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Contos de Segunda #37

Fernanda estava com um humor péssimo. O papagaio do vizinho começou a gritaria às quatro da manhã, exatamente três horas antes do despertador de Fernanda tocar. O maldito papagaio costumava fazer esse tipo de coisa, mas nunca tão cedo. Depois de falhar miseravelmente em voltar a dormir Fernanda resolveu antecipar sua corrida noturna. Chegou na rua, ligou a música e colocou os fones de ouvido. Depois de quinhentos metros a música parou. O player ainda reproduzia a música, mas nada de som. Ela experimentou tirar o fone, a música voltou. Ao colocar o fone novamente a música parou. Depois de algumas tentativas Fernanda desistiu, o fone de ouvido só funcionava com o rádio e o jeito foi correr ouvindo o noticiário policial com as noticias da madrugada.

    Depois da corrida desastrosa não foi difícil chegar cedo no trabalho. Ela ligou o computador e conectou os fones de ouvido. Aparentemente eles estavam funcionando perfeitamente. O dia prometia ser tranquilo e sem muitos aborrecimentos. Tudo que Fernanda precisava fazer era não tirar os fones do ouvido. Ela tinha começado recentemente no emprego e um dos seus colegas de sala produzia inúmeros barulhos praticamente insuportáveis. O teclado fazia muito barulho, o scroll do mouse rangia, as rodinhas da cadeira arrastavam no piso e ele tinha um pigarro eterno. Mas tudo isso era barrado, ou pelo menos minimizado, pela ação do fone de ouvido e pela biblioteca de música praticamente infinita do serviço de streaming. Era só carregar a página de um artista ou banda com uma discografia grande, fazer a lista de reprodução e tudo ficaria bem… Mas não ficou.

    “Erro Tente Novamente Mais Tarde”. Foi o que apareceu na tela quando ela tentou acessar a página de um artista. Tentou com outro, mais um, uma banda. “Erro Tente Novamente Mais Tarde”. O sangue de Fernanda começou a esquentar, de repente os 14,90 que ela pagava na assinatura do serviço pareceram uma quantia exorbitante. Tentou o player web, depois pelo aplicativo do celular. “Erro Tente Novamente Mais Tarde”. O colega barulhento chegou mascando chiclete, da forma mais ruidosa e babada que um ser humano poderia mascar um chiclete. Fernanda já estava trincando os dentes, mas antes de perder completamente a calma ela se conformou em passar o dia ouvindo rádio. Como todas as rádios legais da internet eram bloqueadas pelo servidor, ela teve que se conformar com as rádios FM’s normais, com todas aquelas músicas repetidas e intervalos comerciais sem fim.

    Chegou em casa cedo desejando comer e dormir. Depois de comer um pedaço da lasanha do almoço de domingo ela estava pronta pra cair na cama… Quando o papagaio começou a gritar. Uma, duas, três horas. Já passava das 22h e o papagaio ainda berrava. Fernanda decidiu agir. Pegou uma faca, colocou entre os dentes, saiu pela janela da área de serviço, escalou um pedaço da fachada, cortou a tela de proteção e entrou na área de serviço do vizinho, lá ela encontrou o papagaio. Ela olhou furiosa para a ave tresloucada. Os gritos aumentaram. Ela pegou o bicho pelo pescoço e desceu a faca em um golpe vertical… Arrebentando a corrente que prendia o papagaio no poleiro. Ela levou o bicho seguro pelo pescoço até o quarto onde o vizinho dormia com sua esposa. Abriu a porta, jogou o papagaio dentro, fechou a porta e habilmente usou a faca para inutilizar a fechadura. Voltou para a área de serviço, desceu um pedaço da fachada até chegar em casa. Caiu na cama e dormiu bem como jamais dormiria outra vez na vida.

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  1. Lucas Nery

    Não tem como eu não gostar de um conto sobre barulhos irritantes e com justiça sendo feita no final.

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