Quando Marcio repousou sua cabeça no travesseiro na noite do domingo ele estava feliz da vida. Afinal o dia seguinte seria um feriado e feriado em dia de segunda virou raridade nos últimos tempos. Por isso a segunda-feira de Marcio seria dedicada única e exclusivamente à preguiça.

Um plano infalível já estava traçado. Ele dormiria até tarde, ainda na cama começaria sua maratona de episódios acumulados das séries que acompanhava. Perto da hora do almoço ele finalmente levantaria da cama para pedir o almoço num restaurante próximo de casa. Como o dono era chinês, o estabelecimento não fechava dia nenhum e, apesar de não ter serviço de entregas, o restaurante entregava em qualquer lugar onde o pobre faz-tudo conseguia ir e voltar  a pé em menos de vinte minutos. Depois do almoço terminaria o livro que estava encostado há meses  e logo depois ligaria o video game e só desligaria para jantar os restos do almoço. Antes de dormir ele assistiria a novela infantil da vez, coisa que ele faz escondido de todo mundo. Assim acabaria o feriado, estava no plano, não tinha como dar errado.

Tinha. Sempre tem. Tanto é que teve.

O despertador tocou às cinco e meia como em todos os outros dias. Marcio pulou da cama e conseguiu desligá-lo cinco segundos depois. Conseguiu voltar a dormir, mas acordou uma hora depois com o som de um acidente de transito na rua onde morava. O som da cantoria dos pneus ativou uma memória quase suprimida de quando ele quase fora atropelado. A quantidade de adrenalina descarregada no sangue foi o suficiente para eliminar os últimos restos de sono que ainda resistiam. Ele teria que pular para a segunda parte do plano e iniciar a maratona de séries.

A maratona começou bem. A sequência de seis episódios só foi interrompida pela fome. Fome que foi bem difícil de matar, já que Marcio estava porcamente munido de provisões. O resultado foi a mistura de restos de várias coisas meio velhas que estavam na geladeira, tudo empurrado pra baixo com um copo de leite que não parecia estar muito dentro do prazo de validade. A maratona teria voltado com força total, mas um poste fora danificado no acidente que aconteceu mais cedo, a energia estava caindo a cada dois minutos. O término do livro teria que ser adiantado.

A satisfação de finalmente cumprir com perfeição uma das partes do plano foi enorme. Dois capítulos excelentes fechando a trama e dando espaço pra uma continuação que já estava confirmada. Já era hora do almoço. O telefone do restaurante tocou duas vezes antes de ser atendido, mas não haveriam entregas naquele dia, o faz-tudo estava no hospital. O mesmo carro que atropelou o poste na rua de Marcio havia atropelado o pobre rapaz dois quarteirões antes.

Diante dessa quantidade cavalar de infortúnios o plano foi abandonado. Marcio partiu a pé para a casa da mãe, já que o portão da garagem do prédio não abria por falta de energia. Os sobrinhos estavam lá e sua mãe sempre fazia um almoço bom quando ele aparecia. Ele acabaria jogando damas com o pai e jogaria conversa fora com a irmã. Talvez quando ele voltasse o poste estivesse consertado. Talvez não fosse possível jogar video game, mas ainda desse para ver a novela.

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