Não é um blog sobre cachorros e bikinis

Tag: Música Page 3 of 4

Contos de Segunda #54

Elvis detestava o mês de Agosto. Em Agosto ele se sentia estranho, agressivo, impaciente e qualquer coisa incomodava de forma inacreditável. Também era o mês em que nada fazia muito sentido dentro da cabeça dele. Comer coisas que normalmente não eram comestíveis, acordar em locais onde ele não dormiu e agir antes de pensar eram a rotina de Elvis no mês oito do ano.

Elvis era um cachorro e no mês de Agosto ele ficava louco. Mas houve um Agosto em especial em que ele ficou muito mais louco que o normal.

Elvis morava em uma casa. O bairro era tranquilo, distante do centro, cheio de pessoas idosas.  Era. Até uma bela manhã de agosto em que os novos vizinhos chegaram. A família era composta por um homem, uma mulher e a filha do casal. A família parecia normal, Elvis estranhou a maquiagem pesada e as roupas pretas da filha, mas devia ser algo da moda. No meio da tarde chegaram mais três garotas com roupas parecidas. Elvis começou a achar que todas as jovens humanas se vestiam daquele jeito e, aparentemente, elas viviam se mudando, essas também carregavam um monte de caixas de formatos diferentes. Meia hora depois começou.

Elvis nunca tinha ouvido nada tão perturbador. Se ele pudesse definir provavelmente chamaria aquilo de sinfonia do demônio. A raiva crescia, o coração disparou, a saliva se virou em espuma  e um rosnado gutural quase alienígena brotava da garganta. O pobre animal tremia de raiva. Aquilo precisava parar, ele precisava fazer parar. A raiva não deixou o coitado raciocinar o suficiente para encontrar uma forma engenhosa de chegar à casa ao lado. Ao perceber que a sua dona estava abrindo a porta ele saiu em disparada, fez uma curva de noventa graus e, só Deus sabe como, atravessou a cerca viva, penetrando o terreno vizinho. Agora ele precisava achar a fonte do maldito som.

Depois de correr furiosamente algumas vezes ao redor da casa, Elvis descobriu uma pilha de caixas que o levaria até uma janela alta por onde o maldito som vazava como uma erupção do inferno. Ele tomou distância, correu em velocidade máxima, escalou as caixas e voou pela janela. Tudo depois disso é um borrão. As únicas coisas das quais ele lembra é de ser abraçado por braços magricelos e de um som muito agradável. O som grave de um instrumento musical que silenciou as vozes agitadas de jovens humanas. Depois disso ele acordou, estava em casa e não havia nenhuma música tocando.

Hoje Não É Dia do Rock

13 de Julho, conhecido como a última quarta-feira, foi o Dia Mundial do Rock. Eu não fiz um post alusivo ao assunto por que eu esqueci completamente e tava com vontade de falar de Life is Strange por que eu já tinha feito um no ano passado. A parte mais legal desse texto é que ele foi publicado no dia errado.

    Eu não lembro exatamente o que foi, mas no ano passado teve alguma coisa que me fez pensar que o Dia do Rock era comemorado em 3 de Julho e não no dia 13. Minha reação quando eu vi, exatos dez dias depois, que tinha publicado um texto sobre o Dia do Rock no dia errado foi mais ou menos essa.

 FSjAzgr

xgjt5AI

e6327Nd
Naquela época eu nem compartilhava meus próprios textos no facebook e o número de leitores era bem menor que hoje em dia, mas foi aí que eu pensei “ano que vem eu PRECISO relatar essa experiência única com o mundo”.

Pare pra imaginar, eu fazendo um texto bem legal sobre o Dia do Rock, a primeira oportunidade que eu tive pra falar de música no meu blog recém nascido, e faço isso no dia errado. E nem dá pra disfarçar por que o texto começa assim:

“3 de Julho. Por algum motivo, que eu não faço ideia qual seja, é comemorado o Dia Mundial do Rock.”

Aiqueburrodzeropraele
E ainda por cima tá mal escrito esse começo, esse Filipe é uma mula mesmo, mas como todas as coisas erradas que a gente faz na vida, esse erro gritante me fez aprender uma lição valiosa: de que adianta fazer uma besteira dessa se você não vai contar pra ninguém?

Por isso eu encerro essa postagem que tem mais figuras do que tudo com um pedido a todos que estão passando os olhos no presente texto: compartilhe suas besteiras, deixe todo mundo saber dos seus erros divertidos e principalmente se divirta com seus erros.

Contos de Segunda #49

Vocal, Guitarra, Baixo e Bateria.  Na opinião de muitos, apenas isso é suficiente para fazer o bom e velho Rock n’ Roll. Como os quatro elementos da natureza eram as quatro meninas que formavam o 4Ladies, provavelmente a banda de rock composta apenas por garotas mais desconhecida da face do planeta Terra. Mas isso estava prestes a mudar.

