O conto a seguir é uma continuação direta da história de Carmim, o detetive particular que apareceu pela primeira vez em Contos de Segunda #29.

Você não sabe no que está se metendo, detetive”. A frase martelava na minha cabeça. Ângela estava metida em coisa grande, dava pra sentir o cheiro do problema de longe. Mas eu não podia me preocupar com isso, a chave de tudo tinha nome: Humberto Solini, o homem que não foi visto depois do assassinato do marido de Ângela. Eu precisava encontrá-lo logo, e já sabia por onde começar.

Lembro de quando Ângela conheceu o marido. Ela tinha uma pista quente sobre um ladrão de joias que estava tirando o sossego da polícia fazia meses. Na época eu estava colaborando com a polícia, Ângela tinha passado por uma rodada de “negociações agressivas” com o tal ladrão e temia pela sua segurança. O esquema com o ladrão era simples, ela recebia as joias roubadas através de um mensageiro. Ia para Lo-Fi, o bar do maior hotel da cidade usando as joias, o comprador aparecia deixava o dinheiro e levava as joias. O mensageiro passava e levava o dinheiro. Na noite em que prendemos o mensageiro Ângela não vendeu nenhuma joia. O comprador apareceu, assim como o mensageiro, mas ela não levou nenhuma joia. Naquela segunda-feira tudo que eu ganhei foi um olho roxo e um tiro que pegou de raspão. Ângela acabou ganhando o coração do comprador. Um ano depois ela estava se casando com Emilio Zappa no salão daquele mesmo hotel. Enquanto eu enchia a cara de vodka no mesmo Lo-Fi que me daria uma pista do paradeiro de Humberto Solini.

O bar estava bem vazio. Era quase hora do almoço e eu procurava pelo meu contato. Cassiano era barman do Lo-Fi há quase dez anos e depois de ter resolvido o caso do desaparecimento da irmã dele, tínhamos nos tornado grandes amigos. Ele estava atrás do balcão servindo algo recém batido para um estrangeiro, aparentemente hospede do hotel.

— Mande o de sempre, Cassiano — me sentei num dos bancos antes de terminar a frase.

— Quase não o reconheço sem o sobretudo vermelho, Carmim.

— O calor não me ajuda a manter o estilo. Pelo menos ainda posso usar chapéu.

— Quem está procurando dessa vez, detetive? — Uma pista sobre um cliente do bar, como pedido de sempre.

— Lembra de Ângela Bevoir?

— Ela arrumou um marido na minha frente, Carmim. E passou a perna em mais uma dúzia dentro dessas paredes.

— Deve saber que o marido dela passou dessa pra melhor.

— Ouvi falar dessa história.

— A morte de Zappa é um caso meio nebuloso. Preciso achar um cara que pode jogar uma luz em cima disso tudo. O nome é Humberto Solini. Todos aqueles cães do banco vivem por aqui. Você deve saber de alguma coisa.

— Eu sei que Solini é apaixonado por duas coisas: charutos e apostas. Se ele está escondido provavelmente não vai ficar muito tempo longe de qualquer uma dessas coisas. Se deram um sumiço nele… Bom, é provável que ele tenha perdido uma aposta bem grande.

— A próxima dose vai ser por conta da casa. — Deixo uma nota de cem em cima do balcão e me levanto.

— Se quiser algo para fumar, detetive, talvez deva visitar o velho Mendez.

Não me virei para ouvir, continuei andando. Não me parecia muito promissor ficar contando os charutos importados, o jockey club era a melhor opção… Pelo menos era o que eu pensava naquele momento. O vento jogou no meu rosto uma página de jornal. O jornal era de ontem e a notícia que tinha acabado de, literalmente, voar no meu rosto tinha como título:

Grande Importador Assassinado ao Sair De Loja”

Algo me dizia que o velho Mendez tinha muito mais a me dizer morto do que tinha quando estava vivo.

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