guitarra.

— Foi um cachorro, olha lá — disse bateria apontando para o pobre animal.

— Elvis! — Exclamou Vocal.

O pobre cachorro da vizinha parecia apenas parcialmente consciente. Ele corria em círculos furiosamente, rosnando e latindo. Ele estava quase lembrado do desejo destruidor de rasgar alguém com os dentes quando ele ouviu uma melodia que o fez parar. Baixo estava executando uma linha melódica de uma beleza que deixou até suas companheiras de banda surpresas. Poucos segundos depois Elvis estava paralisado, não demorou muito e ele caiu desacordado. Baixo colocou o seu baixo de lado, pegou o cachorro no colo e disse:

–Vou levar ele em casa e já volto.

Contos de Segunda #54

Elvis detestava o mês de Agosto. Em Agosto ele se sentia estranho, agressivo, impaciente e qualquer coisa incomodava de forma inacreditável. Também era o mês em que nada fazia muito sentido dentro da cabeça dele. Comer coisas que normalmente não eram comestíveis, acordar em locais onde ele não dormiu e agir antes de pensar eram a rotina de Elvis no mês oito do ano.

Elvis era um cachorro e no mês de Agosto ele ficava louco. Mas houve um Agosto em especial em que ele ficou muito mais louco que o normal.

Elvis morava em uma casa. O bairro era tranquilo, distante do centro, cheio de pessoas idosas.  Era. Até uma bela manhã de agosto em que os novos vizinhos chegaram. A família era composta por um homem, uma mulher e a filha do casal. A família parecia normal, Elvis estranhou a maquiagem pesada e as roupas pretas da filha, mas devia ser algo da moda. No meio da tarde chegaram mais três garotas com roupas parecidas. Elvis começou a achar que todas as jovens humanas se vestiam daquele jeito e, aparentemente, elas viviam se mudando, essas também carregavam um monte de caixas de formatos diferentes. Meia hora depois começou.

Elvis nunca tinha ouvido nada tão perturbador. Se ele pudesse definir provavelmente chamaria aquilo de sinfonia do demônio. A raiva crescia, o coração disparou, a saliva se virou em espuma  e um rosnado gutural quase alienígena brotava da garganta. O pobre animal tremia de raiva. Aquilo precisava parar, ele precisava fazer parar. A raiva não deixou o coitado raciocinar o suficiente para encontrar uma forma engenhosa de chegar à casa ao lado. Ao perceber que a sua dona estava abrindo a porta ele saiu em disparada, fez uma curva de noventa graus e, só Deus sabe como, atravessou a cerca viva, penetrando o terreno vizinho. Agora ele precisava achar a fonte do maldito som.

Depois de correr furiosamente algumas vezes ao redor da casa, Elvis descobriu uma pilha de caixas que o levaria até uma janela alta por onde o maldito som vazava como uma erupção do inferno. Ele tomou distância, correu em velocidade máxima, escalou as caixas e voou pela janela. Tudo depois disso é um borrão. As únicas coisas das quais ele lembra é de ser abraçado por braços magricelos e de um som muito agradável. O som grave de um instrumento musical que silenciou as vozes agitadas de jovens humanas. Depois disso ele acordou, estava em casa e não havia nenhuma música tocando.

Aniversário de Bikini #1

3 de Junho de 2015. Naquela quarta-feira eu coloquei um sonho no ar. Foi naquele dia que a primeira postagem do Cachorros de Bikini foi publicada. O tempo foi passando, mais coisa foi sendo publicada e eu já estava achando uma pena não publicar um texto exatamente no dia do aniversário do blog. Aí eu olho no calendário e, graças à magia cabalística do ano bissexto, o 3 de Junho de 2016 caiu na sexta-feira…

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É engraçado pensar em como ter um blog mudou a minha vida. A responsabilidade de publicar alguma coisa três vezes na semana e a decisão de levar um projeto tão descompromissado com o máximo de seriedade acabaram transformando a minha rotina. A exemplo daqueles que vivem pra chegar na sexta-feira, os meus sete dias semanais se transformaram em três. Não é raro passar o fim de semana pensando no conto de segunda ou a terça-feira inteira pensando no texto de quarta. Preocupação com postagem que tá quase atrasando, tensão por um tema promissor estar virando um texto ruim e todos os malabarismos que eu fiz pra salvar esses textos. Tudo isso feito com a maior satisfação do mundo. Mas esse texto tá ficando muito sério. Hoje é dia de festa. Dia dos nossos queridos cachorros apagarem as velinhas e caírem com tudo pra cima do bolo.

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Um ano atrás eu escrevi “Bem Vindo ao Cachorros de Bikini”. 366 dias, 134 posts e dois hiatos depois eu me sinto exatamente do mesmo jeito. Eu ainda espero que ao entrar você deixe as coisas sérias da vida na porta e desfrute de um momento repleto das banalidades cotidianas e das coisas mais irrelevantes da vida. Ainda estamos longe de ser o melhor blog do universo, mas já somos o melhor blog com nome de caninos em roupas de banho que publica toda segunda, quarta e sexta e não tem o menor compromisso de falar sério ou de mudar a vida de ninguém. Parabéns, Cachorros de Bikini. Muitas felicidades, muitos anos de vida e todas aquelas coisas clichê que todo mundo deseja nos aniversários. Apague a vela e faça um desejo, mas não conte a ninguém ou não vai se realizar.

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