— Vamos ver o que temos aqui — disse o delegado. — Quatro menores de idade invadiram um prédio desocupado, fizeram uma ligação clandestina de energia, provocaram a interrupção das aulas de uma faculdade, dois cursos pré-vestibulares e uma escola técnica e…

— A gente só tava fazendo nosso som, esse pessoal parou porque quis — interrompeu Bateria.

— Cala a boca, Bateria! — Gritou Guitarra. — Quer ser presa de verdade?

— Quietas, meninas — disse Vocal. — Desculpa, seu delegado. A gente não quer causar mais problema.

— Fico comovido com a sua consideração… — o delegado olhou para os documentos da mesa — Ivone, não é? E as outras são Bárbara, Agnes e Laila, certo?

— Isso mesmo delegado… Gostamos mais de Vocal, Bateria, Guitarra e Baixo, mas pode nos chamar como quiser.

— Ótimo, sou péssimo com nomes — o delegado olhou para as meninas por alguns segundos antes de continuar. — Podem me dizer o que diabos aconteceu?

— A gente só queria tocar, delegado, só isso — adiantou-se Bateria.

— Para de falar desse jeito ou a gente vai acabar se dando mal de verdade — repreendeu Guitarra, ela respirou fundo e continuou. — A gente começou a banda tem pouco tempo, delegado. Ninguém conhece a gente aí… A gente pensou em… Tipo, sei lá… Fazer alguma coisa pra ficar conhecida.

— Então vocês invadiram um prédio desocupado, fizeram uma ligação de energia clandestina até o telhado, armaram os equipamentos e fizeram uma apresentação que foi ouvida num raio de no mínimo duzentos metros.

— Não foi bem assim que aconteceu — explicou Vocal. — A gente meio que tinha a chave, então na prática não foi bem uma invasão.

— O prédio é meu, delegado — interrompeu Baixo. — Meu avô comprou e colocou em meu nome, por isso eu tenho a chave.

— Olha aí, a gente não fez nada de errado — cortou Bateria. — Acho que é melhor soltar a gente por causa das coisas de criança e adolescente.

— Para de falar, Bateria, tá piorando tudo — rosnou Guitarra entre os dentes cerrados. — Se for prender alguém prende ela, delegado. A gente tá colaborando aqui, ela que tá de desacato.

A paciência do delegado estava por um fio. Vocal notou a fúria crescente do homem e decidiu intervir.

— A gente teve essa ideia, mas não sabia bem o que estava fazendo, delegado — começou Vocal. — A gente usou energia de uma… Como se diz mesmo? Instalação provisória feita pelo pessoal que tá reformando o prédio. A gente arrumou um sistema de som, mas não sabia que ele era tão potente… A gente só queria chamar a atenção da galera da faculdade… O plano era tocar num dos intervalos entre as aulas e como o prédio da faculdade é bem mais alto, muita gente ia ver…

Que nem os Beatles — interrompeu Bateria. — Ou a banda do Homer Simpson.

— Eu vou dar na cara dessa menina — explodiu Guitarra. — Para de interromper os outros, a gente vai se complicar por sua causa.

— Cala a boca, Guitarra — desdenhou Bateria. — Essa raiva toda é só por que na hora do solo saiu tudo errado.

Guitarra não respondeu, partiu pra cima da amiga com tudo e se não fosse por Vocal e Baixo a briga teria começado ali mesmo.

— CHEGA! VOCÊ DA BATERIA PRA FORA! CANTORA, FORA TAMBÉM! AQUI DENTRO SÓ A DONA DO PRÉDIO E A DA GUITARRA, NÃO QUERO NINGUÉM BRIGANDO NA MINHA DELEGACIA! FORA!

O delegado bufava de raiva e estava mudando de cor algumas vezes por segundo. Ele buscou dentro de si o último traço de tranquilidade e agarrou-se nele. Quando a cor do delegado parecia normal novamente Guitarra começou a falar.

— Foi mal, delegado, é que quando eu erro…

— Você, — ele apontou o dedo para guitarra — quieta. Agora, dona do prédio, me convença a liberar vocês.

— Senhor delegado, o senhor tem que concordar que não cometemos nenhum crime de fato — explicou Baixo. — O proprietário do prédio autorizou a entrada e se a ligação de energia é irregular quem deve ser notificada é a empresa responsável pela reforma. Somos culpadas pelo barulho, mas entenda nosso lado, delegado, apenas queremos fazer nossa banda dar certo. Imagine o tanto de divulgação gratuita e espontânea nós estamos tendo neste momento com vídeos e fotos nossas sendo compartilhadas na internet. Acredito que a melhor saída é apreender nosso equipamento e liberá-lo mediante pagamento de multa, além de obviamente comunicar os nossos responsáveis.

Tanto o delegado quanto Guitarra estavam boquiabertos. Até Guitarra que conhecia Baixo desde criança estava surpresa como a amiga tinha conseguido tão facilmente pensar numa solução.

— Bem… Não é todo dia que aparece uma pessoa detida que apresenta uma solução razoável para sua situação — o delegado fez uma pausa para olhar os documentos. — Aguardem aqui enquanto falo com os responsáveis de vocês e vejo a questão da multa.

