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Contos de Segunda #52

Aluísio tinha uma relação muito particular com a segunda-feira. Praticamente todas as coisas importantes da vida dele aconteciam no primeiro dia da semana. E dessa vez não poderia ser diferente.

    Era a primeira segunda-feira de Agosto. Agosto era uma espécie de 29 de Fevereiro em doses homeopáticas. Só que no lugar de coisas ruins, eram as coisas improváveis que aconteciam. Aluísio tinha acabado de estacionar o carro no estacionamento do escritório quando o telefone tocou, o número era de Amélia, sua esposa grávida de sete meses, mas a voz do outro lado era do enfermeiro que estava com ela na ambulância. O barulho da sirene e dos gritos da esposa não deixaram Aluísio entender absolutamente nada do que o enfermeiro disse, mas ele não precisava ser um gênio para entender que o bebê ia chegar mais rápido do que o esperado.

    Pulou dentro do carro e virou a chave no contato… Nada. O carro não pegou. Tentou mais uma, duas, três vezes e nada. Sem tempo para uma chupeta na bateria, Aluísio foi pra rua atrás de um táxi. Foi quando lembrou que os taxistas estavam protestando contra os motoristas de um certo aplicativo que estava teoricamente roubando seus passageiros. O jeito foi baixar o maldito aplicativo e chamar um motorista que não estivesse protestando. O tal motorista chegou em dez minutos e antes de ter a chance de oferecer uma água, uma jujuba ou um chocolate, foi metralhado pelo endereço do hospital e uma dúzia de indicações de como chegar lá. Antes que o motorista pudesse puxar qualquer tipo de conversa sobre o tempo, a política ou o Campeonato Brasileiro, Aluísio já tinha avisado a pelo menos vinte parentes por mensagem enquanto ligava para mais meia dúzia.

    Estava tudo correndo bem até que ao virar uma esquina Aluísio deu de cara com o protesto dos taxistas. Antes que o pobre motorista do aplicativo pudesse dar meia volta o carro foi cercado por algumas dezenas de taxistas furiosos. Em poucos segundos Aluísio foi arrancado de dentro do carro e jogado no meio da rua. Com essa manobra exótica o celular de Aluísio decolou e se espatifou no chão. A parte boa disso tudo é que nenhum taxista foi atrás quando ele saiu correndo, a parte ruim é que ainda faltava pagar duas prestações do telefone espatifado.

    Depois de correr por quase um quilômetro, Aluísio chegou no hospital arrependido de todos os seus anos de vida sedentária, mas finalmente estava lá, suado, vermelho e quase tendo uma falência pulmonar. Pronto para testemunhar o nascimento de sua primeira cria. Na contramão do regulamento social vigente, ele e Amélia tinham deixado para saber o sexo da criança no dia do nascimento. Levou alguns minutos para Aluísio localizar a sala de parto, quando ele chegou não pode passar da porta. Ele teve que passar mais meia hora ouvindo toda a sinfonia de gritos que sua esposa estava promovendo dentro da sala, sinfonia essa que foi substituída por outra. Dessa vez os gritos vinham de uma garganta nova em folha. O choro parou, mas depois voltou com força redobrada. Na hora que a enfermeira estava saindo da sala de parto, um exército de parentes invadiu o corredor. Eles chegaram bem a tempo de ver Aluísio desmaiar quando a enfermeira disse:

    “Parabéns, são duas meninas”.

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  1. Bernardete

    Eu acredito nessas coisas.

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