Desde os tempos mais primórdios o ser humano sonha, imagina e fantasia. E dos sonhos, imaginações e fantasias nasceram todos os tipos de seres. Mas nem tudo que o ser humano imaginou era coisa nova, muitas vezes coisas mundanas ganharam personalidade, forma, rosto e voz. E a força do imaginário humano fez nascer um tipo diferente de ser. Seres ligados a coisas naturais, terrenas, comuns, mundanas. Foi da mente dos homens que nasceram as Damas.

    Ao longo dos anos as Damas foram mudando. Não eram mais a Chuva, a Lua ou a Floresta que nasciam da imaginação dos homens. A Guerra, a Fome e a Justiça vieram depois. O tempo continuou passando e as Damas continuaram nascendo. Recebendo personalidade, forma, rosto e voz do imaginário mortal. Foi assim que nasceu Segunda, uma das cinco Damas da Semana. Apesar de satisfeita com seus poderes, de ter um dia dedicado só pra ela e de ser a líder das Cinco, ela ainda tinha um problema. Toda Dama precisa de um Cavaleiro. Das Cinco só Segunda que não tinha um, e isso estava preocupando a Mãe-de-Todas. Foi isso que levou Segunda à presença da Mãe naquele início de semana.

    Só uma Dama pode atravessar as portas para o Salão da Mãe. Onde a Dama da Lua observa o globo terrestre de seu trono prateado.

    — Saudações, Dama da Lua. Fonte de tudo que é bom e mãe de todas nós — Segunda fez uma reverência.

    — Pensei que atenderia mais rápido ao chamado, Segunda-Feira.

    — Só posso chegar ao Salão da Mãe quando estou com todos os meus poderes, Dama-Mãe, ou quando estou junto com minhas irmãs.

    — Poderia tê-las chamado, não és a líder das Cinco? Suas irmãs não te negariam esse favor.

    Provavelmente negariam. O chamado da Lua chegou na quinta-feira. As gêmeas, Quinta e Sexta, decidiram que todas as irmãs precisavam cair na farra. Com sorte elas encontrariam um candidato para ser o Cavaleiro que Segunda-Feira precisava. Esse tipo de plano normalmente acabava frustrado, Segunda sabia estragar prazeres, era um dos poderes que ela mais gostava de possuir.

    — Talvez… Mas eu já sei qual o assunto e… — Ela olhou para baixo encarando os próprios pés. — Não é tão urgente assim.

    — Como pode não ser urgente, jovem Dama? Sabes bem o que acontece com uma de nós quando não existe um Cavaleiro.

    — Eu sei, eu sei, mas… Dizem que a insanidade pode demorar muito pra aparecer, ainda tenho tempo.

    — Não é só isso que me preocupa, pequenina. Teus poderes podem ficar fora de controle bem antes de qualquer sinal de insanidade. Uma Dama descontrolada é um dos maiores perigos do universo.

    — Eu sei, eu sei, mas Mãe… Eu não consigo encontrar um candidato.

    — Seria mais fácil se tuas vestes estivessem de acordo — Lua apontou para sua filha. Enquanto a Mãe-de-Todas vestia um longo vestido branco que brilhava como a lua cheia e adornos feitos pela Noite em seus cabelos prateados, Segunda usava um casaco, cachecol e botas de inverno, uma touca de lã e óculos grandes de armação grossa.

    — Mãe, eu vivo no mundo mortal, preciso me misturar com eles. Todas as Cinco usam roupas mundanas.

    — Mas tuas irmãs não escondem a nossa beleza feérica debaixo de tantos tecidos, nem cortam os cabelos tão curtos e o que é isso no teu rosto?

    — Óculos…Já nasci com eles.

    — Pelo menos poderias optar por um modelo que valorizasse teus olhos, minha querida… E quanto ao candidato? O que esperas de um candidato a Cavaleiro?

    — Ah, Mãe, sei lá… Atualmente só queria que meu Cavaleiro não quisesse cortar os pulsos depois de acordar numa segunda-feira.

    — Ninguém tem tal desejo, filha.

    — Mãe, os meus poderes vêm da aversão que os mortais têm pelo meu dia. Os resmungos, queixas e reclamações dos humanos me dão tanta energia que nem Sexta em semana de feriadão consegue rivalizar com minha força. Eu não sou líder das Cinco por acaso.

    — Então basta encontrar esse mortal que não tem tal desejo, um que não resmungue ou reclame do teu dia. Ache este mortal e terás um Cavaleiro.

    — Muito fácil pra senhora dizer, nunca faltaram Cavaleiros da Lua, mesmo depois que o primeiro Cavaleiro partiu.

    — Calada, Dama da Segunda-Feira — os olhos da Lua se estreitaram de fúria, a sala ficou gelada e escura, apenas a luz da Mãe iluminava o ambiente. — Como ousa se dirigir a mim nesse tom — o ar ficou mais pesado, se Segunda não estivesse com todos os poderes, certamente seria esmagada. — Existem mais mortais na Terra do que podemos contar, volte, procure algum que se encaixe, peça ajuda às suas irmãs. Todas elas, a partir de hoje, têm o dever de ajudá-la nessa busca. AGORA VÁ!

    A luz da Mãe-de-Todas cegou Segunda por um instante. Quando os olhos recuperaram a visão ela estava no meio da rua, em uma calçada de um centro movimentado. O celular tocou no bolso do casaco. Um lembrete da hora da próxima aula. Seus alunos estavam esperando.