O delegado saiu e informou às duas meninas que aguardavam do lado de fora o que fora resolvido. Obviamente nenhuma das duas ficou muito feliz em saber que os seus pais seriam informados.

— Mandou bem, Baixo — disse Guitarra. — A gente vai se lascar um pouco, mas melhor que ser presa.

— Sem falatório, Guitarra — disse Baixo sacou o celular. — Aproveita enquanto o delegado não volta e sai procurando qualquer vídeo ou foto da gente na internet — Guitarra entendeu o recado, deu um sorriso e puxou o celular do bolso. — A gente vai dizer a todo mundo que essa bagunça toda é culpa nossa. Todo mundo tem que saber que é culpa das 4Ladies.

Contos de Segunda #44

 As peripécias de Luciana e Roberta para fazer Jorge e Cristina ficarem juntos não começou hoje. Esse conto é uma continuação dos Contos de Segunda#34 e Contos de Segunda #42.

   — Deixa eu ver se eu entendi direito. Vai rolar um ensaio do casamento do seu irmão. A banda do amigo de Jorge vai estar lá e você quer que eu apareça lá pra chegar nele? — Luciana aparentava uma confusão proposital.

    — É — respondeu Roberta mais concentrada no salmão defumado do que nas sutilezas da amiga.

    As duas não se falaram muito desde o dia em que Fábio confirmou que tocaria no casamento do irmão de Roberta. Um ensaio do casamento marcado em cima da hora fez as duas almoçarem juntas

    — Quem ensaia casamento em dia de segunda?

    — Alguém que não pode ensaiar outro dia — no ranking da atenção de Roberta, Luciana estava atrás do salmão e do celular.

    — Foco, Roberta, estamos discutindo coisa séria.

    — Nem tem muito o que discutir. Hoje você aparece comigo lá no ensaio e quando acabar tudo conversa com Fábio. Simples assim.

    — Preferia fazer isso no casamento do teu irmão.

    — Não sei se você sabe, mas Cristina estudou com Beto na faculdade e ela vai estar lá no casamento. Acabo de lembrar que ele estudou contigo também, mas até onde eu sei Beto não vai com a tua cara.

    — E daí?

    — E daí que esse seu plano só vai funcionar se ela não suspeitar de nada. Por que se ela sentir o cheiro dessa armação, vai cantar essa pedra pra Jorge e já era esse teu Game of Thrones versão cupido.

    Contra esse argumento Luciana não encontrou resposta além do silêncio. O relógio estava quase nas nove horas da noite quando ela e Roberta chegaram ao salão de festas. Os noivos já tinham combinado a trilha sonora da cerimônia e agora estavam ensaiando a valsa. Somewhere Only We Know seguido de Burnin’ Love. A banda de Fábio tinha um homem no vocal, mas uma voz feminina foi recrutada para ajudar na versatilidade da banda e permitir os duetos.

    — Acho que ainda vai demorar — Roberta analisava o relógio arrependida, devia ter comprado um maior.

    — Então é a nossa chance — Luciana já tinha analisado todo o ambiente.

    — De quê?

    — De chamar a atenção de Fábio, o que mais seria?

    — O cara tá trabalhando, Luciana. Tem umas cadeiras ali e…

    — Nada disso — Luciana rapidamente se posicionou atrás da amiga, colocou as mãos nos ombros dela e começou a empurrar. — A gente vai esperar um pouco, quando eles se prepararem pra repetir a música você vai ali cumprimentar seu irmão e vai aproveitar a deixa pra falar com Fábio e vai dizer que é amiga de Jorge. Isso vai chamar a atenção dele o suficiente pra ele dar uma olhada ou outra pra onde a gente estiver sentada, o resto é comigo.

    Elas precisaram esperar só um minuto. A música terminou. Beto e sua noiva estavam bem satisfeitos com a performance deles e da banda. Roberta aproveitou a pausa para se aproximar.

    — Caramba, Beto. Não pensei que essa valsa ia ficar tão boa. Obviamente não por causa da noiva, sempre confiei em você, Angela.

    — Eu também pensei que não ia rolar. Nem sei como te agradecer por ter conseguido a banda.

    — Não fiz nada, Jorge que conseguiu convencer a banda a aceitar o convite — ela se virou para a banda. — Boa noite, pessoal.

    — Boa noite! — Respondeu a banda em coro.

— Você deve ser Roberta? — A pergunta vinha do guitarrista.

— Sou eu. Falei contigo no telefone.

— Avise a Jorge que ele só não fica me devendo essa, por que se der certo a gente pretende aproveitar esse segmento matrimonial. Vai ficar pra ver o ensaio?

— Sim, tô ali com uma amiga. Comentei sobre essa história de vocês tocando no casamento e ela ficou curiosa — Roberta olhou pro relógio. — Olha só a hora, e eu aqui atrapalhando. Vou ficar ali até vocês terminarem.

