O conto a seguir é uma continuação direta da história de Maurício. Se quiser conhecer melhor as aventuras do nosso sobrevivente do fim do mundo basta clicar nos links dos Contos de Segunda #2 e #22.

O mundo acabou e continuou tão ruim quanto antes. De um jeito diferente, mas ainda era ruim. Era isso que Maurício pensava sempre, pelo menos até um dia desses. Ele tinha engolido uma pilha palito radioativa e sofrido uma espécie de mutação. Os olhos se tornaram totalmente verdes e os cabelos pareciam ter se transformado em uma espécie de tentáculos, as unhas ficaram pretas e a pele começou a acumular eletricidade. Ninguém sabia ainda. Nem ele mesmo sabia bem o que estava acontecendo, mas por via das dúvidas decidiu manter o segredo.

Maurício disfarçou a mutação durante um bom tempo. Sempre usando chapéu ou capuz para esconder os cabelos e óculos escuros para esconder os olhos. A parte boa do disfarce é que ele funcionava, a parte ruim é que ele estava vestido igual aos punks saqueadores que apareceram durante a revolta das máquinas, que aconteceu na sexta-feira da semana em que o mundo acabou. Os punks saqueadores não eram vistos desde que as máquinas foram destruídas, mas eles tinham uma rixa antiga com os arruaceiros matadores de zumbis. Os mesmos arruaceiros que Maurício encarava sempre que ia trabalhar. Os arruaceiros estavam cada dia menos propensos a fazer arruaça, mas continuavam odiando mortalmente os punks saqueadores ou qualquer um que parecesse com eles.

Um belo dia ele foi cercado por cinco deles. Eles pareciam muito mal humorados e não quiseram conversar muito. Eles usavam armas simples, barras de ferro, facas e correntes. Foi uma corrente que enroscou no braço de Maurício quando o primeiro arruaceiro atacou. Toda a eletricidade acumulada na pele saiu pela corrente atingindo o pobre atacante com um choque violento. Maurício se sentiu fraco por um instante, mas não teve tempo para se recuperar, os outros arruaceiros atacaram.

Eles pareciam se mover em câmera lenta. Uma brecha no círculo, a rota de fuga perfeita. Maurício já estava fora do alcance dos seus adversários antes que pudesse notar. Agora eles se moviam normalmente, e pareciam muito zangados. Um deles puxou um apito e soprou com força. Vários outros arruaceiros matadores de zumbi começaram a aparecer de todos os lados. Fugir era sua única chance, então ele começou a correr. Foi quando uma arma disparou. A perna foi acertada de raspão, Maurício começou a mancar o mais rápido que pôde. Mais tiros e gritos de vários homens e mulheres que não pareciam nada contentes.

“É o fim”, pensou Maurício, “Sobrevivi aos zumbis, às máquinas, às armas nucleares, aos terremotos, ao fim da internet, e vou ser morto por um bando de arruaceiros”. A perna doía cada vez mais, apesar de mancar numa velocidade pavorosa, os matadores de zumbi estavam se aproximando. “A ponte!”, pensou Maurício. Se ele conseguisse atravessar na tirolesa estaria livre. Suas esperanças foram pelo ralo quando ele viu a quantidade de gente que estava na fila. O cabo da tirolesa estava partido, ninguém poderia atravessar. Os arruaceiros estavam chegando. Não havia muito tempo, não havia saída.

“Que se dane, esse mundo já acabou mesmo”, foi o que Maurício pensou antes de correr até a beirada da grande fenda que antes dos terremotos era um rio. Ele não hesitou. Se jogou de braços abertos. Caiu no abismo. Abraçou a escuridão.

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