Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Mês: maio 2016

Conheça O Carro que Pula Corda

Em um dia qualquer dessa semana estava eu chegando à minha estação de trabalho. Sento na minha cadeira, olho pra tela de login do Windows e vejo que ele carregou o seguinte link: Conheça o carro que pula corda. Não, esse não é o link que eu vi no meu computador. mas depois de uma pesquisa que não passou da terceira página do Google minuciosa, e de ver que só tinha esse carro mesmo pulando corda na internet, escolhi o melhor link que eu consegui arrumar.

Antes de continuar faço uma pausa para você, caro leitor, entrar nesse link e assistir a mais essa joia da internet. “Filipe, preciso disso pra entender o resto desse texto?”. Não, não precisa, mas convenhamos, ainda é um carro pulando corda. Se mesmo assim você não quiser ver o vídeo, aqui vai um GIF hipnótico com os melhores momentos.

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Quando eu vi esse bendito carro pulando corda eu pensei “mas que bela bosta, hein?”. Imaginei que seria algo um pouco mais… Digamos… Interessante. Claro que eu não esperava muito, afinal eu demorei uns três dias pra ver o tal carro e só fiz isso pra poder escrever esse texto depois. Mas isso me levou a uma conclusão: quanto mais merda é o conteúdo, maior a chance de você clicar no maldito link. Só pra ver qual é.

O que mais se vê por aí são links com “você não vai acreditar”, “conheça aqui”, “confira o final impressionante dessa história” ou “como você nunca viu”. Inicialmente você ignora totalmente, depois para pra pensar se leu certo mesmo, volta pra ver. Nesse ponto a semente da curiosidade já está plantada no seu cérebro. Um momento de hesitação, a vontade irresistível, o clique fatídico e então… Decepção. Sim, decepção. A decepção é uma certeza por que sempre, ou pelo menos na esmagadora maioria das vezes, você foi apresentado a mais um conteúdo bem fezes da internet.

“Mas esse texto aqui também é um conteúdo bem mais ou menos”. Isso não deixa de ser verdade, mas devo lembrar que você não chegou aqui através de uma isca. Conteúdo ruim todo mundo consome, mas normalmente consumimos de forma voluntária, não somos obrigados a consumir, no máximo somos convencidos, mas normalmente não do jeito que eu fui convencido a assistir o vídeo do carro pulando corda.

Pensando bem, talvez eu devesse começar uma divulgação mais, digamos, provocativa. Talvez usar mais “você não vai acreditar” ou “ninguém esperava”, até mesmo um “dessa vez passamos dos limites”. Talvez isso facilite um pouco meu trabalho. É só fazer um link que deixe todo mundo curioso, entregar bem menos do que eu prometi e só sucesso. Se der certo é só engarrafar e vender… Parece bem promissor, talvez eu experimente qualquer dia.

72h (Ou Quase) Sem Whatsapp

Na última segunda-feira uma bomba atingiu as internets brasihueiras: um juiz decretou o bloqueio do Whatsapp por 72h. Nem preciso dizer que o ódio e o desespero se espalharam pela internet. Usuários, empresas, agências reguladoras manifestaram repúdio pela decisão da justiça. Até o jornal que passa antes da novela das nove dedicou alguns minutos pra falar do impacto que o  bloqueio do aplicativo causou na vida das pessoas. E ontem, que seria o ´segundo dia de bloqueio do Whatsapp, eu me deparo com a seguinte imagem.

    Sim, essa foi a capa da edição de terça-feira de um dos jornais de grande circulação em Pernambuco. Eu não poderia falar de outra coisa depois de um sinal tão claro do clamor do universo.

Ano passado já tinha rolado um bloqueio do Whatsapp. Lembro da comoção geral causada pela notícia. Assim como nessa semana, várias pessoas estavam quase entrando em depressão por causa da suspensão do serviço. Parecia mais que sem Whatsapp voltaríamos à idade da pedra. Mandando SMS e usando o telefone pra fazer ligações. Obviamente usar outros serviços mensageiros era encarado quase como uma derrota pessoal, uma gambiarra, quase um prêmio de consolação. Nesse momento eu paro pra pensar: como era a vida antes de todo mundo usar Whatsapp?

Como sempre a verdade está nas coisas menos sérias. No início da semana piadas como essa e essa aqui ilustraram bem alguns benefícios (fictícios ou não) da suspensão do nosso querido chat do ícone verdinho trouxe. Antes de Whatsapp ficar popular a dinâmica de conversar com os outros era um pouco diferente. Naquele tempo a internet móvel era meio capenga e todo mundo usava sms ou simplesmente ligava pros outros quando estava fora de casa ou longe de uma rede Wi-Fi aberta. Ninguém mandava foto por que mensagem MMS era muito cara. Ninguém mandava áudio, se era pra falar usando a voz todo mundo ligava. Os grupos de chat ficavam restritos a momentos em que o usuário estava sentado na frente de um computador.