O ensaio recomeçou. Uma dúzia de passos e Roberta chegou onde estava Luciana.

— Valeu, amiga. Agora é só ele agir como o previsto e tá no papo.

O plano de Luciana deu certo. Volta e meia Fábio dava uma olhada discreta para onde as duas amigas estavam. Luciana respondia com olhadas nem tão discretas para o guitarrista. Quando os olhares ficaram mais frequentes ela resolveu brincar com o ego musical dele. Luciana começou a cantar as músicas junto, depois começou a se mexer na cadeira e terminou puxando Roberta para dançar imitando os passos dos noivos. Fábio já estava com a guitarra dentro do case quando foi falar com as duas.

— Que bom que gostaram da música.

— Vocês são muito bons mesmo eu até…

— Tô apaixonada pelo som de vocês — interrompeu Luciana. — Você deve ser o amigo de Jorge, né? Luciana, prazer — A mão já estava estendida antes do “prazer” terminar de sair da boca.

— Fábio. Se gostou agora vai ficar impressionada no casamento, vão rolar umas surpresas bem interessantes.

— Eu não fui convidada, há quem diga que o noivo me detesta.

— Jorge também não fala muito bem de você.

Luciana corou. Todas as dezenas de respostas possíveis morreram ainda na garganta. Ela gaguejou e não saiu nada. Fábio abriu um sorriso.

— É uma pena que você não vai pro casamento, mas se quiser ouvir a gente tocar e estiver com a quinta-feira livre, é só dar uma chegada nesse bar aqui — Fábio sacou um folheto do bolso e entregou a Luciana. — Depois do show você me explica por que Jorge gosta tão pouco de você. Agora preciso ir pra não perder a carona. Até mais.

    Elas esperaram o guitarrista se afastar em silêncio. Luciana ainda estava corada quando Roberta falou.

    — Pois é, amiga. Parece que tudo deu certo. Fico impressionada com a tua capacidade de interpretação.

    — Tô achando que não foi bem isso, Roberta — as palavras saíram devagar da boca de Luciana. — Acho que essa história não vai ficar só com Jorge e Cristina.

Contos de Segunda #43

Para saber mais sobre a história da Dama da Segunda-feira é só ler a primeira aparição dela em Contos de Segunda #38.

Um ser místico. A personificação das fantasias humanas. A encarnação de algo intangível. Qualquer uma dessas definições poderiam ser usadas para definir uma Dama. Desde tempos ancestrais elas se manifestam no plano terreno e escolhem entre os mortais os seus Cavaleiros. Uma forma de evitar a degeneração da sua consciência e o descontrole de seus poderes. Porém encontrar um Cavaleiro nem sempre é algo fácil, principalmente se você é a Dama da Segunda-feira.

    Segunda estava triste desde seu último encontro com a Mãe-de-Todas. A Dama da Lua havia determinado que ela precisava conseguir um Cavaleiro e que todas as outras Damas teriam o dever de ajudá-la. Semanas se passaram desde então e Segunda não tinha movido uma palha para atender às ordens da Mãe. Pelo menos até aquele momento. O celular começou a tocar. Era Terça-feira, a segunda Dama da Semana começou a falar antes do “alô” da irmã.

    — A Mãe-de-Todas te dá uma prensa e você não me conta nada?

    — Boa tarde pra você também, Terça-feira. Eu vou muito bem, obrigada por perguntar.

    — Nem tente me enrolar com suas ironias. Se a Mãe te chamou pra falar disso as coisas devem estar sérias. Tá sentindo alguma coisa? Lapsos de memória? Alguém perto de você começou a agir estranho do nada?

    — Não, não e não. Não tem nada sério acontecendo, Terça… Só que… Sei lá, eu não queria ninguém no meu pé. Você sabe como isso é complicado.

    — Guarda o choro pra quando estivermos as cinco juntas. Quarta-feira vai te buscar em dois minutos

    Quarta apareceu em um minuto. A irmã do meio era o puro estereótipo da mulher de negócios. Roupas formais, aspecto impecável e cara de que o tempo dela valia ouro.

    — Sabe que não precisamos fazer tudo que ela manda, né?

    — Ela é a Mãe, Segunda-feira. Você pode comandar nós quatro, mas ela comanda todas as outras.

    Segunda deu ombros. A irmã abriu novamente a passagem dimensional por onde tinha vindo e instantes depois elas estavam na casa de Terça-feira. Tanto a casa quanto a dona pareciam ter sido transportadas direto dos anos sessenta. Terça tinha uma capacidade de clarividência forte o suficiente para fazer dela uma das videntes mais requisitadas da cidade.

    — Finalmente, estava ficando preocupada. Quinta, Sexta, elas chegaram.

    As gêmeas pareciam ter vindo de uma festa de música eletrônica. Quinta tinha os cabelos pretos, usava maquiagem pesada e roupas escuras, Sexta era loira, usava roupas multicoloridas e maquiagem extravagante. Apesar da aparência diferente, as duas pareciam quase sincronizadas, principalmente no quesito empolgação.

    — É só me dizer uma balada legal, Segunda. A gente entra lá e só sai com seu Cavaleiro — disse Quinta.

    — Quem sabe a gente não arruma mais de um, tô meio enjoada do meu Cavaleiro — falou Sexta.

    — O assunto é sério, meninas — Começou Terça-feira. — Nossa Mãe colocou Segunda contra a parede e disse que ela precisava arrumar um Cavaleiro já e de quebra ainda ordenou que toda e qualquer Dama ajudasse nessa empreitada. Sentem-se que eu preciso fazer uma coisa antes de continuar — as Damas se sentaram nas almofadas do chão. Terça revelou uma bola de cristal e colocou entre ela e Segunda. — Primeiro precisamos saber o quanto você está perto de ficar pirada.

    — Eu não vou ficar pirada.

    — Calada. Coloque as mãos na bola.

    Segunda-feira obedeceu. Colocou suas mãos sobre o globo e esperou. A esfera começou a brilhar. A luz foi aumentando aos poucos. Mudando de cor, oscilando, piscando. Em alguns momentos parecia bater como um coração. A luz diminuiu até se apagar, depois disso a bola de cristal ficou completamente escura e opaca.

    — E aí? — Disse Quinta.

    — E aí que temos um problema — respondeu Terça. — O nível de energia dela está bem acima do normal. Próxima segunda é feriado, isso deve te descarregar um pouco, mas não podemos demorar muito com isso.

    — O que você sugere, Terça? — Disse Segunda externando toda a raiva que sentia com aquela situação. — O que sugerem irmãs? Que eu enlouqueça por causa de um mortal? Que eu conceda uma dádiva a um ser humano indigno?

    — Não precisa levar tudo tão a sério. Um Cavaleiro é só uma ferramenta, uma ajuda na manutenção dos nossos poderes — Interrompeu Sexta.

    — Isso é pra você, Sexta — rebateu Segunda. — Antigamente as Damas escolhiam seus Cavaleiros como se escolhe um filho e os amavam como se fossem seus irmãos. Quinta, não é muito diferente disso. Para os mortais ela é casada com o Cavaleiro dela.

    — Casos como o meu são cada vez mais raros, irmã. Veja Terça, que trocou o último Cavaleiro por cinco.

    — Cinco? — Disse Quarta. — Que obscenidade é essa? Nosso poder não pode ser distribuído desse jeito.

    — É um time de MOBA, não tem como agraciar apenas um deles com minha dádiva.

    — O que é MOBA? — Perguntou Sexta.

    — Deve ser algum tipo de seita — respondeu Quarta.

    — Ah, esquece — interrompeu Terça. — Não estamos aqui pra discutir as nossas escolhas. Precisamos ajudar nossa irmã e se alguém não tiver algo útil pra dizer é melhor não dizer nada.

    — Na verdade tem uma forma de conseguir um Cavaleiro — Quinta falou essas palavras com cuidado, como se quisesse garantir que as irmãs saberiam o que ela falaria em seguida.— Existe uma Dama que pode ajudar, mas se a Mãe-de-Todas sonhar que encontramos com ela…

    — Não, não podemos — interrompeu Quarta. — Ela foi banida, é uma Dama renegada, por pouco não foi executada pela Mãe. Se você ousou entrar em contato com ela, Quinta-feira…

    — Não sou tão transgressora quanto pareço, Quarta-feira. Ela e eu… Nos conhecemos muito antes de tudo acontecer. Antes dos crimes, antes de toda aquela confusão.

    — O que acha, Segunda? — Perguntou Terça.

    — O que eu acho? Eu acho que vamos precisar colocar um ou dois biquínis na mala, meninas.

    Quinta não conseguiu segurar o sorriso. Sexta bateu palmas de satisfação. Quarta fez uma careta de reprovação e Terça cobriu o rosto com as mãos.

    — Vamos atrás da Dama Renegada. Eu quero aprender o canto de sereia da Dama do Mar.

No More Trouble

Essa semana foi tensa. Essa semana foi de torar em banda. Nossa classe política tocando fogo no país e a internet pegando fogo. Nesse momento praticamente todo mundo está brigando com alguém ou mostrando seu repúdio por alguma coisa. Deputado mandando beijo pra Xuxa, deputado se cuspindo, presidente #xatiada, dólar que cai subindo reportagem especial sobre a primeira dama do vice, reportagem especial falando mal da reportagem especial sobre a primeira dama da vice e mais um monte de coisa está gerando uma quantidade inacreditável de discussões world wide web a fora. Essas discussões estão gerando brigas diversas e ainda mais confusão. Pensando sobre isso tive um momento de iluminação.

Essa semana estava eu ouvindo reggae no carro. Tempos tão tumultuados pedem um pouco de positive vabration. E dentre os clássicos ouvidos naquele dia estava um dos maiores hinos compostos por Bob Marley. No More Trouble tem uma mensagem bem simples: a vida já tá difícil do jeito que é, não precisamos de mais problemas. A vida já anda muito complicada mas ainda tem gente que não se conforma com os problemas nossos de cada dia e se esforça de verdade pra arrumar mais.