Se pensarmos direito, todo esse desespero pelo bloqueio do Whatsapp rola pelo simples fato da maioria das pessoas não ter utilizado internet no celular sem ele. Pensar as coisas antigas de um jeito novo é meio tenso pro nosso cérebro preguiçoso de ser humano, e antes da gente pensar em se acostumar com as mudanças tá lá o vatezape funcionando de novo. E disso tudo eu só tiro uma lição: melhor mudar pro Telegram. Tem GIF, sticker de Dilma e ninguém bloqueia.

Contos de Segunda #41- Parte 01

O conto a seguir é uma continuação direta da história de Carmim, o detetive particular que já apareceu  em Contos de Segunda #29 e Contos de Segunda #32.

A lista de corpos desse caso estava me deixando preocupado. Primeiro o marido de Angela, Emilio Zappa, é misteriosamente assassinado. A última pessoa que viu Emilio com vida foi seu colega de trabalho, Humberto Solini, desaparecido desde então. O amor de Humberto por charutos e apostas provavelmente daria uma pista de seu paradeiro, mas o homem que vendia os charutos importados para Solini, o velho Mendez, também foi assassinado.

Você não sabe no que está se metendo, detetive

A frase ainda martelava na minha cabeça. Precisava resolver aquilo rápido, antes que meu corpo fosse o próximo a aparecer sem vida. Cadáveres sempre costumavam render pistas frias, mas eu tinha um pressentimento de que o de Mendez tinha deixado um rastro ainda quente. Resolvi fazer uma visita ao estabelecimento do falecido.

A loja de artigos importados não ficava muito longe do hotel. Ela estava bastante movimentada para uma loja com o dono recém falecido. A porta tinha sido presa por um peso. Imagino que os clientes costumeiros tenham aparecido para prestar condolências. Mas quem estava recebendo as condolências de todas essas pessoas? Um homem saiu de dentro da loja. Usava camisa com uma gravata, colete e avental. Aparentemente uma espécie de garçom. Sua expressão carregava uma tristeza contida, seus olhos estavam levemente avermelhados, provavelmente devido ao choro recente, ou a uma noite mal dormida.

— Bom dia — precisava parecer o menos informado possível.

— Bom dia, senhor. Infelizmente a loja está fechada.

— Fechada?

— Sim, senhor. O proprietário faleceu ontem, as portas estão abertas para aqueles que eram próximos do senhor Mendez. O filho dele está lá dentro, ele achou melhor receber as pessoas aqui embaixo e não em casa, a senhora Mendez está sofrendo muito. Não me recordo do senhor, mas caso seja um amigo da família, sinta-se a vontade para entrar.

A loja estava menos cheia do que eu esperava. Alguns homens, visivelmente podres de rico, estavam espalhados pelo recinto. Alguns bebiam, todos falavam baixo. Em uma mesa ao fundo estava o filho do velho Mendez. Trinta e poucos anos, olhos frios voltados para o copo de uísque na frente dele. Ele obviamente não estava nada feliz com o falecimento do pai, mas não estava tão triste quanto eu pensei que estaria.

— Meus sentimentos, senhor Mendez. Fiquei surpreso quando soube da notícia.

— Eu gostaria de ter ficado tão surpreso quanto o senhor…

— Pode me chamar de Carmim. Esperava falar com seu pai hoje. Infelizmente isso não é mais possível.

— O conhecia, senhor Carmim?

— Não, mas esperava que ele soubesse algo sobre um cliente dele que desapareceu recentemente. Humberto Solini é o nome dele.

— Senhor Carmim, como eu estava dizendo, gostaria muito que a morte do meu pai fosse uma surpresa. Melhor desistir de encontrar Humberto Solini, caso contrário sua morte também não será uma surpresa.

— Espero que não seja uma ameaça, senhor Mendez.

— É um aviso, Carmim — pela primeira vez os olhos dele encontraram os meus. — Algumas pessoas não devem ser irritadas. Seu amigo Solini deve ter descoberto isso.

— Imagine que eu queira, digamos, irritar algumas pessoas. Por onde deveria começar?

— Gosta de apostas, senhor Carmim?

— Não costumo ter muita sorte com apostas.

— Quem sabe jogar não precisa de sorte… Só de cuidado — ele se levantou, olhou ao redor, aproximou-se de mim e continuou com a voz baixa. — De algumas pessoas não vale a pena ganhar.

— Agradeço pelo aviso.

Sem maiores despedidas deixei aquele homem com seu luto. O relógio já marcava mais de meio-dia. O estômago clamava por um almoço, mas ele teria que se contentar com um cachorro-quente. Mais especificamente com o cachorro-quente do jockey clube. Zappa, Solini e Mendez fizeram uma aposta muito errada… Ou muito certa. A única certeza é de que alguém bem perigoso é um péssimo perdedor.

 

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