Independente do que acontecer ainda vamos ter que levantar de manhã e cuidar das nossas coisas. As contas ainda vão vencer, o dinheiro ainda vai ficar curto, a gente ainda vai chegar atrasado por causa do trânsito, as crianças ainda vão precisar ir pra escola, o time ainda vai mal no campeonato, o calor vai continuar infernal, a chuva quando vier vai sair lascando tudo, você vai perder aquela promoção que tava esperando tem meses, a paciência vai faltar, a coragem também e daqui a pouco a internet também vai faltar. A vida vai continuar e o mal de cada dia vai estar lá pra gente resolver. Se não bastasse tudo isso e mais um monte de coisa, ainda tem os problemas que cada um faz questão de arrumar pra si mesmo.

Por essas e outras eu sigo a dica do meu pai. Pra toda possível treta, confusão, atrito e desentendimento ele sempre diz a mesma coisa: “EVITE”. Se depender de você, não arrume mais problemas. Eu não preciso de mais problema, provavelmente você também não, por isso deixe pra lá discussões que não vão a lugar nenhum, não arrume treta de graça com seu amiguinho e não esquente a cabeça com aquilo que não depende de você. E principalmente, não leve pro lado pessoal. O problema não é com você, é com todo o resto.

Contos de Segunda #37

Fernanda estava com um humor péssimo. O papagaio do vizinho começou a gritaria às quatro da manhã, exatamente três horas antes do despertador de Fernanda tocar. O maldito papagaio costumava fazer esse tipo de coisa, mas nunca tão cedo. Depois de falhar miseravelmente em voltar a dormir Fernanda resolveu antecipar sua corrida noturna. Chegou na rua, ligou a música e colocou os fones de ouvido. Depois de quinhentos metros a música parou. O player ainda reproduzia a música, mas nada de som. Ela experimentou tirar o fone, a música voltou. Ao colocar o fone novamente a música parou. Depois de algumas tentativas Fernanda desistiu, o fone de ouvido só funcionava com o rádio e o jeito foi correr ouvindo o noticiário policial com as noticias da madrugada.

    Depois da corrida desastrosa não foi difícil chegar cedo no trabalho. Ela ligou o computador e conectou os fones de ouvido. Aparentemente eles estavam funcionando perfeitamente. O dia prometia ser tranquilo e sem muitos aborrecimentos. Tudo que Fernanda precisava fazer era não tirar os fones do ouvido. Ela tinha começado recentemente no emprego e um dos seus colegas de sala produzia inúmeros barulhos praticamente insuportáveis. O teclado fazia muito barulho, o scroll do mouse rangia, as rodinhas da cadeira arrastavam no piso e ele tinha um pigarro eterno. Mas tudo isso era barrado, ou pelo menos minimizado, pela ação do fone de ouvido e pela biblioteca de música praticamente infinita do serviço de streaming. Era só carregar a página de um artista ou banda com uma discografia grande, fazer a lista de reprodução e tudo ficaria bem… Mas não ficou.

    “Erro Tente Novamente Mais Tarde”. Foi o que apareceu na tela quando ela tentou acessar a página de um artista. Tentou com outro, mais um, uma banda. “Erro Tente Novamente Mais Tarde”. O sangue de Fernanda começou a esquentar, de repente os 14,90 que ela pagava na assinatura do serviço pareceram uma quantia exorbitante. Tentou o player web, depois pelo aplicativo do celular. “Erro Tente Novamente Mais Tarde”. O colega barulhento chegou mascando chiclete, da forma mais ruidosa e babada que um ser humano poderia mascar um chiclete. Fernanda já estava trincando os dentes, mas antes de perder completamente a calma ela se conformou em passar o dia ouvindo rádio. Como todas as rádios legais da internet eram bloqueadas pelo servidor, ela teve que se conformar com as rádios FM’s normais, com todas aquelas músicas repetidas e intervalos comerciais sem fim.

    Chegou em casa cedo desejando comer e dormir. Depois de comer um pedaço da lasanha do almoço de domingo ela estava pronta pra cair na cama… Quando o papagaio começou a gritar. Uma, duas, três horas. Já passava das 22h e o papagaio ainda berrava. Fernanda decidiu agir. Pegou uma faca, colocou entre os dentes, saiu pela janela da área de serviço, escalou um pedaço da fachada, cortou a tela de proteção e entrou na área de serviço do vizinho, lá ela encontrou o papagaio. Ela olhou furiosa para a ave tresloucada. Os gritos aumentaram. Ela pegou o bicho pelo pescoço e desceu a faca em um golpe vertical… Arrebentando a corrente que prendia o papagaio no poleiro. Ela levou o bicho seguro pelo pescoço até o quarto onde o vizinho dormia com sua esposa. Abriu a porta, jogou o papagaio dentro, fechou a porta e habilmente usou a faca para inutilizar a fechadura. Voltou para a área de serviço, desceu um pedaço da fachada até chegar em casa. Caiu na cama e dormiu bem como jamais dormiria outra vez na vida.

Oscar 2016

No próximo domingo, também conhecido como 28 de Fevereiro, acontecerá a cerimônia do Oscar, a maior premiação do cinema deste lado do universo, que junta uma galera de Hollywood pra premiar os melhores filmes, roteiristas, editores, compositores, sonoplastas, maquiadores, figurinistas, atores e diretores do ano de 2015. Como a maioria desses filmes favoritos aos prêmios, que são sucesso de crítica e entram pra história como marcos do cinema, eu normalmente não assisto, eu me limito a torcer por dois tipos de concorrentes: os blockbusters bons e os filmes de animação que concorrem fora da categoria de Melhor Filme de Animação. Além dos motivos regulares, nesse ano eu tenho alguns a mais pra torcer.

Neste ano, representando a categoria Filmes que O Povão Foi Ver temos Star Wars Episódio VII e Mad Max: Estrada da Fúria. Star Wars nunca foi uma franquia que costuma concorrer nas categorias mais nobres do Oscar, mas como sempre está lá figurando nas categorias técnicas: Efeitos Visuais, Edição, Edição de Som e Mixagem de Som.

Ele levaria fácil se não estivesse concorrendo com Mad Max em todas essas categorias, a briga vai ser entre esses dois. Cabe ressaltar que eu não vi nada dos outros concorrentes, mas convenhamos, é Star Wars e Mad Max, se nenhum desses dois ganhar nessas categorias vai ser marmelada. Além das categorias técnicas, nossa querida Guerra Nas Estrelas está obviamente concorrendo ao Oscar de Melhor Trilha Sonora graças ao nosso velho conhecido John Williams. Nessa categoria vamos ver um embate interessante entre nosso bom e velho John e a lenda do faroeste Ennio Morricone, com seu trabalho em Os Oito Odiados. Como eu sou louco por Star Wars e um admirador de faroeste, qualquer um dos dois que ganhar pra mim tá de bom tamanho.

Mas minha torcida desse ano está mesmo com Mad Max. Além das categorias que concorre com Star Wars, nossa querida Estrada da Fúria também está concorrendo aos prêmios de Melhor Fotografia, Melhor Maquiagem, Melhor Figurino, Melhor Direção de Arte, Melhor Diretor e Melhor Filme. A dobradinha Melhor Filme e Melhor Diretor não tá muito fácil, cheias de filmes com atuações espetaculares e histórias bem mais trabalhadas do que Mad Max, mas se fosse pra apostar eu apostaria em George Miller levando o prêmio de Melhor Diretor. Melhor Maquiagem e Melhor Figurino também estão entre as categorias que Mad Max tem mais chance. Também não assisti nenhum dos outros filmes que estão concorrendo nessas categorias, mas Mad Max tem a Charlize Theron com uma protese mecânica e com maquiagem de graxa explodindo coisa durante uma perseguição frenética no deserto, não preciso dizer mais nada.

Além dos filmes sempre tem algumas pessoas pra quem eu torço. Esse ano eu estou na torcida pra nosso compadre Leonardo DiCaprio finalmente ganhar um careca dourado. Depois de bater na trave um monte de vezes, o nosso amigo merece ganhar um Oscar pra chamar de seu. Mas minha maior torcida desse ano vai pra Silvester Stallone, que já ganhou o Globo de Ouro e está concorrendo ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante pela sua atuação em Creed – Nascido Para Lutar, a melhor atuação da vida do Stallone. Vai ser difícil, mas ver Rocky Balboa de volta ao cinema pode mexer com o coração dos membros da Academia.

Na categoria de Filmes Sem Gente de Carne e Osso temos Divertida Mente concorrendo aos prêmios de Melhor Filme de Animação e Melhor Roteiro. Também concorrendo ao prêmio de Melhor Animação temos pela primeira vez um filme brasileiro, O Menino e O Mundo está lá na lista de indicados. Dificilmente ele vai levar a estatueta, mas só de estar lá já vale muito. E pra finalizar temos uma menção honrosa. Lady Gaga está concorrendo junto com Diane Warren ao prêmio de Melhor Canção Original. Não ouvi a música delas e nem a dos concorrentes, mas eu simpatizo com nossa comadre Gaga e sempre é melhor torcer pelo improvável. Afinal quem poderia imaginar que Lady Gaga concorreria ao Oscar algum dia.

Muito Mais Música

    Logo no começo do ano da Graça de 2016 eu estava de bobeira nas internets e me deparei com uma postagem bem interessante. A postagem em questão saiu em um site de cultura pop que eu costumo frequentar, nela são apresentadas sete resoluções de ano novo que podem ser adotadas por qualquer pessoa. Entre resoluções sérias e outras nem tanto, estava uma que eu considerei deveras relevante para a vida prática de qualquer ser humano. O número 2 da lista de resoluções para 2016, segundo essa lista, é “Ouvir Muito Mais Música”.

    Ouvir música atualmente dá muito menos trabalho do que já deu um dia. Praticamente todos os celulares de hoje em dia reproduzem música, inclusive os fones de ouvido costumam vir junto com o aparelho. De todas as mídias que migraram pro digital, a música foi a que melhor conseguiu fazer essa transição, eliminando totalmente a necessidade de mídia física. Mas por que será que ainda consumimos música de um jeito, em boa parte do tempo, preguiçoso?

Na lista o autor não critica gêneros ou estilos específicos. A crítica é contra o igual, o padronizado.Existe muita coisa por aí pra ser ouvida, e principalmente pra ser gostada. Graças a essa maravilha chamada internet, tecnologia que veio pra ficar, qualquer um pode gravar uma música e jogar no mundo pra todo mundo ouvir. Coisas antigas antes de difícil acesso, agora estão a dois cliques de distância. E ainda assim continuamos ouvindo as mesmas coisas de sempre. Não que seja culpa nossa, fazemos inconscientemente.  Quase sempre escutamos o que nos é familiar. Muitos dos artistas novos que experimentando são apenas variantes daquilo que já conhecemos.

O autor da lista desafia todos nós a nos tornarmos nossos ouvidos mais curiosos. Ouvir um artista relacionado, procurar a versão original de um cover, ir atrás daquele carinha que fez uma participação especial naquela faixa e coisas do tipo, são práticas simples que podem ter resultados surpreendentes. Quando menos esperamos, topamos com algum artista interessante que ninguém ouviu falar, ou damos chance pra um estilo que nunca pensávamos que existia. E tenho certeza que quando isso acontece você se sente como eu. Como se aquilo fosse o primeiro passo para um universo muito maior.

A Odisseia Espacial de David Bowie

No começo dessa semana recebemos a notícia da morte de David Bowie. A primeira coisa que preciso dizer é que eu não sou fã desse nobre falecido, meu conhecimento acerca da obra dele só é maior do que o conhecimento da minha avó sobre The Walking Dead. A segunda é que, apesar de saber praticamente nada sobre a obra do nosso compadre David, tem uma música dele que eu gosto muito. Uma música que eu conheci por um acaso e que conta uma história muito curta, mas tão profunda e impactante que eu não podia deixar de falar sobre ela, principalmente na semana em que o seu compositor partiu dessa pra melhor. Hoje prestarei uma pequena homenagem. Hoje vou falar sobre Space Oddity.

    Eu conheci Space Oddity quase sem querer, em um video de um canal gringo muito simpático chamado Glove and Boots. Nesse video eles fazem uma brincadeira com o astronauta Chris Hadfield, que fez um clipe tocando uma versão de  Space Oddity no espaço antes de retornar para a Terra. Foi a primeira vez que eu ouvi a história de Major Tom, pelo menos um trecho dela já que nas duas versões citadas acima o final da história do Major não é contada. Depois eu escutei a música e soube do fim da história. Foi quando eu me apaixonei por essa música.

    A música narra a viagem de Major Tom ao espaço. No começo só o que ouvimos é a voz do Controle da Missão. As orientações são passadas, a contagem regressiva é iniciada, “vá com Deus” diz o Controle da Missão, a nave decola. Ele consegue, chega ao espaço, a decolagem foi um sucesso. Os jornais vão querer saber até qual camisa Tom usava quando chegou ao espaço. Ele é autorizado a sair da cápsula, se tiver coragem. Pela primeira vez ouvimos a voz do Major Tom, ele sai pela porta, a música chega ao auge, ele começa a flutuar de uma forma muito peculiar, as estrelas que ele observam não se parecem muito com as que ele via na Terra. A música desce, o tom do Major não é mais eufórico, mas sim reflexivo. Sentado em seu pedaço de lata ele se sente impotente, diante do mundo azul. Ele sente como se ainda estivesse no mesmo lugar, apesar de ter viajado tanto. Aparentemente ele não sabe o que fazer, mas aparentemente sua nave sabe onde ir. Ele deixa que ela o leve. Ele manda uma mensagem de despedida para sua esposa. O Controle da Missão perde o contato com o astronauta. Tom continua sua reflexão, dessa vez na órbita da Lua. É o fim da música, mas não exatamente o fim da história.

    Posteriormente Tom aparece em outra música de Bowie. Nela ele é citado como uma espécie de drogado. A própria viagem de Tom narrada em Space Oddity é considerada uma alegoria para o consumo de heroína, mas isso já é outra história. Seja Tom drogado ou não, seja o seu foguete uma seringa cheia de heroína ou não, ainda temos uma história profunda de um homem que viajou para o lugar mais longe que ele conhecia, experimentou coisas que não seriam possíveis para a maioria dos seres humanos e percebeu que no final ele não tinha ido tão longe assim. Talvez ele não tenha voltado justamente por não ter ido para lugar algum.

Page 3 of 4

Desenvolvido em WordPress & Tema por Anders Norén